30/10/17

Balcão Nacional do Despejo

Alguém resolveu  criar uma coisa a que chamou "Balcão Nacional do Arrendamento". Essa coisa na sua página na internet esclarece que " tem competência exclusiva para a tramitação do procedimento especial de despejo em todo o território nacional". 

Porque não chamaram à coisa " Balcão Nacional do Despejo"?. Talvez porque esteja alojada no Ministério da Justiça. Não fica bem associar justiça a despejo, na verdade ela rima melhor com arrendamento. 


Na verdade as coisas não funcionam bem assim. É mesmo de despejos que a coisa trata. O DN de hoje dá conta da cadência a que as pessoas estão  a ser despejadas. Um ritmo diário de 5 despejos é obra. Ainda mais se pensarmos no que se noticia quanto ao facto de o dito Balcão dos Despejos apenas tratar de 1/3 dos casos. 


Rendas altas e baixos salários estão na origem do acréscimo de despejos, que, relativamente a esse ano negro da intervenção da Troika, 2013, quase duplicou. 


A notícia não esclarece qual a distribuição territorial dos despejos. Ficamos sem saber onde é que eles se concentram em termos geográficos. Mas, por alguma razão, ao ler a notícia fica-se com a impressão de que estão a falar de Lisboa. 


Há uma outra dúvida que emerge: afinal a recuperação de rendimentos serve para quê, se não evita sequer que um 
cada vez maior número de famílias seja simplesmente despejada das casas onde moram? Ou, dito de outra forma, como é que a recuperação de rendimentos faz frente ao crescente aumento dos preços, às consequências de uma total liberalização dos preços da habitação, e a uma paupérrima política pública de habitação? 

Há outra coisa que a notícia não esclarece: o que aconteceu a essas pessoas? Onde vivem? Para onde foram? Tendo sido despejadas 5,5 famílias por dia, quantas pessoas foram atingidas e quantas eram crianças e idosos? Alguém sabe?

29/10/17

O idiotismo e a idiotice



Vista de longe, a crise catalã mostra como a guerra, e qualquer confrontação danosa, nasce sempre de um diálogo de surdos conscientemente alimentado por duas pessoas (ou dois poderes) em busca desesperada de legitimidade, que não hesitam em sacrificar o interesse geral e o futuro em nome da sua sobrevivência politica por mais uns dias. Nunca foi tão evidente que a verdadeira face do nacionalismo é a estupidez e que a distância é curtíssima entre idiotismo e idiotice.

25/10/17

A costela "Paulo Portas" de Vieira da Silva - Parte II

Um ministro que declara que "os objectivos no subsídio de doença não foram atingidos", está a falar do quê?

Está-se a referir , sendo um ministro de um Governo socialista, apoiado pela esquerda comunista e bloquista, ao facto de o  subsídio por doença não ter, eventualmente, chegado a todas as pessoas doentes da  forma mais rápida e mais eficaz, possibilitando-lhes o melhor e mais efectivo tratamento e uma rápida recuperação?

Nada disso. O ministro está a reconhecer que a despesa com este apoio social ficou 121 milhões acima do valor estimado. E, reconhece o ministro, "é preciso “utilizar critérios mais finos” para combater o recurso abusivo a esta prestação."

Critérios mais finos? Recurso abusivo a esta prestação? Porque será que o ministro não é claro? Porque será que não quantifica os casos que detectou, que sustentam a sua tese? Quem lhe disse que um aumento do subsídio de doença está associado a um aumento de fraudes, em vez de a um aumento de doenças?

Que critérios usa o ministro para estimar o número de pessoas que vão adoecer num determinado ano? Será o mesmo que usam para estimar a área ardida?

Qual será a lógica de, nesta altura, o ministro dito da solidariedade e da segurança social vir repetidamente  com este discurso a tresandar a um neoliberalismo de antanho. Numa altura em que as pessoas mais vulneráveis, são confrontados com um Serviço Nacional de saúde que presta um cada vez pior serviço aos seus utentes. Realmente o legado de Robert Nozick faz-se sentir nos locais mais inesperados, ou talvez não.

