29/06/11

Fernando Rosas contra Fernando Rosas

A Joana Lopes chama a atenção para um breve, mas bastante claro artigo de Fernando Rosas sobre a crise no BE. Recomendada a leitura, passo a resumir as questões que o texto do FR me parece levantar. Digamos que, se, como sublinha a Joana, a voz de Fernando Rosas é uma das poucas, de entre as mais emblemáticas do BE, que não se tem envolvido naquilo a que ela chama as "tristes guerrilhas" pós-eleitorais das últimas semanas, também é verdade que, no artigo que a Joana publica, essa voz se faz ouvir em aceso conflito e clara contradição consigo própria, obrigando-nos a estar não sabemos bem, se, contra Fernando Rosas, com Fernando Rosas — se, com Fernando Rosas, contra Fernando Rosas…

Sem dúvida, um movimento que se proponha animar — ou contribuir para — uma "mudança histórica" e numa alternativa ao "monopólio da oligarquia", terá, entre outras coisas, de "recriar o espaço político e ideológico dos muitos que se não reconhecem nem na rendição do PS à “terceira via”, ao blairismo e ao neoliberalismo, nem na ortodoxia de um PCP que ainda não matou o pai, que continua a identificar-se com os paradigmas da ex-URSS e a chamar de “irmãos” os partidos e regimes da China ou da Coreia do Norte".

As dúvidas surgem quando a "mudança histórica" acaba por ser identificada por Rosas como uma "alternativa de governo ao monopólio da oligarquia rotativa que, do “centrão” à direita populista, tem gerido o país praticamente desde 1976", constituída por um partido-movimento cujo governo será o da "esquerda grande". Com efeito, identificar um partido que constitua uma alternativa de governo ao rotativismo e ao "bloco central" oligárquicos é muito pouco para uma "mudança histórica" e arrisca-se a configurar um modelo de "evolução na continuidade" do regime e da sua divisão/organização/concepção hierárquica e classista (oligárquica) do poder político efectivo.

Um movimento apostado em "recriar o espaço político e ideológico" na linha do que começa por sugerir o Fernando Rosas terá de apostar, muito mais do que em constituir-se em "alternativa de governo", na criação das formas e órgãos de um "governo alternativo", de um exercício democraticamente alternativo do poder político exercido através da direcção dos aparelhos de Estado e das alavancas de comando da economia. Não se proporá governar, mas promover — e contribuir para instituir — o governo dos muitos, o autogoverno regular dos cidadãos organizados a todos os níveis que, para além da existência de cada um e na salvaguarda da sua autonomia individual, relevam de decisões colectivas. Ou, parafraseando uma divisa célebre, a democratização igualitária das condições colectivas de existência há-de ser obra da colectividade mesma — e não de uma variedade ou outra de governo representativo, ainda que, de algum modo, sufragado e temperado pela prática dos sufrágios correspondentes.

Mais simplesmente ainda, a alternativa não passa por ser este ou aquele partido ou coligação de partidos a deter o poder de governar, mas pela democratização radical do exercício desse poder, através da participação igualitária do conjunto dos cidadãos, independentemente da sua qualidade de membros ou militantes deste ou daquele movimento, nas deliberações e decisões que lhes dizem respeito. Pelo que, alternativos, serão tão só os partidos ou movimentos e outras formas de associação voluntária que se disponham a promover, como alternativa — em vez de meras "alterntivas de governo"-, esta democratização instituinte.

6 comentários:

Joana Lopes disse...

Miguel,
O teu post podia intitular-se: «FR contra o que o MSP gostava que ele fosse». Certo?

Miguel Serras Pereira disse...

Não sei, Joana - talvez, sim… O problema é que os gostos em política correspondem a escolhas que se discutem - ou, se não discutem, podemos ir dizendo adeus à vontade de democracia.

É curioso que sejas tu, que já fizeste rupturas movida por gostos semelhantes - pela "organização autónoma" contra o "partido de vanguarda", se bem me lembro - e que, tanto quanto te conheço, não terás mudado de paladar político, é curioso, dizia eu, que sejas tu a fazer-me esta objecção.

Joana Lopes disse...

Miguel,

1º creio que o FR se coloca num plano mais «imediato» do que o teu;

2º eu não sou o Fernando Rosas!...

Miguel Serras Pereira disse...

Joana,
1- nada tenho contra a colocação no "plano imediato" - contanto que se tenha presente, ao mesmo tempo, o horizonte - para trás e para diante - que dele faz parte e lhe permite situar-se e abrir-se.
2 - Longe de mim confundir-te com o Fernando Rosas ou seja com quem for. Daí, justamente, a "curiosidade" - que, pelo menos em parte, este teu segundo comentário esclarece.

Abraço

miguel (sp)

Semisovereign People at Large disse...

os Rosas sejam Filipe's ou seja seu pai sã gente muy ferrenha na defesa das suas ideias

o qué bom

mas tal como a ocês retira-lhes flexibilidade

em muitos aspectos sois almas gémeas

Quem Por Rosas Luta é Herbívoro? disse...

Kramer contra Kramer

Rosas contra rosas

as guerras das rosas são sempre geracionais

alguém que contra si mesmo luta

ou é actor ou...