30/06/17

Preparar a saída vs. preparar a permanência no euro

Isto é uma conversa já um bocado atrasada, sobre a eventual saída do euro (ver os artigos de Luís Aguiar-Conraria, os vários de Rui Tavares, de Carlos Carvalhas e de José Gusmão, entre outros), mas de qualquer maneira vou também dizer qualquer coisa.

Para começar, seria conveniente distinguir entre dois tipos de defesa da saída do euro: os que acham que sair do euro é intrinsecamente bom (porque permite ganhar competitividade, ou controlar a politica monetária, ou lá o que for), e os que são simplesmente a favor de uma reestruturação unilateral da dívida, e acham que tal levará a termos que sair do euro (pelo nosso pé ou expulsos, como ia acontecendo à Grécia em 2015) - pondo de outra maneira, a saída do euro pode ser vista como uma coisa boa em sim mesma, ou como uma coisa em si má mas que é o preço a pagar pela reestruturação da dívida.

Um exemplo de que como esta distinção é importante é a questão de se a saída do euro vai ou não originar um aumento do serviço da dívida, e das implicações jurídicas associadas (se a dívida continuava em euros, se passava para escudos, etc.) - no cenário de saída na sequência de uma reestruturação unilateral, essa questão não faz qualquer sentido, parece-me.

O LA-C escreve "Se, na verdade, bastassem as emissões serem feitas em Direito português para podermos alterar unilateralmente os termos dessas mesmas emissões, então há um método muito mais simples para atingir o objectivo: basta reduzir o valor a reembolsar previsto. Ou seja, em vez de se mudar a alínea que diz que os títulos de dívida estão denominados em Euros, altera-se a alínea que diz qual o valor de reembolso." - mas e se isso tivesse como resposta que o BCE deixasse de fornecer notas de euro aos bancos portugueses, provocando (até por profecia auto-cumprida) uma corrida aos bancos, ficando estes sem poder garantir os seus depósitos?

Neste contexto, de uma saída como resultado (não desejado mas assumido) de uma reestruturação unilateral, acho que também não é muito relevante a questão da saída aumentar ou não a "competitividade"; ou melhor, se a saída piorar a competitividade, é mau, mas não é problemático se simplesmente não a melhorar (só a seria se a saída do euro fosse justificada com argumento de aumentar a competitividade).

Mas, por outro lado, se a saída do euro não for vista como um fim em si mesmo mas apenas como um mal necessário imposto pela reestruturação da dívida, acho que isso significa que se devia, não só preparar a saída do euro, mas também estudar a possibilidade de tentar permanecer no euro mesmo contra a vontade do BCE (uma espécie de cenário Montenegro) - aliás, as duas preparações nem são contraditórios (medidas que são apresentadas pelos partidários da saída do euro como necessárias para preparar essa saída - como constituir reservas de divisas para aguentar o valor do novo escudo - também contribuiriam para ajudar a manter um uso unilateral do euro.

Algumas medidas que poderiam ser tomadas para o país se manter unilateralmente no euro:

Congelamento quase total dos levantamentos bancários, só se podendo efetuar pagamentos por multibanco ou transferência. 

Isto é mais radical que na Grécia - na Grécia podia-se levantar 120 euros por semana; o que estou a sugerir é que, tirando um pequeno montante inicial, depois não se pudesse levantar mais nada. Paradoxalmente, acho que isso seria menos desestabilizador - na Grécia, os 120 euros por semana levavam a que  as pessoas estivessem sempre a levantar dinheiros, que os bancos estivessem com os cofres mais vazios de dia para dia, e que houvesse um clima constante de "vão aguentar mais um dia ou, com os bancos vazios, vão ceder?". Pelo contrário, uma decisão do tipo "a partir de agora, já não se levanta mais dinheiro nenhum" acabaria por levar a uma situação mais estável e menos incerta (e, nesse cenário, era maior o incentivo à economia se adaptar a funcionar com pouco dinheiro líquido - consta que no ponto alto da crise grega, muitos estabelecimentos comerciais recusavam-se a aceitar pagamentos por cartão "multibanco"; mas e se tal fosse mesmo quase a única alternativa , e sem isso não tivessem clientes?)

Reservas bancárias a 100%

Isto provavelmente não seria possível implementar do pé para a mão, mas num sistema em que o dinheiro dos depósitos à ordem tivesse que estar mesmo no banco (como se fosse dinheiro guardado num cofre), e os depósitos a prazo só pudessem ser mesmo levantados no fim do prazo (como se fossem puras aplicações financeiras), o BCE não poderia "fechar" os bancos recusando-lhes crédito (mas não estou seguro que isto não tivesse mais desvantagens que vantagens).

Além disso, há outras coisas que frequentemente são apresentadas como negativas, mas até poderiam ser úteis neste cenário:

- A integração cada vez maior dos bancos portugueses em grupos bancários transnacionais. Isto é visto como mau por muita gente ("Já não controlamos os sectores chave da nossa economia!" - fará uma grande diferença se quem controla a economia vive no Estoril com dinheiro guardado no Liechenstein ou se vive em Paris com dinheiro guardado no Luxemburgo?), mas penso que tornaria mais difícil o BCE cortar a torneira à economia portuguesa (alguém escrevia em tempos que a razão porque as cidades norte-americanas que vão à falência não são expulsas do dólar é porque os bancos norte-americanos são nacionais, não são "de cidade", logo o município pode falir sem isso levar os bancos locais à falência)

- Nos primeiros meses do governo Syriza na Grécia houve uma enorme saída de capitais para o estrangeiro. Retrospetivamente, tem sido dito (p.ex., pelo Francisco Louçã) que foi um erro não ter imposto controles para impedir essa saída de capitais; mas eu continuo na minha - o azar do gregos foi não ter havido suficiente fuga de capitais: se o dinheiro tivesse sido quase todo levantado/transferido enquanto o BCE emprestava aos bancos gregos, o corte do financiamento teria sido muito menos problemático; afinal, se já não houvesse depósitos nos bancos gregos, que mal vinha ao mundo se os bancos gregos não tivessem dinheiro líquido. Neste momento não sei se um novo confronto entre a Grécia e "as instituições" não teria um resultado diferente, já que não me admirava se já quase não houvesse depósitos nos bancos gregos. Mas no caso português penso que este ponto não é relevante, já que suponho que não haja cá nenhuma fuga de capitais.

