03/01/11

Activismos


O que Helena Matos escreve sobre o caso de Battisti revela um profundo desconhecimento do assunto. É como se este fosse apenas mais um pretexto para a lenga-lenga do costume acerca da desculpabilização da violência de extrema-esquerda relativamente à extrema-direita e da relativização do «terrorismo».
Dá-se o caso de ser Itália o país menos favorável a este tipo de exercícios, uma vez que foram ali provadas, há demasiado tempo para que Helena Matos possa desconhecê-lo, as profundas ligações da extrema-direita aos serviços secretos e a sua participação em atentados à bomba que vitimaram centenas de pessoas (Piazza Fontana em 1969, Estação de Comboios de Bologna em 1980, entre muitos outros). E esses fascistas bombistas andam por aí, completamente à solta, muitos deles em cargos públicos e sem que o Estado Italiano demonstre qualquer empenho em levá-los à justiça.
Em Portugal a coisa também parece um pouco deslocada, uma vez que a organização que causou mais mortes, o MDLP, era de extrema-direita e tinha ramificações nas mais altas esferas militares (para não falar de personagens como o Major Valentim Loureiro) que estão por esclarecer até hoje, como nos contou Eduardo Dâmaso.
Ora, no caso concreto de Battisti, tudo isto é ainda demasiado complexo para caber no esquema desenhado por Helena Matos. Ele tinha abandonado a organização armada onde militara um ano antes dos assassinatos que lhe são atribuídos. A única prova contra ele é a declaração de um pentito (arrependido) que era, esse sim, acusado de vários homicídios acerca dos quais existiam provas suficientes para o condenar sem qualquer sombra de dúvida. Bastaria ler a entrada da Wikipedia em Português - recomendada por Helena Matos - para perceber que as coisas são bastante mais complicadas do que o pretende a justiça italiana.
Mas se formos, em vez disso, aos vários dossiers publicados sobre o tema no Passa Palavra ou à explicação do caso disponível aqui, percebermos todo o absurdo das acusações de que é alvo Cesare Battisti, acusado, entre outras coisas, de ter cometido dois crimes em duas cidades (Milão e Udine) distantes uma da outra, no mesmo dia e quase à mesma hora.
Casos destes põem seriamente à prova o liberalismo de quem escreve no Blasfémias, onde já vimos José Manuel Fernandes fazer a apologia da censura e outras coisas que deixariam Tocqueville com calafrios. Dir-se-ia até que só a liberdade da iniciativa privada os comove, não fosse essa uma forma tão deselegante de colocar a questão.
Não vale tudo, nem todos os pretextos são bons para encostar a extrema-esquerda ao paredão. Para quem se aborrece tanto com a futebolização do país, talvez Helena Matos fizesse bem em pensar duas vezes antes de se comportar como uma adepta fanática. Vestir sempre a mesma camisola é próprio de pessoas que não gostam de pensar pela sua própria cabeça.

1 comentários:

Anónimo disse...

Eles nem sabem nem o seu ponto de partida nem o seu destino. Boa malha.

RT.