06/01/11

Pela precariedade dos funcionários de um partido comunista

Neste post do Vítor Dias falta desde logo enfrentar o problema seguinte: o da divisão do trabalho político. Os funcionários concentram mais poder do que a generalidade dos militantes, embora aqui haja necessidade de introduzir um terceiro elemento, o dirigente (que pode ou não ser funcionário). Esta discussão, diga-se, é válida para um partido como é para um sindicato ou para uma associação. Um dos modos de contornar este problema é adoptar uma política de rotação que impeça que alguém seja funcionário por muitos anos. É um desafio complicado, por certo, mas é o que pode garantir maior porosidade entre o partido e o resto. Outra solução é procurar que o número de funcionários em posições de direcção seja menor. E por aí fora. Agora, falar da estabilidade do emprego de funcionário de um partido (e agora não estou a falar de outros partidos, estou a falar do PCP) como se este fosse um trabalhador qualquer é querer fugir ao problema difícil mas premente que é saber como criar estruturas de participação mais democráticas.

15 comentários:

Anónimo disse...

Anotando que José Neves não se pronuncia curiosamente sobre a questão de fundo do meu post, e prometendo que ficarei por aqui, por causa de experiências anteriores, apenas três notas:

- a primeira é que Zé Neves manifestamente fala de coisas sobre as quais não tem a mais pequena ideia das dificuldades reais e concretas que as rodeiam (talvez a culpa seja de alguém que em devido tempo não lhe tenha explicado);

- a segunda é que Zé Neves deve supor que todos os anos são às centenas os militantes dispostos a assumirem funções como funcionários do PCP (de cujo estatuto remuneratório e inerente estatuto social o José Neves deve ter um pequena ideia);

- a terceira é que agradecia penhorado que José Neves demonstrasse perante os leitores onde é que eu falei «da estabilidade do emprego de funcionário de um partido (e agora não estou a falar de outros partidos, estou a falar do PCP) como se este fosse um trabalhador qualquer»; se, coisa diferente, me quiser acusar de pensar que num partido a estabilidade de funções, o profissionalismo e acumulação de experiências e competências não é menos mas mais importante que em qualquer outra profissão, isso já pode fazer.

Miguel Serras Pereira disse...

Apoiadíssimo, camarada.

Na realidade, o Vítor Dias - que não é acusado neste caso em que se trata de chegar a juízos políticos sobre as formas dominantes de organização partidária - escreve também no post a que te referes
:
"Pode ser-se empregado de escritório, engenheiro, professor, médico ou advogado toda a vida, mas funcionário de partido (mesmo que sendo também licenciado) ai que horror, possívelmente porque quem assim suspira ou debita acha que a política é uma coisa impura ou mesmo porca onde o profissionalismo e a acumulação de experiência e competências deviam estar proibidos e onde, quando muito, se deviam fazer umas perninhas".

E, ao escrevê-lo, põe, talvez sem se dar conta, o dedo na ferida: a política deverá ser profissional? Poderá sequer ser profissional a actividade política democrática - exceptuadas as situações-limite impostas pela clandestinidade e outras afins?
Sabemos, seus leitores que tu e eu somos, que o Vítor Dias se faz porta-voz de uma concepção participativa e igualitária da democracia, visando a superação da distinção hierárquica entre governantes e governados e as outras que a acompanham numa sociedade classista. Ora bem, não apontará isso para um exercício não-profissional - transversal às actividades especializadas de cada um - da política, que "comunize" de facto o poder democrático, ao mesmo tempo, e no mesmo movimento, em que democratize, "igualitarize", essas relações de poder fundamentais que são as relações de produção?
Tu, Zé, conheces a minha resposta, que, de resto, estas perguntas deixam adivinhar. E eu sei que lhe respondes de modo, senão idêntico, bem mais solidário do que antagónico. Mas se há, como acontece - e parece ser o caso do nosso interlocutor Vítor Dias - quem, reclamando-se da mesma luta pela democratização radical do auto-governo a todos os níveis dos trabalhadores e conjunto dos cidadãos comuns, entenda de outro modo o problema que levantas, creio que tanto tu como eu estamos vivamente interessados em ouvir as suas razões.

Abraço solidário

miguel (sp)

Anónimo disse...

Ai, santo deus, Miguel Serras Pereira, connosco é sempre o mesmo fadinho cansativo e gasto: mas em que linha do meu «post», onde, de facto, defendi a necessidade e legitimidade de profissionalismo na política é que há qualquer concepção minha contrária ao exercício da política de forma não-profissional ?.