Finalmente, pelo que sei, há uma grande diferença entre Portugal e a Grécia: os portugueses usam muito, e acho que mesmo muito, o Multibanco (ou, para ser mais exato, o Multibanco e o Visa Electron, a que toda a gente chama simplesmente "multibanco", tal como as lâminas de barbear são gillettes e os veículos todo-o-terreno são jeeps), o que tornaria mais fácil viver com os levantamentos congelados.

Atenção, não se entenda este post como uma defesa da opção "default permanecendo no euro" (isto é, aquela opção que eu passei grande parte da crise grega a defender), mas ainda não estou convencido que (apesar do que ocorreu na Grécia em 2015) seja uma estratégia a descartar totalmente.

Ordem dos Médicos contra liberdade de expressão e opinião

Ordem dos Médicos acusa Direção-geral da Saúde de ter pessoas ligadas a associações anti-vacinas:
O bastonário Miguel Guimarães defende, aliás, que o Governo já devia ter apresentado queixa no Ministério Público contra associações que fazem publicidade contrária às vacinas, não compreendendo que a Direção-geral da Saúde (DGS) albergue pessoas que pertencem a instituições daquelas.

“Está a acontecer um fenómeno sobre o qual o Governo nada está a fazer, que é a publicidade que está a ser feita sobre a questão da vacinação por algumas instituições. Não podemos aceitar que, por exemplo, a chamada Sociedade Portuguesa de Homeopatia passe a mensagem para os portugueses de que as vacinas são más. E estou a ser simpático, porque o que dizem sobre vacinas é absolutamente pavoroso”, afirmou à agência Lusa o bastonário dos Médicos. (...)

Miguel Guimarães insurge-se ainda contra o facto de “trabalharem na DGS pessoas que estão ligadas a este tipo de associações” que promovem a não vacinação: O “não é aceitável que no seio da DGS existam pessoas a trabalhar que promovem exatamente o contrário daquilo que a própria DGS promove”.
Primeiro ponto - eu acho que o movimento anti-vacinas baseia-se em mitos urbanos e em pseudo-estudos que foram há muito desmentidos (nomeadamente no que respeita à teoria de que as vacinas causam autismo, os teóricos da conspiração / críticos da medicina convencional se calhar teriam um ponto mais sólido onde pegar se alegassem que há sobre-diagnóstico de autismo, com crianças que são apenas diferentes a serem rotuladas de "autistas", do que alegando que o aumento de diagnósticos de autismo é provocado pelas vacinas.

Mas, mesmo assim, é monstruoso o que a Ordem dos Médicos está a defender - que seja proibido divulgar propaganda anti-vacinas e que os anti-vacinação não possam trabalhar na Direção-Geral de Saúde: nunca ouviram falar em "liberdade de expressão" ou em "ninguém pode ser discriminado no acesso ao emprego pelas suas opiniões"?

Poderá argumentar-se que isto é parecido ao processo contra o Manuel Pinto Coelho por causa de qualquer coisa que ele disse sobre doenças do coração, ou ao que a Ordem dos Psicólogos falou em levantar aquela psiquiatra homofóbica, mas é diferente, acho - nesses casos (sobretudo no segundo) as opiniões que eles expressam fazem quase intrinsecamente parte da sua atividade: uma psicóloga que diga a um paciente homossexual que ele tem que sofrer por ser homossexual e que deve deixar de o ser não está simplesmente a expressar uma opinião, está a aplicar-lhe ums dada "terapia" (o caso do Manuel Pinto Coelho é um pouco diferente, já que penso que ele nem trabalha em recomendações alimentares, mas quando um médico dá uma entrevista sobre questões de saúde, há sempre uma tendência de quem lê a entrevista para a ler como sendo uma opinião de um médico, e não como a opinião pessoal de alguém que até é médico). Mas no caso de pessoas que trabalham na Direção-Geral de Saúde, desde que no seu trabalho das 9 às 5 executem as diretizes da DGS, o que é que interessa a que associações pertencem ou deixem de pertencer (uma analogia - um defensor da legalização das drogas não pode trabalhar na Polícia Judiciária?).

29/06/17

Integrar os terrenos "não-cuidados" nas matas nacionais?

Ultimamente têm surgido propostas para nacionalizar, integrar nas matas nacionais, etc, os terrenos florestais considerados ao abandono.

Algo que receio nisso é que a integração nas matas nacionais pode ser o primeiro passo para um governo seguinte as privatizar, produzindo como resultado final a transferência dos pequenos proprietários para os grandes (1ª fase, com a esquerda no governo: pequenos proprietários → matas nacionais; 2ª fase, com a direita no governo: matas nacionais → grandes proprietários).

As "guerras do bife" na Índia

To protest Modi, these Indians are cooking beef in public (Washington Post, 2017/06/06):
In this sleepy, palm-fringed city in southern India, eating beef has become a political act. On May 23, the Indian government introduced new anti-animal-cruelty rules, restricting the sale of cattle in markets. The move was widely interpreted as an attempt to close in on the country’s thriving beef industry, in line with right-wing Hindu ideology, according to which the cow is considered holy.

Some think the new rules are too draconian. For the past week here in the southern state of Kerala, people have gathered with pots and pans and firewood to cook beef and share it with strangers in the streets, a convivial form of protest. Many Hindus, who usually avoid cooking or eating beef, have joined the feasts. (...)

Small-time beef and leather traders will bear the brunt in India. Most of them are Muslims and lowest-caste Dalits — the people once called “untouchables” — since Hindus historically considered these jobs “unclean.” According to Jayakumari Devika, associate professor and historian at the Center for Development Studies in Kerala, the rules will allow large supermarket chains to control supply.
Not In My Name: Indians protest attacks on Muslims (Al-Jazeera, 2017/06/28):
Thousands of people have turned out in protests across India against a wave of attacks on Muslims by mobs that accuse them of killing cows or eating beef.

Waving "Not in My Name" banners and "Stop Cow Terrorism" placards on Wednesday, protesters braved monsoon rains in at least 10 cities including Mumbai, Kolkata and Delhi where a cast of intellectuals and activists were joined by relatives of recent lynching victims.
Ocorre-me que tudo isto pode parecer estranho para nós, ocidentais - um governo da direita reacionária a aprovar legislação (alegadamente) contra a crueldade animal, e os sectores "progresistas", digamos (o Kerala, onde parece haver mais "festas do bife", é dos estados mais à esquerda da Índia), a apoiar manifestações em nome do direito a comer carne de vaca.