PS - declaração de interesses: não me recordo de alguma vez ter recebido subsídio de doença.

21/10/17

A costela "Paulo Portas" de Vieira da Silva.

Vieira da Silva, o ministro do trabalho e da Segurança Social, prometeu ir fazer um esforço adicional para tornar mais eficazes os mecanismos de verificação das baixas por doença. O ministro não esclareceu quanto admite gastar com esse "esforço adicional". Será, certamente, esperamos todos, menos que 10€/mês  por pensionista. Todos recordamos como Vieira da Silva é um homem prudente e poupado. A sustentabilidade da segurança social é uma coisa que não lhe sai da cabeça.

Esta ideia de criminalizar e perseguir os pobres e os doentes, através da realização de "pequenos esforços", que os ministérios decidem fazer ano após ano, devia pagar direitos de autor. A quem? A Paulo Portas, naturalmente, "autor" no qual o ministro se inspirou.

A Segurança Social portuguesa é, em muitos casos, a mesma que Ken Loach denunciou em "I Daniel Blake".

20/10/17

Modelos de propriedade alternativos

Alternative Models of Ownership[PDF], documento do Partido Trabalhista britânico sobre diferentes formas de organização empresarial alternativas ao modelo capitalista típico:
The economic system in Britain, in its current guise, has a number of fundamental structural flaws that undermine economic strength and societal well-being. The predominance of private property ownership has led to a lack of long-term investment and declining rates of productivity, undermined democracy, left regions of the country economically forgotten, and contributed to increasing levels inequality and financial insecurity. Alternative forms of ownership can fundamentally address these problems.

These issues are all the more pronounced given the increasing levels of automation in our economy. Automation has an emancipatory potential for the country’s population, but the liberating possibilities of automation can only be realised – and the threats of increased unemployment and domination of capital over labour only countered – through new models of collective ownership that ensure that the prospective benefits of automation are widely shared and democratically governed.

Cooperative ownership has the ability to increase employment stability and increase productivity levels, as well as making firms more democratic. To support the expansion of cooperatives in the UK it is necessary to improve their access to finance, and examples from Italy and Spain point in the direction necessary to achieve this. Cooperatives can further be supported by national legislation and a re-worked government procurement policy.

Municipal and locally-led ownership can improve service provision and guarantee that economic prosperity is not concentrated in certain regions of the country. A variety of policies, including place-based budgets, increased powers being handed to local authorities, and the relocation of various major institutions outside of London can foster this type of ownership.

National ownership of certain industries promotes long-term planning of the economy, helps to provide modernising infrastructure, quality health and social care, and to combat climate change. Examples around the world point to the positive contribution of national ownership, but in the UK national state ownership has historically tended to be too centralised, with power in the hands of a private and corporate elite. To improve national ownership in the UK requires taking measures to increase the democratic accountability of state ownership.

18/10/17

INCOMPETÊNCIA. Incompetência Política e Incompetência Técnica.

A segunda carnificina do ano elevou para mais de 100, o número de mortos devidos aos incêndios. Com um intervalo de quatro meses a tragédia repetiu-se, se não na forma pelo menos nos resultados: perda de vidas humanas e uma brutal destruição do património natural.

Entre Pedrogão e este domingo negro o Governo geriu o sector como habitualmente. Esperou pelo resultado do Relatório da Comissão Independente e manteve tudo como dantes. Chegado o Relatório prometeu reformas e uma mudança de ciclo, passando da fase de combate para a fase de prevenção.

Não vale a pena repetir o que já todos disseram sobre as razões estruturais que estão por detrás da tragédia em que se transformou a nossa floresta. Não vale a pena - vale sempre a pena, mas não adianta nesta altura - insistir que as responsabilidades têm que ser partilhadas por PS, mais PSD, mais CDS, que são co-autores, e gestores incompetentes, do sistema que tanto sofrimento espalha neste pobre país.

