04/04/11

Da incapacidade de distinguir entre a realidade e a ficção

O PCP tratou já de inaugurar com os melhores augúrios a procura de um entendimento para lá do espectro (no sentido de fantasma assustador) governativo do costume. Reza a notita de hoje: «Na próxima sexta-feira, na Assembleia da República, realiza-se um encontro entre o PCP e o BE, destinado a uma avaliação mútua sobre a situação política, económica e social do país. Após os encontros com o Partido Ecologista "Os Verdes" e a ID para a concretização da CDU – Coligação Democrática Unitária, este encontro insere-se no quadro de um normal relacionamento inter-partidário ainda mais justificado pelo agravamento da situação económica e social.»
Depois de falarem com as ficções "Verdes" e "ID", lá arranjaram um buraco na agenda para aturar o Louçã. Estranhamente, esqueceram-se de parlamentar antes com o MURPI. E com o Popeye.
Só falta o Bloco responder dizendo que vai falar com o PCP depois de auscultar as posições da Ruptura/FER.
De ficção em ficção, lá se vão lixando ainda mais a nossa vida e o nosso futuro.

27 comentários:

Anónimo disse...

Pois eu acredito que vai haver aliança pré-eleitoral, onde não importa a posição em relação à China e à Líbia. Pena é que não tenha sido um encontro promovido por uma associação independente dos dois partidos, que proporia um programa apenas com linhas gerais mas marcadamente anti-capitalista, que não pudesse ser recusado por nenhum deles.

Anónimo disse...

É interessante verificar que um passo positivo dos dois partido, para quem acha que faz sentido que possam articular políticas e lutas, tem como única reacção tua um monte de asneirolas.
Estás a transformar-te numa espécie de Medina Carreira da esquerda nacional.
É pena.

NRA

LAM disse...

Pois eu penso que esse primeiro passo anunciado se deveu a exigências de muita gente de esquerda, com e sem partido. É uma resposta a essa exigência que deve ser aplaudido e pouco interessará se uns e outros falaram antes, durante ou depois com quem quer que seja. Só espero que os pretextos de "Manuel Alegres" ou de "Coreias do Norte" não se sobreponham ao essencial neste momento.

Ricardo Noronha disse...

Bem Nuno, insultos desses ultrapassam os do Carlos a uma enorme velocidade."Uma espécie de Medina Carreira da esquerda nacional"? Acho que esse é o posto de Eduardo Pitta. Que aliás o veste como se de uma segunda pele se tratasse.

Miguel Serras Pereira disse...

Nuno,
sinto-me tentado a subscrever as palavras do Ricardo, e, depois, meu caro, falhas o alvo quando falas em "esquerda nacional" a propósito do nosso amigo Luís, tão cosmopolita em termos culturais e, em termos políticos, internacionalista entre os que o são.

Caro LAM,

está tudo muito certo, e é certo também que nem o PCP nem o BE querem ficar com as culpas da divisão do campo da esquerda. No entanto, repare que há maneiras de formular as condições prévias e/ou de reiterar posições programáticas (por exemplo, o soberanismo e o "patriotismo de esquerda" exacerbados, anunciando uma espécie de "via albanesa" rediviva) que fazem, juntamente com sobranceria arrepiante bem sublinhada pelo Luís, com que as declarações de princípio unitárias pareçam cortinas de fumo atiradas aos olhos do cidadão comum.
Do ponto de vista eleitoral, que não é o que mais me interessa em tudo isto, acresce que é preciso ver bem em que condições um acordo poderá ser suficientemente limitado e preciso para não se traduzir num todo menor do que a soma das partes…

Abraço

msp

Anónimo disse...

Os internacionalistas devem, portanto, esperar que o proletariado se organize a nível internacional para fazer a revolução, sendo que todas as escolhas a nível nacional estão condenadas a uma via albanesa?

Miguel Serras Pereira disse...

Anónimo das 23 h 01:

bem sabe que não é isso. Mas devem - os internacionalistas - , no caso que nos ocupa e por exemplo, bater-se por transformar politicamente a Europa, dar às lutas locais uma dimensão e um horizonte europeu, apostar na democratização económica da UE, numa integração orçamental "solidária", etc., etc., em vez de reclamar a restituição da soberania plena. Está a ver, não está?

Saudações democráticas

msp

Anónimo disse...

Pois claro, Luís Rainha, o PCP devia era desprezar aliados de há tantos anos, mandar para o caixote do lixo uma sigla -CDU - e um símbolo eleitoral com 26 anos de existência e, de caminho, dar um golpe de morte numa coligação autárquica que, nas respectivas eleições, requer para aí 40 mil candidatos, metade dos quais costumam ser independentes.