26/06/17

A politização das catástrofes. Quem falou em crimes?

No Reino Unido o deputado trabalhista, e um dos mais destacados dirigente da corrente mais à esquerda do partido, John McDonnell, veio a público declarar que as vitimas do incêndio na Torre Grenfell - 79 pessoas  e não 100 como aqui escrevi - foram assassinados pelas decisões politicas que se tomaram[ou que se omitiram].

Esta declaração proferida num debate organizado pelo jornal Guardian no âmbito do festival de Glastonbury -  que constituiu uma oportunidade para mais uma vez mostrar a extraordinária popularidade de que gozam  neste momento Corbyn e as suas ideias - foi repudiada pelos conservadores que acusaram McDonnell de estar a politizar a tragédia.

O Reino Unido ter-se tornado o pais mais desigual da União Europeia representa uma vitória do projecto político liderado pelos conservadores. O Reino Unido é a máxima expressão do neoliberalismo na Europa. Thatcher se pudesse assistir estaria muito orgulhosa do trabalho feito e dos seus seguidores,

Acidentes como o incêndio na Torre Grenfell são determinados pelas decisões politicas que se tomam. Pelas opções que se fazem.  Já aqui escrevi sobre isso. Não  me vou repetir.
Pretender que, seja sob que pretexto for,  criticar os politicos pelas consequências dos seus actos  é uma tentativa de politizar as desgraças que causaram, é uma pura irracionalidade e uma tentativa de os colocar  incólumes e intocados  pelas decisões que tomaram.

As decisões politicas visaram diminuir os custos do Estado com as suas obrigações e permitir às empresas maximizar os lucros, promovendo uma reabilitação de segunda qualidade para cidadãos de segunda qualidade, para os quais uma segurança de segunda qualidade é considerada mais do que suficiente. Por isso o braço-direito de Corbyn se mostrou tão implacável:

“The decisions not to build homes and to view housing as only for financial speculation rather than for meeting a basic human need, made by politicians over decades, murdered those families,” he said. “The decision to close fire stations and to cut 10,000 firefighters and then to freeze their pay for over a decade contributed to those deaths inevitably and they were political decisions.”

Politica de habitação, com, entre outras,  a decisão de não construir casas para os mais necessitados. Deixar a habitação entregue ao mercado e encarada como (mais) um negócio e não como um direito e uma necessidade básica. Fechar serviços públicos relacionados com a segurança dos cidadãos. Cortar postos de trabalho, neste caso 10 mil bombeiros, mas podia ser em qualquer outro sector. Congelar os salários públicos - há uma década -  para forçar o emagrecimento do Estado e abrir os diferentes sectores aos negócios, ao mesmo tempo que se promove uma violenta redução nos salários.

Todos os que acompanham a politica do Reino Unido sabem bem que MacDonnell quando se refere a décadas de crimes contra as pessoas, sobretudo de crimes contra os mais pobres, não está só a falar dos conservadores.

Posto isto, e salvaguardadas as diferenças entre o incêndio de Londres e o incêndio de Pedrógão, sobre a qual já aqui escrevi, não se percebe como pode o que se passou em Pedrogão Grande e na região, passar sem uma urgente responsabilização politica. Responsabilização politica dos que ao longo de décadas tomaram as decisões que tornaram a floresta um pasto deste tipo de incêndios que são o que resta para toda a população portuguesa depois dos abutres distribuirem os dividendos dos negócios que o Estado subserviente lhes atribuiu.

Responsabilização politica daqueles que, neste preciso momento, prosseguem, apesar da retórica reforçada depois de cada tragédia, as nefastas politicas que culminam numa qualquer estrada da morte onde os cidadãos são abatidos.  Quer seja a politica da eucaliptização acelerada  do espaço rural, com fundos comunitários mobilizados para potenciar as tragédias futuras, quer seja uma politica de comunicações que atribuiu aos privados, organizados sob a sinistra sigla SIRESP. a possibilidade de distríbuirem os seus garantidos dividendos, mesmo quando a falência desse sistema acelerou a condução de 64 pessoas para o local onde seriam mortos.

Não se percebe por isso duas coisas: a conversa sem sentido de Passos Coelho, ele que geriu o País durante uma legislatura e que nada fez, nem para mudar a politica florestal, antes pelo contrário,  nem para questionar os negócios que os privados, quase todos da sua área politica, asseguraram com a conivência do Estado. Negócios em que a única coisa que interessa é a renda sendo a simples eficácia uma coisa secundária, morra quem morrer;
a lentidão de António Costa, que conhece como poucos esta área de actuação do Estado, já que foi ministro da Administração Interna e da Justiça, e que parece estar  à espera do último relatório técnico para depois agir. Como se o que se passou tivesse uma causa próxima, relativa aos últimos dias ou semanas e não resultasse de opções politicas de fundo, com décadas, que o seu Governo ainda não foi capaz de inverter.
Como se mostra de forma chocante  com a absurda decisão de manter o financiamento público de 9 milhões para alimentar a gula das celuloses. Tudo devidamente embrulhado na lenga-lenga do costume sobre a necessidade de ordenar a floresta e de garantir a matéria prima de uma fileira industrial estratégica.

António Costa tem que ser capaz de fazer as coisas de forma diferente e de uma forma comprometida com o futuro,  independente dos poderes corporativos que oneram desde sempre o desenvolvimento do país. Conta com um apoio parlamentar e politico sem precedentes. Está nas suas mãos fazer aquilo que tem de ser feito. Há decisões que são, como ele sabe melhor do que ninguém, do domínio da política.

20/06/17

Incêndios: Um debate esclarecedor.

Sendo os incêndios uma catástrofe natural - a menos que a ignição seja provocada por meios humanos criminosos - as suas consequências não são de todo naturais. Sobre isso já aqui escrevi repetidamente. Passa-se com os incêndios o que se passa com os sismos, sendo que no caso dos sismos as consequências são vistas à escala dos edificios e no caso dos incêndios elas fazem-se sentir à escala do território.

O debate sobre esta questão tem sido uma conversa de surdos. Quer isto dizer que não tem havido debate nenhum. O que tem acontecido é a adopção de uma orientação politica consensual - o consenso pode ser uma coisa péssima, como sabemos - que, infelizmente para todos nós, tem tanto de consensual como de profundamente errada.

