27/07/10

Empiria da conspiração


Nunca fui grande entusiasta dos exercícios a que comummente se chama “teorias da conspiração”. A ideia de querer explicar o inexplicado com explicações ainda mais inexplicáveis sempre me pareceu mais cómica do que produtiva. Não houve virgens a planar em Fátima porque se tratou apenas de discos voadores. Ou: todas as incongruências visíveis na história do 11 de Setembro explicam-se graças a um plano arquitectado pela administração do presidente americano mais tonto do século; houve centenas de cúmplices dedicados a falsificar um ataque de terroristas e nunca ninguém conseguiu lobrigar provas de tal.
Assim, foi sem grandes expectativas que me dediquei a ver o célebre documentário (deve ser o único alguma vez publicitado com graffitis na linha de Cascais) Zeitgeist. Erro meu: aquilo é tão delirante, tão afastado do mundo real que até se torna divertido. Há invenções alucinadas para todos os gostos: a propósito de Cristo, do Natal, do 11 de Setembro, etc., etc. Trata-se talvez do mockumentary mais engraçado desde This is the Spinal Tap.
Mas será inocente? Será que insistir em mitos já claramente desmentidos, como a inexistência de destroços de avião no Pentágono é mesmo um erro pueril de fanáticos imunes à realidade? Ou será a feitura de filmes assim a melhor forma de “normalizar” à força pedaços das narrativas do mundo que não encaixam bem no adorado e fulcral “senso comum”? Despejar uma bela camada de ridículo sobre as visões “alternativas” de alguns eventos-chave; não será esse o melhor caminho para evitar a propagação de mais dúvidas, questões, descobertas incómodas? (E eis que nasce uma linda teoria da meta-conspiração...)
É como digo. Não aprecio as teorias da conspiração mas admiro quem se entretém a desmontar com minúcia o relógio do avô, sempre exacto e de confiança, descobrindo ali algumas engrenagens que giram no sentido contrário ao esperado, parecendo até ter uma outra função que não apontar as horas, por exemplo (não posso concluir a frase, pois este blogue não dispõe de recursos criptográficos com a necessária robustez). Encontrar nos locais mais banais o acontecimento incongruente, a emergência inexplicada de uma outra história, de um vasto continente ignorado – largando o lastro inútil da tentativa de solução, do absurdo maior a cobrir o choque do inesperado.
O vídeo acima é vestígio de uma dessas raras ocasiões. Onde o estranho se dá a ver ao mundo, sem anestesia nem camuflagens. Irredutível. Tão imune a teorias que nem sequer figura no famoso Zeitgeist. Falo, claro, do anúncio, em directo na transmissão da BBC, da queda do WTC 7. Um anúncio feito 20 minutos antes da derrocada – que então pareceu totalmente inesperada – acontecer.
Nestes minutos, observamos uma bizarra viagem no tempo: a jornalista que especifica algumas características do edifício destruído com o mesmo bem visível atrás dela. A súbita perda de sinal da transmissão quando o script defeituoso se aproximava da obrigatória coalescência com o tempo da queda efectiva do edifício. Depois, podemos ainda abrir mais a boca de espanto com o sumiço miraculoso dos arquivos da BBC de todos os registos vídeo do dia mais significativo das últimas décadas.
Mas não adianta inventar teorias para preencher os espaços nestes buracos tão evidentes. A resposta, a haver alguma, será sempre ou mais simples ou muito mais complexa do que agora conseguimos imaginar. E talvez o Zeitgeist tenha sido programado para nem se aproximar dos seus territórios. Antes pelo contrário.

2 comentários:

Ricardo Noronha disse...

O zeigeist vai buscar argumentos e raciocínios desenvolvidos noutros filmes/documentários mais curtos para os inserir numa teoria da conspiração um pouco canhestra (a seita maçónica de Princeton, etc). Mas as fotografias do pentágono não parecem ser muito convincentes (pedaços de alumínio e cablagem não existem apenas em aviões), esta história do edifício 7 é muito estranha e finalmente, parece que o WTC foi construído prevendo a possibilidade de uma colisão com um avião e não deveria ter caído na vertical, mas para o lado.
Finalmente, há a questão que me parece mais decisiva: quem tinha as condições e as motivações para planear uma coisa destas e capitalizá-la a seu favor? Um grupo de integristas acampados numa gruta do Afeganistão ou elementos das dezenas de agências governamentais norte-americanas ligadas ao complexo militar-industrial?
Tudo isto apenas para dizer que a história nos foi muito mal contada.

Luis Rainha disse...

Ricardo,
Existem muitas fotos, colhidas logo no 11 de Setembro, que nos mostram rodas e peças de motores de avião comercial. Aliás, seria sempre mais fácil e discreto usar um destes, mesmo no cenário mais conspirativo, do que outras maquinetas voadoras.
Quanto ao WTC, o avião cujo embate as torres deveriam suportar seria de dimensões (e de capacidade de combustível) bem menores.
A história tem buracos esquisitos. Têm eles origem apenas na forma como ela foi contada? Não sei.