E lembrar-me eu que, durante décadas as referências continuadas do PCP à unidade e convergênciadas forças democráticas, eram consideradas a velha e insuportável «língua de madeira» dos comunistas.

Os tempos demoram a mudar mas sempre mudam alguma coisa, pelo menos nos falantes de certo léxico político.

Anónimo disse...

MSP: o discurso internacionalista do momento (a democratização económica da europa, como lhe chama) tem um alcance muito limitado hoje: quando muito onde podemos chegar é uma política monetarista de emissão de títulos de dívida europeia. no fundo, é o internacionalismo monetário, como diz o outro. a "soberania" que reclama o PCP ("patriotismo") é algo que também não me diz nada, mas há que pensar que alcance poderá ter uma plataforma eleitoral quando acabarem as eleições. um passo de cada vez! a luta não deve terminar no parlamento, e fora disso há muito internacionalismo a fazer para lá de um programa reformista no quadro do capitalismo, e que pode vir a ser animado por partidos de esquerda, certo? ainda que a longo prazo os objectivos das diferentes esquerdas (e aqui não me refiro só ao PCP e ao BE, mas também a espaços mais radicais que hoje têm uma expressão praticamente nula) não sejam os mesmos, no curto prazo é demasiado a coincidir para que o deixemos escapar.

Anónimo disse...

Sabe o Vitor Dias que a CDU é uma mentira, uma fachada. Os Verdes são uma invenção. O Vitor Dias sabe os funcionários do Partido que foram destacados para Os Verdes. A ID é uma ficção. Porque é que o Vitor se sujeita a esta treta? É só desculpazinhas. Estou farto do jogo de sombras dos dirigentes do Partido. Digam de uma vez ao povo o que querem, façam como o KKE.

LAM disse...

MSP,

Tanto quanto tenho percebido pelo que leio por aí (circula até uma petição com esse fim na net), a proposta é de uma plataforma comum, que pode ter vários desenhos, com base num programa mínimo de entendimento entre esses e, conforme explicita a petição, outros partidos e movimentos de cidadãos, com vista a ser apresentado ao próximo acto eleitoral. Nada aí sugere qualquer tipo de alianças ou coligações que extrapolem esse único objectivo ou que careçam de maiores definições ideológicas, coisa que a ser levantada (e sabem-no de certeza os protagonistas) inviabilizará qualquer tipo de acordo.
O que eu espero (ou, pelo menos, concedo o benefício da dúvida, dado já ter sido mais inocente do que sou hoje), é que a disponibilidade demonstrada pelos partidos para se sentarem à mesma mesa, com anúncio na com.social, tenha esse objectivo e não seja uma maneira de cumprir calendário que, a pretexto de matérias que sendo importantes não são imprescindíveis clarificar para acções comuns no momento presente, deitem tudo a perder.
Já tenho dito por outros lados: os partidos, principalmente os que têm representação parlamentar ou participam em orgãos de poder, nomeadamente autárquico, têm medo de perder as posiçõeszinhas e as percentagenzinhas com que têm ao longo de muitos anos mantido a esquerda refém. Se não ganharem coragem para sair das trincheiras agora, nunca ganharão. E, dependendo disso, também aí vai ficar mais claro ao que andam e para o que servem.

abraço

Anónimo disse...

Vê-se um luar de fundada esperança na proposição fundamental do anónimo, publicada ontem 4/4 corrente pelas 18:57 horas. Trata-se, efectivamente, ao sugerir- embora lamentando que tal não tivesse ocorrido- " é pena que não tenha sido um encontro promovido por uma associação independente dos dois partidos, que proporia um programa apenas com linhas gerais mas marcadamente anti-capitalista ". Opção táctica muito dinâmica, consequente e transparente: fugir ao poder de recuperação politico-burocrático dos partidos parlamentaristas e dos sindicatos do " sistema", se se quer autonomizar e libertar a iniciativa política das massas em revolta. Caso contrário, se não se convoca a lógica diferencial da auto-criatividade extensiva às lutas de classe multimodas, corre-se o risco de não poder distinguir entre os " cenários " da língua-de-madeira e, hoje. da língua-de- chicklet que se plasmam com a inacreditável " plasticidade " do sistema capitalista de exploração global. Niet

Anónimo disse...

Pelos vistos não é só o BE que foi "auscultar as posições do Ruptura-Fer"...

Carlos Vidal disse...

É cada vez preciso mais estudos para perceber os perturbantes textos e ensaios de LRainha. Eu, por mim, tento. Mas, na realidade, não tenho a capacidade revelada por certos prescientes comentadores, que aqui têm explanado brilhantes respostas. Grande título, imaginativo, grande post. Parabéns. Quem fala assim....