A opção que os sucessivos governos valorizaram foi a do combate. Os seus esforços centraram-se na protecção civil e dentro deste opção, ainda ontem o Secretário de Estado o esclarecia sem tibiezas, todos os esforços são canalizados para a primeira intervenção.

Esta intervenção do secretário de estado aconteceu no Prós e Contra de ontem à noite. Um programa profundamente esclarecedor. De um lado estavam os membros do Governo e das forças que no terreno corporizam toda a estratégia de combate aos incêndios. No outro lado alguns poucos académicos, com destaque para o professor catedrático do Instituto Superior de Agronomia de Lisboa. De um lado o poder  do outro o saber. Afastados por milhões de hectares queimados, centenas de vitimas e milhões de euros consumidos. Quase incomunicáveis, apesar da cordialidade. Com o poder a mostar quão insensível é aos apelos do conhecimento.

Do lado do Governo defendeu-se com tenacidade a estratégia seguida. A aposta no combate, acha o senhor secretário de estado, é inatacável, já que cerca de 99% dos fogos não sobrevivem à primeira intervenção da estrutura operacional. Um resultado estatisticamente esmagador, acha ele, bem como os comendantes que usaram da palavra. Havia na sala um lago consenso sobre os méritos da politica seguida.

Este convencimento com o mérito da politica pública adoptada manteve-se inalterado, pouco importando o que o debate acrescentou. Os efeitos devastadores em termos de vidas humanas e de área ardida foram insuficientes para retirar os representantes governativos das posições onde se encontram ... entricheirados. Nenhuma politica se fará com estas pessoas porque mesmo perante o resultado chocante das suas opções não parecem sequer poder ser assaltados pela dúvida.

Claro que a aposta deve ser na prevenção e numa intervenção permanente e continua na floresta e no território. Claro que o problema estando em parte no poder das celuloses não se resolve acabando com o eucalipto. Claro que há problemas gravíssimos associados à estrutura fundiária e ao facto de se ter verificado um crescente exôdo rural e uma crescente urbanização das geracções mais novas.

Claro que nenhum país sobrevive à rotura sistemática com a cultura profunda e com o conhecimento adquirido ao longo de centenas de anos. Sobretudo quando essa cultura e esse conhecimento eram o fruto de um longo percurso de defesa e de valorização do interesse público. É por isso que nenhum decisor politico aparece a defender a recuperação dos serviços florestais. A classe politica é iminentemente moderna e não olha para o passado, tem os olhos postos no futuro.


Há um problema de fundo com a prevenção. Ela impede os negócios do combate, um pasto fértil que se renova ano após ano. Numa lógica neoliberal o Estado deve ceder o passo aos negócios, ao Mercado, e deve reservar-se  meras funções de cordenação e de regulação. Para que tudo funcione bem deve abster-se de adoptar politicas intervencionistas deixando às empresas a intervenção reparadora e disponibilizando os fundos públicos - pagos com o dinheio dos contribuintes - de que elas se alimentam.
Quando o Mercado entender que retirará mais benefício da prevenção do que do combate, a politica pública mudará e o cluster dos incêndios mudará de orientação mantendo no essencial os mesmos protagonistas.

Há politicas que desde o ínicio da decada de 2000 se mantiveram inalteradas. Esta foi uma delas. Podemos dizer que Portugal foi um País Neoliberal avant-la-lettre e que a esquerda democrática tem muita responsabilidade nessa façanha. Parece ser verdade que ninguém renega aquilo que criou.

PS - este é um debate em que de um lado se colocam os politicos e do outro os especialistas. O que aqui escrevo não beneficia de qualquer dessas protecções. É sempre do lado da cidadania.

Leituras imprescindíveis

Tirar a floresta das mãos do eucalipto, por João Camargo

"(...)E continuará a haver fogos, mas menos incêndios catastróficos. Está na nossa mão fazer com que sejam menos violentos e menos frequentes. Para isso temos de tirar o apoio às celuloses e dá-lo às populações. E investir num futuro que não voe à vontade dos desejos de uma indústria que prolifera na decadência."


Como passámos a ter estradas onde corremos o risco de ser incinerados, por Jorge Paiva

"(...)Com as montanhas ocupadas por eucaliptais, deu-se o êxodo rural pois, como os eucaliptos são cortados periodicamente de dez em dez anos, o povo não fica dez anos a olhar para as árvores em crescimento sem ter mais nada que fazer. Assim, o povo, além do abandono rural a que foi “forçado”, ficou ainda numa dependência económica monopolista, um risco para o qual não é, nem nunca foi, alertado. Desta maneira, as nossas montanhas passaram a estar cobertas por florestas mono-específicas, com árvores altamente inflamáveis (o pinheiro por ser resinoso e o eucalipto por ter produtos químicos aromáticos, arremessando ramada inflamada à distância, por esses produtos serem voláteis e explosivos).(...)"

19/06/17

Ganância extrema. Uma explicação simples. II

O incêndio que terá morto cerca de 62 pessoas em Pedrógão Grande, tem uma explicação simples, sintetizável numa só palavra: desprezo.

Desprezo pela vida dos outros sobretudo se esses são os mais pobres. Desprezo que é directamente proporcional à ganância que anima os agentes cuja intervenção possibilita este tipo de tragédias.

O desinteresse a que os sucessivos governos promoveram o equilíbrio ecológico da floresta, e a sua aposta na visão da floresta como fonte de lucro imediato levaram a que os incêndios se tenham tornado na maior ameaça pública dos últimos anos.

Não foi por acaso que o partido Os Verdes incluiu, a quando da negociação do seu apoio parlamentar ao actual governo, como uma das sua principais exigências, a reversão da Lei do Eucalipto aprovada pela anterior governo, no que tem sido apoiado principalmente pelo Bloco de Esquerda, e consequente implementação de medidas que permitam parar e reverter a expansão do eucalipto. No entanto, após o ataque cerrado pela industria da pasta do papel à aprovação em Conselho de Ministros duma proposta de lei que substituiria a Lei do Eucalipto, apesar desta pouco mais fazer do que proclamar a necessidade de parar a expansão do eucalipto, o silêncio tem sido ensurdecedor. Aparentemente, a proposta de lei está parada na Assembleia da República, permitindo assim (propositadamente?!...) o plantio de vastas áreas de eucalipto antes da Lei do Eucalipto ser revogada.