O que temos que referir é que a palavra que emerge desta catástrofe é uma: incompetência. Incompetência política a começar por António Costa, o primeiro ministro. Porque não fez o óbvio: demitir a ministra e o seu, igualmente incompetente, secretário-de-estado; declarar o estado de excepção  na protecção civil, e  colocar um ponto final nas balelas pseudo-cientificas do faseamento dos períodos de combete.
António Costa foi incapaz de decretar que o Governo, depois de Pedrogão, entrava em fase Charlie, até ser capaz de de sair dela pelos seus próprios meios, sem mais portugueses a pagarem com a vida as incompetências várias, a começar pela do próprio Governo..

Incompetência Técnica que hoje grassa por vários sectores da chamada Administração Pública. Administração que foi alvo de um tsunami, liderado pelo PS, o PSD e o CDS, que varreu dos quadros uma geracção competente, que aliava formação a experiência,  que foi encostada e convidada a sair. Para ser substituída por jovens quadros partidários, de formação mais do que duvidosa,  doutrinados/doutorados nas madrassas partidárias, onde se aprende que o conhecimento não conta, o que interessa é o poder que se obtêm. Ser-se amigo de alguém com poder é a melhor formação que se pode obter em Portugal.

Parece que a  ministra se demitiu, mas em boa verdade quem se deveria demitir, porque é o mais alto responsável pelo que aconteceu, deveria ter sido António Costa. Teria mostrado a grandeza que muitos lhe reconhecem e que, ao que parece, terá sido consumida pelo fogo intenso. A sua declaração ao País foi um momento penoso.

PS - PCP e BE não foram capazes, entre as duas tragédias, de perceber que o Governo não estava a fazer nada para responder melhor às emergências do curto prazo. Há ocasiões em que a visão estratégica, sobre as causas profundas dos nossos problemas, e as grandes mudanças necessárias , provoca cegueira  de curto médio prazo. É por isso que uns são bons para governar e outros são apenas bons para estar na oposição, como eles próprios fazem questão de nos recordar sempre que podem.

17/10/17

Com o voto censitário no horizonte

Mais interesantes do que as recomendações que Owen Jones sugere ao Labour, nesta sua crónica, é o facto de esta deixar claro, para quem tome bem nota do que lê e reflicta sobre os dados da questão, que estamos perante os primeiros passos de restringir o sufrágio universal e de reinstituir o voto censitário.

12/10/17

Sondagem em Évora sobre a construção de uma ponte a ligar Nova Iorque a Nova Jersey

Parece que a maioria dos alemães são contra a independência da Catalunha:

Germany, Civey poll:  

Independent Catalonia?  
Support: 21% 
Not support: 69%

Soberania?

Através da página do Zé Neves no fb, cheguei a um artigo de Wallerstein sobre as ambiguidades do conceito de soberania. Ora bem, o artigo é claro, mas o verdadeiro problema não está na incerteza do conceito de soberania (bem demonstrada, de resto). O verdadeiro problema está na oposição que devemos estabelecer entre soberania e democracia. A democracia é o poder, igualitariamente participado, dos cidadãos comuns sobre as condições da sua existência comum. Não tem a ver com a independência nacional e, mais ainda, sendo um poder alternativo e contrário ao do Estado, terá de combater desde o início a divisão (social) do trabalho político que é própria do Estado-nação. Assim, poderia talvez falar-se de "soberania" democrática dos cidadãos. Mas não creio que isso nos leve muito longe, uma vez que, não havendo soberano sem súbditos, parece um tanto contraditório e equívoco falar de soberania democrática. É certo que a cidadania governante que caracteriza a democracia pressupõe que os cidadãos saibam governar-se e ser governados por si próprios. Simplesmente, é evidente que estaremos a falar assim de uma forma de governo que exclui a divisão — ou, se se quiser, a existência — de soberanos e súbditos.

