11/07/10
Uma pequena metáfora, para o Miguel SP
por
Luis Rainha
Havia naquela cadência algo de inexplicável. Pequenas flutuações no ritmo, nos impactos com as peles retesadas do tambor. Onde quase todos apenas produziam compassos maquinais, sem cintilação nem alma, alguns conseguiam, nas malhas apertadas das cadências regulamentares, infiltrar o resto, o ínfimo espectro que nos separa das máquinas. Na onda portadora do ritmo utilitário, viajava um outro sinal. E transcendiam-se, aqueles poucos, arrastando na sua viagem para lá todos os que tinham a sorte de serem os destinatários do seu labor. Por vezes, estes até se esqueciam de que estavam ali, amarrados aos remos, sem escolha nas rotas do navio. Entretanto, o capitão sorria e fechava a porta do seu camarote, para que o barulho não o incomodasse.
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4 comentários:
Luis,
obrigado pela dedicatória do teu excelente post. O problema é que julgo estar mais de acordo contigo do que tu pareces julgar. Se me perdoas a prosa, eu diria o seguinte: o restou ou excesso não dispensa a acção política directa, nem a prescreve ou induz automaticamente - pode até servir de soporífero ou analgésico. No entanto, se não houvesse resto ou excesso, seria possível sequer a vontade política, o motim da tripulação, a representação de outra coisa?
Ou, de outro modo, que fazes tu próprio quando escreves estas coisas e as pões a circular na rede?
A conversa continua, claro. Um abraço até lá
miguel sp
Tens (quase) toda a razão :-)
Também tu, Luis - também tu…
msp
Caros Luís e Miguel,
A questão seria então a de não permitir que a salvaguarda de um tal resto/excesso venha branquear a lógica a que esse excesso se opõe, a que esse resto escapa... É só esse o perigo de uma separação (ainda que esta seja conceptualmente legítima) entre a “essência” (seja lá o que isso for) do futebol enquanto jogo e a sua indústria. Ou seja, se é preciso não atirar o bébé fora com a água do banho, é também necessário que a fascinação com o bébé não nos faça esquecer de mudar de água.
Abçs
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