Haverá outras medidas, de impacto mais imediato, que ajudarão a minorar o impacto dos incêndios que recorrentemente atingem o território português. Mas são todas meros paliativos enquanto não for reposto o equilíbrio ecológico da floresta portuguesa, revertendo as áreas ocupadas pelo eucalipto e o pinheiro bravo (outra espécie que constitui um perigo quando da ocorrência dum incêndio, devido a também ser altamente inflamável) em favor das espécies de árvores que constituíam a floresta portuguesa antes da sua industrialização. Não só tal floresta era mais resistente à propagação do fogo, como também era muito mais rica em biodiversidade e do ponto de vista económico para as populações locais.

Se o incêndio que devastou Pedrógão Grande foi tão destruidor isso deve-se a razões claramente imputáveis ao homem. Não se tratou de nenhum azar, nem de nenhuma catástrofe natural. Os azares são o que sobra depois de todos terem feito aquilo que é exigido e que o conhecimento técnico possibilita. Como muito bem descreve a Quercus, há décadas que é conhecido o perigo que representa a expansão do eucalipto em Portugal. Perigo sob a forma de enormes incêndios, que se propagam de forma vertiginosa. O eucalipto é a espécie de árvore que desenvolveu mecanismos mais sofisticados de protecção em caso de incêndio, e de maximização da sua reprodução após um incêndio. O eucalipto precisa de incêndios recorrentes para se reproduzir e expandir, pois não consegue crescer facilmente no meio de coberto vegetal. Aliás, é provável que várias características do eucalipto tenham evoluído de modo a fomentar e agravar a ocorrência de incêndios: uma imensa produção de matéria altamente inflamável, que se deposita no solo à espera da mais pequena faísca; casca que, quando em chamas, se solta facilmente, propagando o incêndio até grandes distâncias; óleos altamente inflamáveis que aumentam extraordinariamente a velocidade de propagação dum incêndio, transformando-o numa autêntica tempestade.

Este acontecimento terrível foi, apenas e só, uma consequência de incúrias várias e de um equilibrio funesto, em que de um lado se coloca o lucro que se pode obter e do outro a segurança das pessoas. Fazendo a balança pender assustadoramente para o lado do lucro.

Nota: Este post recupera o título, e adapta parte do excelente texto que o José Guinote aqui escreveu recentemente. Fi-lo porque acho importante estabelecer o paralelismo, para que se torne mais óbvio o padrão comum, que é bem resumido pela última frase, da autoria do José Guinote.

18/06/17

A tragédia de Pedrogão Grande. Trovoada Seca.

A razão para esta terrível carnificina já foi encontrada: razões meteorológicas, com destaque para as Trovoadas Secas.
Enquanto a [ainda] ministra da Administração Interna não se recorda do nome das duas  povoações que foram evacuadas ao início da tarde, talvez valha a pena ler o que aqui se escreve. E recordar o que se escreveu , faz agora um ano, quando da tragédia que ameaçou queimar o Funchal.

PS - depois das tragédias é sempre o tempo para tratar dos feridos, enterrar os mortos e ajudar os familiares e as comunidades. O tempo de passar da lamentação para a discussão das politicas e desta para a tomada de medidas concretas nunca chega. A voracidade da agenda não dá tempo para se chegar a esse tempo.
O que escrevi nessa altura pode ser agora repetido. As catástrofes não pararam, nem a inércia dos decisores politicos, nem tão pouco se mudaram as politicas. Estão reunidas todas as condições para tudo continuar como até aqui.

16/06/17

Ganância extrema. Uma explicação simples.



O incêndio que terá morto cerca de 100 pessoas em Londres, tem uma explicação simples, sintetizável numa só palavra: desprezo.

Desprezo pela vida dos outros sobretudo se esses são os mais pobres. Desprezo que é directamente proporcional à ganância que anima os agentes cuja intervenção possibilita este tipo de tragédias.

O desinvestimento que os Conservadores promoveram na habitação, enquanto politica pública, e a sua aposta na gentrificação e na expulsão dos mais pobres para as periferias - aposta que os trabalhistas com Blair já tinham iniciado - levaram a que o desinvestimento neste sector fosse uma imagem de marca dos últimos anos.

Não foi por acaso que Corbyn apostou numa nova politica de habitação liderada pelo Estado. Não se tratava apenas de construir mais casas, trata-se de rever o conjunto de regulamentos e intervir na definição dos preços, limitando a ganância e impondo as boas prácticas. Penalizando quem actua desprezando a segurança dos cidadãos apenas com o objectivo de maximizar o lucro.

Se o incêndio que devastou a torre  - no essencial habitada por pessoas de baixos rendimentos, por imigrantes,  ou por estudantes universitários, alguns dos quais estrangeiros - foi tão destruidor isso deve-se a razões claramente imputáveis ao homem. Não se tratou de nenhum azar, nem de nenhuma catástrofe natural. No processo de edificação já se sabe que os azares são o que sobra depois de todos terem feito aquilo que é exigido e que o conhecimento técnico possibilita. E já desde Alberti que se sabe que esgotando as possibilidades que o conhecimento técnico nos permite sobra muito pouco para os azares.

Este acidente terrível foi, apenas e só, uma consequência de incúrias várias e de um equilibrio funesto,  em que de um lado se coloca o lucro que se pode obter e do outro a segurança das pessoas. Fazendo a balança pender assustadoramente para o lado do lucro.

Ou,  talvez até mais, consequência de o Estado, obrigado, até por vários relatórios, a preparar uma resposta técnico-politica que evitasse  a catástrofe que se anunciava, ter optado por nada fazer.

Os governos conservadores afastaram os municipios, e os técnicos mais qualificados, dos problemas da habitação,  delegando esse poder nas empresas, e nos negócios, e naqueles que na área técnica se posicionam habilmente nesta cadeia produtiva, que dispensa a capacidade técnica e o rigôr na actuação, considerando-as mesmo um empecilho. A escolha de uma solução de revestimento mais barata ainda que mais inflamável, e certamente mais bonita, passe a subjectividade do conceito, é feita neste contexto.