10/10/17

O pecado original da esquerda à esquerda do PS - I

Depois do pequeno cataclismo eleitoral que abanou os alicerces da Geringonça, sucederam-se as declarações políticas mais ou menos imprudentes, para dizer o mínimo.
A turbulência deslocou-se para o interior da CDU, ou melhor dizendo, do PCP. Confrontado com a maior perda de autarquias num só acto eleitoral, o PCP começou por reagir de forma moderada. O apoio ao Governo,  esclareceu desde logo Jerónimo de Sousa, manter-se-ia enquanto as políticas que são fundamentais para o PCP se mantivessem. No entanto, uma certeza o secretário-geral do PCP deixou: não haveria qualquer forma de Geringonça, a nível autárquico.

Na semana seguinte o PCP realizou uma série de comícios e as declarações foram-se sucedendo. As mais inesperadas elegeram o PS e o BE como principais responsáveis pela perdas da CDU. Jerónimo de Sousa afirmou mesmo que

 "Vimos uma intervenção do PS a desenvolver uma ação a partir dos seus candidatos e alguns dirigentes partidários, particularmente concentrada em municípios de maioria da CDU, de ataque à gestão da CDU baseada em argumentos falsos e muitas vezes ofensivos"  

para de seguida, referindo-se ao BE afirmar  que 

"a opção do BE de fazer da redução da influência da CDU o seu objetivo principal, não olhando a meios para, por via da falsificação e mesmo da calúnia, denegrir a CDU e o poder local"

Na verdade, nove em dez autarquias, que os comunistas perderam,  foram conquistadas pelo PS à CDU. Entre essas  destaca-se Almada como  a mais dificil de aceitar, até porque a candidatura socialista, liderada por Inês Medeiros, parecia ser apenas para cumprir calendário. A candidata, agora eleita, não se cansou de mostrar a sua surpresa, louve-se a sinceridade. Na verdade o PS não subiu assim tanto. Limitou-se a conquistar um vereador e beneficiou da subida do BE que elegeu um vereador pela primeira vez. A CDU passou de maioria absoluta - com 6 vereadores - para a segunda força política do concelho, atrás do PS. Haverá uma pequena consolação para a CDU: PS e BE, juntos, não conseguem a maioria absoluta.

O outro resultado que terá azedado ainda mais as relações com o BE, é o de Lisboa. Com o vereador do BE, Medina obtêm a maioria absoluta. Os dois vereadores da CDU são dispensáveis para que a Geringonça possa funcionar, ainda que uma Geringonça com dois apoios, que pode testar a solução pós-eleições legislativas de 2019. Medina, no entanto, já mostrou disponibilidade para partilhar as responsabilidades com a CDU, o que faz todo o sentido politicamente.


A CDU encontra-se prisioneira de um erro político que cometeu na fase inicial da negociação do apoio ao Governo: ter-se recusado a integrar o Executivo. O mesmo erro cometeu o BE, mas as consequências neste caso, só serão visíveis nas próximas eleições legislativas, dada a falta de expressão autárquica do partido.

Como escrevi então o alíbi para cometer esse erro, foi a União Europeia. Um péssimo alíbi. Integrando o Governo, a CDU e o BE, assumiam a responsabilidade plena pelas políticas, e reforçavam aqueles que, no Governo e fora dele, lutam pelas alterações da política europeia, que ambos os partidos também defendem. A opção tomada permitiu ao PS reforçar-se, como as sucessivas sondagens mostraram, e sabemos agora que não eram apenas sondagens. Mesmo velhos bastiões comunistas foam sensíveis ao canto dos socialistas, de nada valendo ao PCP clamar que quem garantiu o aumento das reformas foi o PCP. As pessoas "sabem" que foi o Governo, pouco lhes interessando quem os apoiou no Parlamento, ou que exigiu essas mudanças nas negociações. O PCP deveria saber que o povo injustiçado é justo.

