26/01/11

As pessoas sensíveis

As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas

O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra

"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"
Assim nos foi imposto
E não:
"Com o suor dos outros ganharás o pão."

Ó vendilhões do templo
Ó constructores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito

Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem.

Sophia de Mello Breyner

8 comentários:

Miguel Sacramento disse...

Grande poema...

Ana Cristina Leonardo disse...

grande poeta!

ana v. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ana Vidal disse...

Estive ontem na entrega do espólio de Sophia à Biblioteca Nacional. Uma exposição que vale a pena ver num dia mais calmo (ontem era praticamente impossível). Este poema foi muito citado nos discursos, e com razões de sobra: não só é magnífico como muito actual.

Ana Cristina Leonardo disse...

Olá Ana!
Não estive presente. As aberturas de exposições são mais ou menos como as vistas à capela sistina - de fugir!
Quanto ao poema, juro que não telefonei a ninguém para o incluírem nos discursos.
:)

Ricardo Noronha disse...

Com uma mãe destas, para onde terá ido o talento literário de MST?

Ana Cristina Leonardo disse...

As mães, ah as mães! As mães podem ser tramadas..
:)

Ana Vidal disse...

LOL. Essa das mães tramadas é tramada...
Mas não resisto a contar ao Ricardo Noronha que o Miguel ST lhe respondeu antecipadamente à pergunta que faz aqui, e com uma grande frase: "Acidentes biológicos não dão direitos adquiridos". Referia-se à posse do espólio pelos filhos, claro, mas a aplicação é bem mais vasta.
:-)