É por outro lado fruto de uma "evolução" em que a segurança das construções é colocada num patamar de irrelevância face a outros "atributos", Neste caso valorizou-se muito a eficiência energética - há financiamentos comunitários para melhorar este aspecto do comportamento dos edificios -  e o embelezamento geral do edificio. Intervenções que se articulam muito bem com um tipo de intervenção marcada pela negligência.

Gastaram-se onze milhões de euros a "reabilitar" o edificio. Reabilitar tem aqui um significado chocante, como acontece muitas vezes. . Foram onze milhões de euros que não impediram, antes terão ajudado, à morte de  mais de cem pessoas e que ajudaram a arruinar a vida de muitos mais.

Certamente não se investiu um chavo, nos aspectos mais importantes da engenharia, como a segurança estrutural, a resistência ao fogo dos materiais utilizados, e  sobretudo na avaliação de como as intervenções parcelares funcionavam se olhadas globalmente.
Caminhos de evacuação, sistemas de alarme, meios de primeira intervenção ao nível de cada piso, formas de intervenção exterior de combate ao incêndio, nada disso existia com a eficácia que era necessária. Não estavam minimamente acauteladas. Pese embora a resposta rápida dos bombeiros o avanço do fogo foi muito mais veloz. O edificio era ele próprio um imparável rastilho à espera da primeira ignição.

Razão tinha o deputado trabalhista, David Lammy, quando afirmou logo após o incêndio que estávamos perante um homícidio perpetuado pelas empresas e entidades envolvidas e que deveria haver consequências e gente responsável deveria ser presa, julgada e condenada. Talvez por isso o Labour quer que um conjunto de questões sejam discutidas.

As sociedades mais desiguais - e o Reino Unido é hoje a sociedade mais desigual da União Europeia - tratam assim os seus cidadãos. Aos poderosos dificilmente lhes acontecerá uma carnificina assim. Os mais pobres e os remediados nunca estão a salvo da avidez de muitos e da cumplice incúria do Estado.

ACTUALIZAÇÃO (17.06.2017- 11H)  -  A propósito dos efeitos da austeridade e da sua contribuição para este tipo de catástrofes o relato de quem trabalhou para a empresa que geria o parque habitacional no qual se inclui a Grenfell Tower.





13/06/17

Possibilidades e propostas para um outro futuro



Este projecto pretende apresentar e discutir modos de organização colectiva capazes de se afirmar como verdadeiras alternativas ao capitalismo, hoje hegemónico sob diferentes formas. Uma das suas mais interessantes contribuições é a reunião de 24 textos que procuram descrever esses futuros distintos e possíveis caminhos para lá chegar:

Diversifying public ownership, andrew cumbers
Cooperative commonwealth & the partner state, john restakis
Navigating system transition in a volatile century, michael t. lewis
The joyful economy, gus speth
Cultivating community economies, j.k. gibson-graham, j. cameron, k. dombroski, s. healy & e. miller
Earthland: scenes from a civilized future, paul raskin
The economy for the common good, christian felber & gus hagelberg
The promise of a million utopias, michael shuman
Towards a new, green economy, peter a. victor & tim jackson
Six theses on saving the planet, richard smith
What’s next? Parecon, or participatory economics, michael albert
Well-being economy: a scenario for a post-growth horizontal governance system, lorenzo fioramonti
Start with worker self-directed enterprises, richard d. wolff
The good society, henning meyer
Democratizing wealth: a next system model for the u.s. south and beyond, ed whitfield
The new economy: a living earth system model, david korten
Commoning as a transformative social paradigm, david bollier
Building a cooperative solidarity commonwealth, jessica gordon nembhard
Toward democratic eco-socialism as the next world system, hans a. baer
A civic economy of provisions, marvin t. brown
Social democracy, lane kenworthy
Economic democracy, david schweickart
Participatory economics and the next system, robin hahnel
Whole systems change, riane eisler

10/06/17

Corbyn e a a social-democracia.Regresso às origens?

Uma questão de fundo suscitada pelo desempenho do Labour, sob a direcção de Corbyn, é a de saber se estamos apenas e só perante um regresso às origens da velha social-democracia europeia. Na formulação de Daniel Oliveira a esquerda recupera quando deixa de contrariar a sua natureza. Contrariar a sua natureza é, afinal, aquilo que os partidos socialistas andaram a fazer desde que, com o advento do neoliberalismo, se deixaram seduzir pela cantilena do Mercado e resolveram experimentar novas formulações politicas das quais a Terceira Via se revelou a mais mortífera.

Tendendo a concordar com a análise de Daniel Oliveira acho, no entanto, que a proposta do Labour, que Corbyn ajudou a recuperar da irrelevância politica, é bastante mais do que o regresso às origens.

Em primeiro lugar a experiência politica da social-democracia europeia, depois de décadas de prosperidade, de reconstrução da Europa pós segunda-guerra, da construção de um Estado social europeu, e de redução das desigualdades entre os cidadãos, começou a definhar quando as suas lideranças políticas começaram a emular o projecto politico neoliberal. Projecto que, no essencial, defendia um estado mínimo e uma redução ao mínimo possível da função redistributiva do estado.

A aposta nas virtudes do Mercado era justificada pela convicção de as vantagens associadas à intervenção pública na economia serem largamente prejudicadas pelos custos associados em termos de eficiência e eficácia. Estávamos, sabemos hoje, no domínio da pura propaganda, nunca verificada na realidade, pese embora alguns surtos pontuais de progresso. O mundo neoliberal e globalizado conduziu-nos quase sempre a sociedades  mais injustas e a uma maior desigualdade na distribuição da riqueza. O famigerado efeito do trickle-down nunca se confirmou, como Keynes previra,  e mesmo assim os social-democratas não deixaram de percorrer o caminho que os foi conduzindo ao abismo.

A social-democracia passou a ver com bons olhos a acumulação desigual da riqueza - há declarações várias de Tony Blair, e de muitos outros, sobre isso - na perspectiva de que isso iria permitir aumentar o investimento e, através da criação de emprego, promover à posteriori essa função redistributiva. Paralelamente o discurso politico passou a enfatizar a importância do crescimento da economia e da formação dos trabalhadores. O crescimento passou a ser o alfa e o ómega do progresso. A formação passou a ser uma condição prioritária  de acesso aos benefícios de  uma sociedade governada pela meritocracia.

Duas falácias escondiam-se por detrás destes "trocadilhos" que ainda hoje campeiam no discurso dos socialistas.