O PS está, por esta altura, à beira da maioria absoluta. No limite bastar-lhe-á negociar com o BE para governar mais quatro anos. Tudo dependerá do caminho que o PSD decidir seguir. Depois de ter virado brutalmente à direita, com Passos, o PSD foi incapaz de mudar de rumo. Esse tempo terá cessado na declaração de não recandidatura do líder do PSD. Há um candidato - Rui Rio - que defende uma viragem à esquerda, para ocupar o famigerado centro, de que os socialistas não abdicaram. pese embora a Geringonça. Há os jovens turcos, que Passos ajudou a crescer, que não desistem de conduzir o partido para a um patamar de irrelevância política, apoiados num discurso supostamente liberal mas que na verdade é, em muitos casos, apenas e só libertariano.
Sobra a líder do CDS, que conseguiu afastar o fantasma de Portas e mostrou que, em hipocrisia política, não fica nada a dever ao saudoso líder. A campanha por Lisboa foi um fartote de promessas, todas elas apenas possíveis com um forte aumento da despesa pública e o aumento dos impostos. Para quem disse o que disse do actual Governo. Para quem fez o que fez no anterior Governo, vir defender obras públicas a torto e a direito e habitação em Lisboa para todos já prámanhã, é preciso ter muita lata.



05/10/17

Heurística para decidir o voto em referendos sobre secessões

Isto é muito mais complexo e depende de muitos caso a caso, mas a minha primeira inclinação é:

Se o referendo for legal, votar "Não".

Se for ilegal, votar "Sim".

Explicação - a lei permitir ou não organizar um referendo sobre a independência é um dos melhores critérios para distinguir entre "cooperação entre os povos" e"opressão imperialista".

Catalunha = Brexit?

O economista Paul de Grauwe argumenta que o independentismo catalão e o brexit são fruto do mesmo nacionalismo.

Talvez sim, mas há uma grande diferença - no dia do referendo do Brexit e nos imediatamente anteriores, a UE não enviou policia e exército para o Reino Unido para impedir o referendo; não deu ordens aos correios britânicos  para não distribuírem correio relacionado com o processo referendário; não bloqueou os sites relacionados com o referendo; não prendeu ministros do governo britânico; ninguém levantou a hipótese de suspender a independência britânica ou dissolver o seu governo.

Ou seja, no ponto "The first myth is that there is an external enemy. For the Brexiteers these are the European authorities (the European Commission, the European Court, etc.), which impose their arbitrary will on Britain. For the Catalan nationalists the enemy is the Spanish government oppressing the Catalan people." há uma diferença clara entre a situação britânica e a catalã.

04/10/17

O pecado original da esquerda à esquerda do PS

A Geringonça autárquica recebeu a extrema unção na reunião do comité central do PCP, que reuniu no passado dia 3, ainda abananados pelos resultados nas eleições autárquicas.
Medina pode esperar sentado se quiser repetir em Lisboa a fórmula que Costa ensaiou no País e que tão bons resultados deu... ao PS. O PCP viu-se desapossado, pelos socialistas, de nove câmaras.Não se faz, uma coisa assim. Não terá sido de propósito, poderia dizer Costa, se pudesse. Mas aconteceu.

Neste momento podemos fazer as leituras que quisermos mas há uma única conclusão possível: o PS capitaliza esta aliança politica em proveito próprio, quase exclusivo.

O caso do PCP é agora o mais referido, até porque o BE, no nível em que está em termos autárquicos, nada podia perder nestas eleições. Se a eleição de um vereador em Lisboa dá para festejar tanto - um regresso aos tempos de Sá Fernandes, repare-se - podemos imaginar que o BE nao contava para este campeonato. Deve ser esse o significado de contribuir para uma grande vitória da esquerda. 
O PCP, cautelosamente, não se arrisca a chumbar o próximo  Orçamento porque sabe que, neste preciso momento, com tudo a desfazer-se à sua volta, António Costa pode cair na tentação de aproveitar a minima gaffe para marcar eleições antecipadas. Nesse cenário seria previsível que PCP e BE sofressem duas derrotas colossais. 

