Lançaram-me o repto. E, mesmo naufragado no meio da minha inépcia, tive mesmo de acorrer. Como resultado, deixo-vos aqui a minha versão das Disquieting Muses de Sylvia Plath. É próxima ao original: nos significados, nos implícitos, nas escolhas lexicais. Mas para reconstruir com maior fidelidade o ritmo e a dolente atmosfera do poema, já teria eu de ser algo que não sou: poeta. Mesmo assim, gostava de saber se o meu atrevimento valeu a pena. Aguardo os vossos veredictos.
E, já agora, fiquem também com uma versão em Castelhano, de José Luis López Múñoz.
As Musas Inquietantes
Mãe, mãe, que tia mal-educada
Ou que desfigurada e repelente
Prima tu imprudentemente deixaste
Sem convite para o meu baptizado, para ela
Ter mandado estas damas no seu lugar,
Com cabeças como ovos de cerzir para acenar
E acenar e acenar aos pés e à cabeceira
E à esquerda do meu berço?
Mãe, que fazias histórias por encomenda,
Do Mixie Blackshort, o urso heróico,
Mãe, de quem as bruxas sempre, sempre
acabavam no forno, em pão de gengibre,
Pergunto-me se tu as viste, se tu disseste
Palavras para me livrar das três damas
Que acenavam à noite em volta da minha cama,
Sem boca, sem olhos, de cabeça costurada e careca.
No furacão, quando as doze janelas
de escritório do pai incharam para dentro
Como bolhas quase a rebentar, tu deste
bolachas e Ovomaltine, a mim e ao meu irmão
E ajudaste-nos aos dois a fazer o coro:
“Thor está furioso: bum bum bum!
Thor está furioso: não queremos saber!”
Mas aquelas senhoras partiram os vidros.
Quando em bicos dos pés as meninas dançavam,
Piscando lanternas como pirilampos
E cantando a canção do vaga-lume, eu não conseguia
Levantar um só pé, vestida de lantejoulas
mas, com pés de chumbo, fiquei à parte
Na sombra das minhas madrinhas de cabeças funestas,
E tu choraste e choraste:
E as sombras alongaram-se, as luzes apagaram-se.
Mãe, mandaste-me ter lições de piano
Elogiaste os meus arabescos e trinados
Embora cada professor achasse o meu toque
Estranhamente rígido apesar das escalas
E das horas de prática, o meu ouvido
Surdo ao tom e sim, impossível de ensinar
Eu aprendi, eu aprendi, eu aprendi noutros lugares,
Com as musas que nunca contrataste, querida mãe.
Acordei um dia e vi-te, mãe,
flutuando acima de mim no mais azul dos ares
Num balão verde brilhante com um milhão
De flores e azulões que nunca foram
nunca, nunca vistos em parte alguma.
Mas o pequeno planeta saltitou para longe
Como uma bola de sabão enquanto chamavas: Vem cá!
E encarei as minhas companheiras de viagem.
Dia agora, noite agora, à cabeceira, ao lado, aos pés,
Firmes na sua vigília em vestidos de pedra,
Rostos vazios como no dia em que nasci.
As suas sombras longas ao Sol poente
Que nunca brilha mais nem se recolhe.
E este é o reino a que me deste,
Mãe, mãe. Mas nenhuma careta minha
Denunciará as companhias com que ando.
LAS MUSAS INQUIETANTES
Madre, madre, ¿qué tía maleducada
o qué prima deforme y fea olvidaste,
imprudente, invitar a mi bautizo,
y se vengó enviando a esas mujeres,
de cabezas como huevos de zurcir,
que asienten, una y otra vez, al pie,
a la cabecera y al lado izquierdo de mi cuna?
Madre, que nos comprabas historias
de Mixie Blackshort, el oso valiente;
madre, las brujas de tus cuentos, siempre, siempre,
se asaban en pan de jenjibre, me pregunto, madre,
si las viste, si pronunciaste conjuros
para librarme de esas tres señoras
que asentían de noche alrededor de mi cama,
sin boca, ni ojos, con calvas cabezas cosidas.
En el huracán, cuando las doce ventanas
del estudio del padre se hinchaban
como burbujas a punto de estallar, nos dabas,
a mi hermano y a mí, galletas y Ovaltine
y nos ayudabas a cantar a coro:
«Thor está enfadado: ¡bum bum bum!
Thor está enfadado: ¡nos tiene sin cuidado!»
Pero esas damas rompieron los cristales.
Cuando las colegialas bailaban de puntillas,
linternas, luciérnagas parpadeantes,
y entonaban la canción del gusano de luz, yo,
vestido centelleante, no lograba elevarme,
me quedaba a un lado, pesados pies de plomo,
en la sombra que arrojaban mis madrinas
de cabeza funesta, y tú llorabas sin parar:
al alargarse las sombras se apagaron las luces.
Madre, me mandaste a clases de piano
y alababas mis arabescos y vibratos
aunque los profesores me sabían
extrañamente insensible a pesar de las escalas,
de las horas de práctica, sin oído para la música
y sí, sí, imposible como alumna.
Aprendí; estudié y aprendí en otros sitios,
de musas que no habías contratado tú, madre querida.
Un día me desperté, madre, y te vi
flotando en el más azul de los cielos
en un globo verde brillante,
con un millón de flores y de rabilargos
que nunca encontró nadie en ningún sitio.
El pequeño planeta se alejó
como una pompa de jabón mientras llamabas: ¡Ven!
Pero me quedé con mis compañeras de viaje.
De día y de noche, a un lado, a la cabecera y a los pies,
prosiguen su vigilia con vestidos de piedra,
el rostro tan vacío como cuando nací,
sus sombras, largas, bajo un sol poniente
que nunca brilla más ni acaba de ocultarse.
Y ése es el reino en el que me naciste,
madre. Aunque ninguna mueca mía
revelará jamás la compañía en la que vivo
José Luis López Múñoz
29/07/10
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1 comentários:
Muito bem, Luis. É ainda uma aproximação, uma versão de trabalho, mas o essencial está feito.
A gente ainda volta a falar disto.
Parabéns e um abraço
miguel sp
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