Carlos Vidal disse...

Já agora, gosto muito do título, como disse, a começar pelo seu "Da", "Da incapacidade...". É bom. Além disso é logo aí, nessa brevis linha que se encerra uma fulgurante lição de política: ora, a política é, para Rainha, a capacidade de distinguir a realidade da ficção. Isto, meus senhores, é fina argúcia, definição clara do complexo, desnecessária imanência, inteligência que assusta. Brio, em suma. Bravo.

Anónimo disse...

Como dizia Castoriadis a propósito da " cópia " filosófica inúmeras vezes tentada por L. Althusser, o que está em jogo nesta discussão sobre a " plataforma " dialogante entre o B.E. e o P.C.P. é uma grave e lancinante questão política. estratégica e de representação; e não, como quer dar a parecer o filófoso de Arte, Carlos Vidal, uma questão linguística ou literária. Nessa focagem tentada por C.V., operada com uma ironia e soberba desfasada e inócua, é denegada a camuflagem refinada da matemática " estaliniana " entre processos formais e a realidade...nua e crua.Onde, justamente, o P.C.P. não pode adiar ou fazer manobras de " diversão " para revelar as suas responsabilidades históricas. E o essencial da questão fica no tinteiro da História, claro. Niet

Carlos Vidal disse...

Hã ??

Carlos Vidal disse...

Ah, já percebi, pronto.
Castoriadis, lá está, é o nome do lulu do meu vizinho.
Ora, como é que eu não me lembrei disso?

Anónimo disse...

Oh, C. Vidal,deixe-se dessas rábulas proto-estalinianas de muito mau gosto. Por acaso conhece o texto do Castoriadis onde ele acusa frontalmente L.Althusser de lhe copiar, e mal, as ideias? Essa é a pior porta de saída para si de uma " interpelação " desastrada enroupada em fraldas irónicas... Sabe o que é que o Balzac dizia da ironia? Niet

Miguel Serras Pereira disse...

Luís,
ele há gajos com sorte. Este é vizinho do Castoriadis, embora se confunda com a sua própria caniche de estimação (pobre cachorrinha, que nunca lhe fez mal!). Que ele nem tudo são chalaças, meu amigo, e há homens fatias: basta pensar no Carlos Vidal, ou no Carlos Vidal, se quiseres, ou, até mesmo, e ainda que não queiras, no Carlos Vidal.

Abraço e desculpa algum nome menos cortês que me tenha escapado

msp

Anónimo disse...

Imagine-se o " filme " da " manobra " de denegação do factor burocrático-estaliniano na abordagem da política " politiqueira " de sauce PCP! Estes recentíssimos fotogrmas são mais que muitos. Isto raia a fantasmagoria mais masoquista e estéril! È nisto que o Negri, o Milner e quejandos têm razão: não há nada a fazer, nem a esperar destes " diálogos " com os bisnetos de Estaline...ainda por cima " à portuguesa ". Que tristeza,ufa! Niet

Miguel Serras Pereira disse...

Niet,

discutir com o CV não vale a pena. Mas sejamos justos: no seu livro pós-tragédia, L'Avenir dure longtemps, o próprio L. Althusser desmistifica muito razoavelmente o "althusserianismo" e diz que está tudo por pensar, sendo que um dos poucos que sugere algumas pistas preciosas é justamente C.C.
Mas um bom balanço da importância de Castoriadis é o de Vincent Descombes em Le raisonnement de l'ours; ou, noutro género, menos próximo da história da filosofia, o de Pierre Vidal-Naquet. Entre os economistas críticos, François Chesnais, que continua a considerar C.C. mais "marxista" do que o próprio se dizia, também o tem por um dos mais lúcidos, senão pelo mais lúcido e profundo, dos pensadores da questão política - ou "questão social" - contemporânea.
Muito recentemente, Nicolas Poirier publicou um estudo notabilíssimo sobre L'ontologie politique de Castoriadis (Paris, Payot, 2011), que põe bem evidência o alcance filosófico da ideia de democracia. Não se trata de fundação - bem pelo contrário: a questão seria antes o que é que nos diz sobre o ser, sobre o real, a existência de qualquer coisa como a política no sentido de actividade prático-poiética através da qual nos damos, sabendo que o fazemos, a nossa própria lei. (Diga-se entre parênteses e a terminar que encontramos uma questão semelhante, também cheia de consequências políticas que o autor se abstém de explorar, na concepção do poema de George Steiner: "escolha de não não-ser" que prova que "não é verdade que, do nada, nada venha" e que atesta que a história ou a companhia dos humanos no tempo é teatro ou arena de uma criação ontológica radical cuja responsabilidade se trata de assumirmos…).