O crescimento no quadro de uma desigualdade crescente e com o Estado subjugado ao Mercado apenas consegue alimentar essa desigualdade e torná-la mais tolerável. Ainda que medidas pontuais possam momentaneamente dar a sensação que estamos a combater a desigualdade o balanço entre o deve e o haver caracteriza-se, mostra-o a história dos últimos trinta anos,  pelo agravamento estrutural dessa desigualdade.

A meritocracia, no quadro de um ensino cada vez menos universal e cada vez menos gratuito, é uma fraude. Fraude ao serviço dos mais poderosos e que ajuda a perpetuar as condições de desigualdade. O sistema de propinas e os mecanismos de Bolonha tornam a formação um investimento que não está acessível a todos. Uma ou outra excepção são afinal a regra da mercantilização do acesso de que o sistema se alimenta.

A desigualdade social que aumentou brutalmente desde então, foi mitigada pelo recurso ao crédito. Alguma direita critica o crédito fácil identificando-o com uma cedência do Estado a uma pulsão consumista dos cidadãos. Sabe-se que esta análise é falsa e que com ela querem esconder que o crédito fácil foi o único recurso ao serviço do capital para  manter o consumo  em níveis  elevados. Sem um nível de consumo adequado o investimento capitalista não obtêm os lucros e as mais-valias que lhe permitem aumentar o stock de capital e continuar a reinvestir. Este sistema opera no quadro de uma economia que assenta na desigualdade e a promove.

A social-democracia passou a olhar os cidadãos como consumidores e promoveu a despolitização da cidadania. As próprias cidades passaram a ser entendidas como objectos consumíveis no quadro da especulação associada à financeirização do imobiliário. Os cidadãos foram segregados num complexo processo que actua politicamente afastando os trabalhadores da urbe, retirando-lhes a sua condição revolucionária de urbanos, atomizando-os no espaço, e promovendo uma geração brutal de mais-valias  com o consumo dos solos das periferias urbanas.
O processo politico burocratizou-se  e tornou-se um assunto das elites que, na maioria dos casos, viram o seu sucesso associado ao facto de representarem os interesses dos grandes grupos económicos e do sistema financeiro, mais do que por agirem em defesa dos cidadãos.

Os cidadãos foram afastados da politica facilitando a emergência de novos mecanismos de dominação e de opressão.  A social-democracia europeia ao mimetizar o neoliberalismo, pretendendo conferir-lhe uma dimensão social, pretendendo humanizá-lo, não fez, em muitos casos, mais do que o trabalho sujo da direita, criando as condições para que a governação se fizesse "for the Fews, not for the Many".

Mais recentemente um novo passo foi dado neste processo com os cidadãos já de si sacrificados por décadas de exploração a serem chamados a através dos seus impostos pagarem os erros cometidos pelos seus exploradores.

Corbyn rompeu com esse status. Fá-lo de uma maneira sem paralelo na história recente.

Não há memória de um partido socialista europeu ter rompido com a governação dominante no pós-fordismo. Nenhum partido socialista - muito menos com possibilidades de governar um país como o Reino Unido - se propôs governar com um programa como o proposto pelo Labour. Programa que assenta nalgumas ideias fortes.
Em primeiro lugar  renacionalizar sectores estratégicos da economia. Energia, Transportes, Bancos, Correios, entre outros.
Em segundo lugar assegurar o caráter gratuito e universal de vários serviços públicos como a Educação e a Saúde. Acabando com as propinas no ensino superior, garantindo o acesso gratuíto, impondo a gratuitidade dos livros e do material escolar no ensino básico e a alimentação às crianças necessitadas, que são muitas centenas de milhares.
Em terceiro lugar promovendo o maior programa publico de construção de habitação de que há memória nos últimos quarenta anos. Habitação para todos e sem que as pessoas tenham que ser deslocadas das suas comunidades. Controlo público dos solos e dos preços da habitação.
Em quarto lugar equilibrando em torno da riqueza produzida o capital e o trabalho. Aumentando significativamente o salário mínimo, reduzindo as formas de contratação violentas que remetem para novas formas de exploração dos trabalhadores, aliviando a carga fiscal sobre o trabalho, penalizando as empresas mais prósperas e as grandes fortunas.

Corbyn propõe-se devolver ao Estado o seu papel de agente económico em defesa do interesse comum, Devolve-lhe a função de estado produtor acabando com o paradigma do "Estado apenas regulador" que, como sabemos, nada regulou, nada regula, apenas actua tarde e a más horas para legitimar a desigualdade associada à fraqueza crescente da intervenção pública.

Não se trata por isso de um regresso ao passado, trata-se de um passo em frente na direcção do futuro. Um futuro que não quer voltar aos idos do pós-guerra, mas que não ignora os aspectos mais positivos da sociedade de então e muito menos os aspectos nefastos da sociedade actual.
Um futuro que é capaz de inovar, até na forma como mostra capacidade para fazer aquilo que nunca foi feito. Nunca no contexto da sociedade capitalista um programa politico que rompe com os fundamentos da sociedade neoliberal foi tão longe. Corbyn e o Labour são a inovação e a referência para o futuro.

Sem essa mudança na forma de encarar a actividade politica nada disto seria possível. A proposta do Labour é uma revolução feita por dentro do sistema politico, através dos mecanismos próprios da democracia. Rompe com o paradigma dominante nos partidos socialistas que se organizam coo partidos de eleitores e não de militantes.
Para promover uma tão grande revolução é necessário um forte apoio popular. Foi esse apoio que permitiu suportar a liderança de Corbyn e, mesmo num contexto muito agressivo, marcado pelo tempo curto e pelos atentados, construir uma candidatura com tão forte impacto,

Para isso foi fundamental recuperar  o desejo da politica, politizar o dia a dia dos cidadãos, tornar a vida de todos os dias o objecto central da politica, colocar os cidadãos no centro do processo politico. Isso obrigou a um novo estilo de liderança, partilhada, empenhada, comprometida, solidária, fraterna, entendível, humana.

O Labour com Corbyn aponta na direcção desse futuro  e mostra um forte empenho na construção desse espaço politico centrado na importância da cidadania e da justiça social.

Apesar da senhora May estrebuchar em torno dos destroços do seu patético "Stable and Strong" o futuro passa pelo Labour e por Corbyn.