Se não fossem os segredos de Polichinelo, até o Miguel Serras Pereira haveria de pressentir que boa parte do tempo e das energias dos funcionários políticos do PCP são dispendidos a procurar alargar a participação e intervenção dos cidadãos na política e nas causas que os mobilizam ou interessam.

Miguel Serras Pereira disse...

Vítor Dias,
como é óbvio, o meu comentário foi escrito e publicado antes de ter lido a sua resposta ao Zé Neves.
Mas desanima-me o facto de você não ser mais explícito. Concede-me um ou dois pontos genéricos, mas ficamos sem saber o que pensa não sobre o regime do futuro, mas sobre o regime (de organização) da acção presente. Ou ficou eu, pelo menos, que não sou extra-lúcido…

Seu leitor atento, ainda que insatisfeito

msp

O Eleitorado Morre Mas Não Se Rende disse...

rotação....gente com 20 e 30 anos no mesmo lugar ou que ascendeu lentamente e agora está no topo no Barreiro ou algures

iam dar o lugar a outros...

quanta esperança

O Eleitorado Morre Mas Não Se Rende disse...

a profissionalização política traz sempre problemas
em qualquer partido

Zé Neves disse...

vítor dias,

pede-me que diga onde é que o Vítor fala da estabilidade de emprego de um funcionário como se ele fosse outro trabalhador qualquer. foi aqui: "Pode ser-se empregado de escritório, engenheiro, professor, médico ou advogado toda a vida, mas funcionário de partido (mesmo que sendo também licenciado) ai que horror", dizia o Vítor ironicamente.

Quanto ao resto, a sua resposta falar por si; o Vítor fala com o paternalismo não de alguém mais velho mas de alguém que sabe o que outros não sabem acerca da extraordinária complexidade do organização do partido; repare que é o mesmo tipo de resposta que lhe é dada pelo gestor do capitalismo que é confrontado com as suas críticas...

mas, bom, tentando avançar, no sentido do diálogo que Miguel apela, o que eu pedia era que reconhecesse apenas que são duas questões diversas: existirem funcionários e esses funcionários serem permanentes.

ps - se alguém em devido tempo não me explicou o que quer que seja, não era má ideia o Vítor olhar ao espelho mais próximo, já que nos meus tempos de militância do partido o Vítor esteve sempre num lugar superiormente iluminado a de onde era suposto explicar-me as coisas que eu não ser capaz de perceber...

Anónimo disse...

O Zé Neves nunca percebeu nada do PCP - na verdade, nem sequer da luta e do projecto do PCP - porque, como era notório, nunca teve nada a ver com ele. A única coisa acertada foi sair e, dessa forma, corrigir o tremendo (auto-)equívoco que foi a sua entrada. O Zé Neves devia ter batido à porta do PS, onde poderia filiar-se na corrente do seu candidato Defensor de Moura. Cada um no seu sítio certo.

Anónimo disse...

José Neves:

Apenas lhe quero dizer que, pelas suas próprias palavras, enfiou muito mais a carapuça da questão central do meu post do que eu imaginava.

De facto, o José Neves confirma que também é dos que acha que todas as profissões toda a vida nenhum mal, funcionário de partido é que não, que horror e quantos perigos e quantas retiradas de direitos aos militantes, etc. e tal.

No fundo, como já se sabia há muitos anos, o José Neves e eu não temos decididamente a mesma ideia sobre para que deve ser servir a política ou sobre as suas exigências.

Por fim, eu não lhe podia ter explicado nada sobre certas dificuldades da organização do Partido porque, como sabe,nunca trabalhei directamente consigo.

Mas, quando alguém me perguntava e eu sabia, era certo eu tentar responder.

Miguel Serras Pereira disse...

Não leve a mal, Vitor Dias, mas, assim, nem para trás nem para diante. O que seria necessário saber é por onde passa, e em que sentido hierárquico, a linha entre a política nao-profissional do cidadão comum e a política feita profissionalmente, a título permanente e exclusivo. E, de caminho, saber também o que entende você ao certo por "profissionalismo necessário" - porquê e para quê? (N.B.: excluo da questão as exigências do militante que tem de passar à clandestinidade…).
Claro que não tem obrigação de responder. O que não me parece já tão justificado é fazer como se respondesse, sem sair (com sua licença) da cepa torta.

msp

Zé Neves disse...

vítor dias,

sim, eu acho que um partido como o pcp deve ter uma política de rotação de funcionários. que não devem ser sempre os mesmos a ser funcionários. isto não é uma posição contra o partido ter funcionários mas contra uma tendência para o enquistamento que resulta da cristalização de uns quantos. a questão coloca-se de igual modo num sindicato.

anónimo, se era notório, tivesses tidos os tomates de o dizer no sítio certo. pelo menos sempre terias impedido que eu tivesse sido dirigente de organizações do partido ou candidato pelo mesmo. se calhar, e na verdade, és um tipo que não zela pelo seu próprio partido.