Nada de discussões, portanto, com arruaceiros sem maneiras democráticas que te obriguem a desleixar a regra de ouro do "nivelar por alto", confusão de todos os aspirantes a bobos da corte dos poderosos (monarcas absolutos iluminados ou geniais secretários-gerais, tanto dá).

Bom vento e salut

msp

Anónimo disse...

MS.Pereira: Como gosto de " dialogar" e de retribuir,acima de tudo,digo-te que já li uns capítulos do Poirier, justamente, o que versa sobre C.C. e Lefort. Acho que ele, N.P., é mais " lefortiano ", até por influência do feroz arendtiano-lefortiano M. Abensour,o responsável pela célebre colecção... Do Descombes sabia que ele tinha escrito na Critique um grande artigo, há cinco seis anos. Sem esse trabalho de " sapa ",de procura e análise nada de útil se pode fazer e perceber. O mesmo em relação ao Badiou... Ah, já me esquecia de um volume colectivo de finais de 2008 que sob a responsabilidade das Uni. de Paris VIII e a de Cergy-Pontoise, foi dado à estampa um avantajado pavé sobre " C. Castoriadis, Réiinventer l´Autonomie ", Éditions du Sandre, com análises de E. Morin, Serge Latouche, Robert Legros, D. Bensaid, Sion Ebas, Nicolas...Poirier e Laurent Van Eynde, entre outros. E, por fim, parece que existem uns Cahiers Castoriadis em Lovaina, com saidas regulares. Salut! Niet

Carlos Vidal disse...

A sério, para acabar - apenas uma ou duas linhas: se o PCP propõe Francisco Lopes, é autista, fala para dentro, arregimenta os fiéis, mobiliza apenas os já "convertidos". Se fala para "fora", digamos com o BE, então confunde realidade com ficção. Não há saída, LMR.

Déde disse...

Luís não se aflija, há sempre a hipótese de dali não sair nada.

Anónimo disse...

O BE e o PCP : a história das nossas derrotas ou a esperança na nossa vitória?

A direita está unida em Portugal. Banqueiros, Banco de Portugal, PS, PPD, CDS, FMI, EU. Há um Bloco central (nacional e internacional) de facto. Perante isto sobram-nos duas forças políticas, BE e PCP. Têm a responsabilidade histórica de encontrar um acordo – e não fingir e protelar para acordos parlamentares concretos. Não interessa aqui se a soma dos partidos dá mais ou menos votos, essas contas são de Teixeira Lopes, para quem a política resume-se ao método de Hondt, mas porque é preciso criar uma esperança unificada contra a regressão social que nos querem impor. Creio que nestas eleições se ambos se unissem teriam muito mais votos porque isso iria mobilizar milhares de abstencionista que deixaram de acreditar no ram ram parlamentar. Mas sobretudo estou convencida que esta candidatura iria pôr em marcha um movimento social de enfrentamento com o regime, dos PEC, do desemprego, da precariedade.

Sexta-feira não ficaremos pela conversa de «futuramente, BE e PCP sempre convergiram, bla, bla, bla…». Se não chegarem a um acordo não é porque perdem deputados mas porque sabem que uma candidatura destas seria uma mobilização nacional contra este regime.

As derrotas fazem-se dos jogos que perdemos e dos que nem chegámos a fazer.

Sexta-feira das duas, uma: ou damos a nossa militância feliz e empenhada para esta coligação; ou o nosso combate contra a esquerda que nos trás ao colo as derrotas, pintadas de vitórias.

Raquel Varela 5 Dias

cada 1 na sua bicicleta e a direita radical vai de mota. os tempos são de decisões urgentes e não de longos caminhos a percorrer. com a direita radical no governo é o fim das restantes conquistas de Abril e um longo caminho de penúria. não consigo compreender como é que alguns comunistas e bloquistas conseguem aceitar isto!

Justiniano disse...

Rainha, escapa-me o sentido deste teu post!! Parece-me, à primeira vista, uma coisa desgraçada onde condenas à irrelevancia aqueles partidos e reduzes as suas cogitações à categoria de fantasias e excentricidades diletantes!!
No campo da consideração prática até me levas a dar razão ali a parte do comentário do caro V.Dias!!
E nada me liga àqueles dois ou três ou quantos sejam!!
À segunda nem sei!!
Mas mais te valia nomear para este título aquele, o deslumbrado, versado nas artes da fiação da realidade e que lá vai lixando ainda mais a nossa vida e o nosso futuro.