Afinal qual foi o problema?  Na altura da formação do Governo com apoio parlamentar das esquerdas, dissemos, [aqui, aqui, ] que não integrar o Governo era um erro crasso. Escrevi então

"Gostaria de ter escrito neste post que Portugal vai ter um Governo que resulta de uma coligação pós eleitoral dos três partidos que suportam politicamente o Governo. Em que todos os partidos comprometidos se envolviam a fundo nas responsabilidades governativas, na construção das respostas políticas de todos os dias.  Não foi essa a vontade dos protagonistas e foi pena, acho eu. Mas essa reflexão fica para depois"


Pois foi. Fora do Governo, a leste da gestão do Quadro Comunitário, sem ter nenhuma responsabilidade politica efectiva em nada do que vai correndo bem no País, continuando a clamar contra a austeridade ainda dominante na saúde na educção e contra a falta de uma politica de habitação, cuja responsabilidade é do Governo que apoiam, o PCP e o BE, podem sentir-se incompreendidos, mas mostram que não compreenderam o verdadeiro desafio que tinham pela frente. 

A posição do PCP relativamente à Europa justifica a posição que tomaram. No caso do BE foi em tempo esclarecido por Mariana Mortágua que também era isso.

"(...)Aquilo que permite um acordo com estas características, mas não permite uma coligação de Governo diz respeito àquilo que nos diferencia. Estou a falar das questões europeias, do Tratado Orçamental, da dívida(...)"   disse ela.

Pois foi. Um erro crasso, cujas consequências ainda agora começamos a entender. A pouco e pouco, mas com passo certo. Apoiar um Governo de esquerda naquele quadro politico concreto foi uma opção politicamente inatacável. Ficar fora do Governo por sectarismo e falta de visão foi um erro crasso. Mais tarde ou mais cedo pagam-se esses erros. 

02/10/17

Trocas de argumentos sobre o referendo catalão

Tyler Cowen, no Marginal Revolution: Isn’t the truly democratic procedure to let all of Spain vote on Catalonian independence?

Resposta de um comentador: Does this work the other way? If 144 million Russians vote to annex Estonia, and 1.4 million Estonians vote to reject annexation, then isn’t there 99% democratic support? If the logic of who constitutes the electorate applies to secession, why not annexation?

Uma grande vitória da esquerda? (Corrigido)

Não faltam por aí declarações sobre a grande vitória da esquerda. Era inevitável, face ao desastre anunciado do PSD e ao reforço do PS.  Há uma vitória do PS, isso é indiscutível. A maior vitória do PS, que colhe no seu regaço os frutos da politica que tem sido seguida pelo Governo.
No entanto, se olharmos mais ao perto, vemos coisas relativamente diferentes e que querem dizer outras coisas.
Por exemplo, em Lisboa. Fernando Medina obteve um importante vitória mas, e neste caso o mas faz uma enorme diferença, perdeu a maioria absoluta. Perdeu 10.315 votos - 8,9 % do que Costa obtivera em 2013 - e tem menos três vereadores. Desses 10.345votos, a quase totalidade foi absorvida pelo crescimento dos partidos à esquerda. O Bloco regista uma subida de quase 7500 votos e a CDU de 1600 votos. Quando comparamos com 2013 verifica-se que o PS perde votos para os parceiros da Geringonça, um pouco ao contrário do que se passou no resto do País. .
A direita em Lisboa cresce à custa do CDS, já que o PSD tem o pior resultado desde que Helena Roseta liderou a candidatura do partido à Câmara de Lisboa em 1976. Juntos, CDS e PSD, somam 31,80% dos votos, quando em 2013 tinham obtido 22,37% . No seu conjunto a direita aumentou a votação em Lisboa em 29.162 votos quando comparado com 2013.