Anónimo disse...

Miguel Serras Pereira :

Espero que desta vez entenda. Considerei o profissionalismo necessário nos partidos políticos porque de partidos políticos se trata e não de clubes de bridge ou de associações excursionistas.

Quanto ao verme repugnante que veio trazer o Gulag para esta discussão, todo o desprezo do mundo é pouco.

Miguel Serras Pereira disse...

Ah, vejo que não quer explicar e prefere desviar o assunto, tentando provocar-me ao insultar grosseiramente um amigo meu. Ele lhe dirá, se assim entender, com quem se meteu.
O que é o profissionalismo em política? É este um ingrediente aconselhável para as tarefas de democratização efectiva a que me referi atrás? A profissionalização da política não é uma derrota da verdadeira democracia? A todas estas questões você responde com rodeios e evasivas.
Descanse que não o maço mais. Já vi que prefere barricar-se na opacidade que o vidro pode não garantir menos do que outros materiais das paredes do seu reduto e do seu auto-confinamento.

msp

Anónimo disse...

Ora, M.S.Pereira, você é um ingrato.

Eu, ao não lhe explicar com mais detalhe porque é que considero o profissionalismo como necessário num partido político quis poupá-lo à triste figura de, perante os leitores, aqui receber um b-a-bá sobre tarefas, funções e responsabilidades que num patrtido político exigem profissionalização (para o caso de viver noutro mundo só lhe digo que os telefones não se atendem sozinhos,os comunicados não se escrevem sózinhos e não é possível estudar problemas políticos, económicos sociais e de organização na hora de uma entidade patronal exterior).

Chamar «Verme repugnante» é «insultar grosseiramente» ? E falar de Gulag a respeito do olhar de Francisco Lopes o que é ?.

Miguel Serras Pereira disse...

Vítor Dias, agradeço a sua compaixão pelos meus escassos dotes. O problema é que eles são mesmo tão escassos que não compreendo por que razão as tarefas que enumera impedem a rotatividade de que fala o Zé Neves - para nos ficarmos por esse aspecto das coisas.
Menos ainda logro descortinar qualquer argumento sobre a necessidade (democrática, socialista, etc.) do profissionalismo em política, seja lá o que for que isso signifique (diabos me levem, se isso não significa ou pressupõe que há uns mais qualificados para governar os outros do que esses mesmos outros para se autogovernarem - quer dizer, a lógica da sociedade de classes).
Como escreveu há umas décadas António Ramos Rosa: "Ó boi da paciência sê meu amigo"!

Agora, quanto ao Gulag, suas dependências e condições, traços distintivos do regime que o tornou possível e instrumento de governação, lamento que, já que insiste, terá de me ouvir por um momento. Sei que me dirá que os documentos e resoluções A, B e C do PCP repudiam inequivocamente tudo isso (de resto, faria bem em lembrá-lo aos seus camaradas de partido e companheiros de jornada do mesmo que, na praça pública e na blogosfera, reabilitam o estalinismo, publicam as hagiografias de Estaline disfarçadas de histórias do PC(b) e da União Soviética prefaciadas por responsáveis do Avante! sem a menor alusão às falsificações que condensam, etc. etc.) . Mas a minha pergunta é porque não o fez o PCP no tempo devido e ainda hoje evita o assunto, quando alguns dos seus militantes e companheiros de jornada não o desvalorizam como tema de propaganda burguesa ou expressão de conceitos "humanistas". Sei também que me dirá que tudo isso foram erros na construção do socialismo, erros que não nos devem fazer abandonar o ideal comunista de uma sociedade sem exploração, governada igualitariamente pelos produtores livremente associados. Mas a supressão das liberdades políticas e sindicais, o reforço hierárquico da separação entre os produtores e os meios de produção (estatizados), a multiplicação das desigualdades e dos privilégios acompanhada pela multiplicação dos controles burocráticos e policiais e pelas medidas e realizações penitenciárias, a ditadura de um partido que limpava hoje o sebo a quem lhe obedecera ontem, tudo isso e muito mais, não foram erros de uma política socialista, mas antes uma política de destruição radical de qualquer programa que tivesse a ver com o "ideal comunista"- uma política de destruição sistemática da democratização radical pressuposta pelo socialismo. Até prova em contrário, claro está.

msp