A Geringonça em Lisboa é a única forma de Medina governar com maioria. A CDU irá decidir se haverá uma Geringonça municipal ou não. Por aqui se comecará a testar como está o instinto de sobrevivência dos comunistas, e o futuro da outra geringonça, a geringonça "grande". O Bloco, que é cada vez mais apenas e só aquilo que sempre foi, um partido parlamentar, já mostrou que recebeu esta eleição de um vereador em Lisboa - concelho em que obteve 29.105 votos em 2015 e agora 18003 - como uma grande vitória. A sua disponibilidade para viabilizar a geringonça municipal é total. A capacidade para influenciar a politica municipal parece diminuta. Aliás, o BE foi o único partido que clamou por uma vitória da esquerda. Até a CDU reconheceu que teve uma pesada derrota. O Bloco que teve menos de 4% dos votos a nível nacional está contente. Os melhores resultados obtidos em eleições legislativas não se traduzem nas eleições autárquicas. O PS reclamou, e com razão, a sua vitória.

Almada, uma cidade com uma gestão municipal comunista, desde sempre, e com um trabalho de qualidade num contesto difícil - curiosamente passei a tarde-noite do sábado antes das eleições na fantástica Casa da Cerca, um centro cultural em Almada Velha, com uma localização única, debruçada sobre o Tejo e sobre Lisboa -foi conquistada pelo PS. O enésimo candidato "itinerante, antes chamavam-se paraquedistas, mobilizado pelo PS para a "tarefa impossível" - desta vez coube a  Inês Medeiros - ganhou por 213 votos. Inês irá atravessar todos os dias o Tejo, de cacilheiro, para ir trabalhar, já avisou. Fica-lhe bem assumir essa itinerância. Neste caso, com excepção de um ou outro eleitor retirado da abstenção, parece ter havido uma transferência directa entre CDU e PS. Uma questão tratada no interior da Geringonça, podemos dizer. Na primeira abordagem minimizei a importância da eleição de um vereador pelo Bloco. Isso traduziu um importante aumento do número de votos, que passaram de 3250 para 6409)

O PS obteve uma grande vitória. A primeira com António Costa. Obteve um número recorde de autarquias e assistiu à implosão da liderança do PSD. Mas, venha quem vier, os tempos irão piorar. Passos era único, e o melhor amigo do PS e de Costa.

Jerónimo de Sousa tem a CDU a clamar por uma ida às termas. Talvez seja possível aproveitar para, entre as massagens e as inalações, parar algum tempo e pensar nos "camaradas" de Angola, Coreia-do Norte e Venezuela, e olhar para o mundo com uma visão mais límpida e menos conservadora.

O BE caiu um trambolhão abaixo do patamar a que tinha subido em 2015. Pouco importará, já que o partido continua no Parlamento, que é o local onde o partido existe, a que se somarão os Paços do Concelho da capital, logo ali ao lado. Por isso os sorrisos, ainda que forçados, não dão testemunho dessa queda abrupta.
Teixeira Lopes, ainda não foi desta que foi eleito no Porto. Mas, em 2021 haverá novas eleições.

PS - Havia vários erros nos números referidos para as votações em Lisboa. O crescimento da direita é superior ao que tínhamos referido. Do mesmo modo, o crescimento do PCP e do BE, que se traduziu em mais um vereador eleito pelo Bloco, absorveu a perda de votos do PS, sendo que os outros dois vereadores perdidos pelos socialistas foram ganhos pelo CDS. A direita tinha 4 vereadores passa a ter 6. A esquerda tinha 13 (11+2)  passa a ter 11(8+2+1). O vereador do BE pode colocar o PS em maioria na autarquia, dispensando o PCP.