PS  - Um dos derrotados das últimas eleições foi o Hard-Brexit. A senhora May e os conservadores não podem fazer aquilo a que se propunham.

08/06/17

CORBYN. O regresso da política ao serviço do bem comum.



Corbyn não ganhou as eleições mas obteve um resultado extraordinário. Retirou a maioria absoluta aos conservadores, aumentou o número de deputados e viu o Partido Nacionalista escocês perder parte dos seus deputados. 

Nenhum líder trabalhista fez tanto nos últimos anos e em particular numa situação tão dificil. O oportunismo de May e dos conservadores não funcionou.

Corbyn mostrou que é um homem para os tempos dificieis, um líder capaz de enfrentar a tarefa hérculea de tornar a sociedade britânica mais justa. Um homem que olha de frente para a desigualdade e que é capaz de a enfrentar propondo-se acabar com as situações que a alimentam. 

O Manifesto Eleitoral do Labour é um documento nuclear para discutir o futuro da esquerda e o futuro da democracia. Mas é sobretudo um documento nuclear para permitir à esquerda governar com base em politicas públicas justas, construídas para responder às necessidades das pessoas, de todas as pessoas e não apenas de alguns que exercem em seu benefício um poder tutelar sobre a classe politica. Veja-se o caso do sector da energia em Portugal e a forma como ele gere os sucessivos governos - este incluído - e os condiciona e limita em seu benefício. 

Corbyn sai destas eleições como o mais credível líder do Reino Unido para o futuro próximo e isso é um resultado politico extraordinário. Será certamente ele a governar o Reino Unido a muito curto prazo* Um governo do povo e para o povo, capaz de tornar o Reino Unido um país decente, outra vez.

Os cretinos que até ao dia de ontem tratavam Corbyn como semi-atrasado e uma velharia, são apenas isso, cretinos. Sem passado nem futuro, embora com muito poder.

* - Aposto num Governo do Labour apoiado no parlamento pelos restantes partidos com excepção dos Conservadores.

ACTUALIZADO com os resultados da manhã:   O Labour teve menos 2,46% dos votos do que os Conservadores. Estamos a falar de 792 mil votros num universo de 25 milhões, disputado taco a taco pelos dois partidos. O sistema eleitoral permite que estes 2,46% se traduzam num número muito significativo de deputados. Da mesma forma os nacionalistas escoceses, com apenas 3,04% dos votos, isto é menos de um milhão de votos, conquistam 35 deputados, já que o seu voto é fortemente concentrado na Escócia. A perda de votos do SNP é a segunda boa notícia para Corbyn. Com um SNP forte dificilmente o Labour poderá ganhar eleições. 

07/06/17

Uma candidatura de propostas. O que é a Politica de Habitação do Labour de Corbyn? (actualizado)

O que é paradoxal na candidatura de Corbyn é que ela foi construída com base num programa que é uma sólida e coerente proposta politica de governação.
Com base no mais radical e progressista Manifesto Eleitoral dos últimos quarenta anos o Labour propõe-se governar. Governar devolvendo esperança aos cidadãos. Governar para todos e não apenas para alguns. Georges Monbiot, que um mês atrás tivera a coragem de afirmar que o destino do Labour não estava traçado, salienta agora, dois dias antes das eleições, que a principal força de Corbyn radica no carácter das suas propostas, mais do que nas denúncias que faz ou na oposição à politica dos conservadores.


A politica de habitação é um desses campos e foi, desde que assumiu a liderança do Labour, uma das bandeiras de Jeremy Corbyn.
A crise da habitação no Reino Unido é um caso de estudo que, como acontece habitualmente, tem sido pouco estudado. Tratando-se de um país em que se lidera com o Mercado no altar das decisões politicas -  assistido devotamente pelo Estado na sua versão libertariana, reduzido ao mínimo dos mínimos - pensar-se-ia ter a mão invisível, que Adam Smith teorizou  nos primórdios da época vitoriana,  conduzido a questão da habitação à condição de um não problema.

Mas não foi assim. Com a liderança dos conservadores, depois de um período igualmente lamentável liderado pelos trabalhistas da terceira via, a questão da habitação tornou-se um dos principais problemas com que se deparam os britânicos.

Corbyn devolve ao Estado a resolução do problema que o Estado criou por omissão. Ao delegar no Mercado a resolução do problema da habitação o Estado traiu os cidadãos e negou-lhes, em centenas de milhares de casos, o direito á cidade. A deslocalização da habitação não é uma palavra vã no Reino Unido. O carácter segregado da oferta de habitação a custos controlados - a pouca que há - não é uma palavra vã no Reino Unido.
A negação do direito à cidade não é uma palavra vã.

A proposta politica para a habitação é um documento sério e um documento de uma enorme importância politica.
Em síntese o que propõe afinal o Labour?

Em primeiro lugar construir um milhão de novas casas no período de uma legislatura. Mas que casas?  Que  casas a que custos para que famílias?
Por ano serão construídas 100 mil novas casas a custos controlados para arrendamento social ou para famílias carenciadas.

Labour will establish a new Department for Housing to focus on tackling the crisis and to ensure housing is about homes for the many, not investment opportunities for the few. Labour’s new housing ministry will be tasked with improving the number, standards and affordability of homes. 

Dar aos municipios capacidade na promoção da oferta de habitação de que as comunidades necessitam. Trata-se de retirar todas as limitações que identificam a despesa com a habitação com o nível de endividamento dos munícipios. Uma restrição que também foi aplicada em Portugal, como se sabe. Articular o planeamento com a habitação - uma ideia verdadeiramente de esquerda que a esquerda portuguesa, por ignorância, tem dificuldade em perceber - garantindo oferta de habitação para todos de uma forma integrada e devolver ao Estado os serviços que tratam do registo de propriedade e das questões cadastrais.

Defender a posse pública do solo e defender a função dos municípios como proprietários de habitação social e como senhorios. Impor o principio da manutenção do stock público de habitação acabando com a tendência para os municípios alienarem a habitação pública. Colocar um ponto final na funesta politica do "right to buy"uma herança de Thatcher reescrita de forma ainda mais agressiva por Cameron.

More council homes have been sold off under the Conservatives and only one in five have been replaced, despite long housing waiting lists. Labour will suspend the right-to-buy policy to protect affordable homes for local people, with councils only able to resume sales if they can prove they have a plan to replace homes sold like-for-like.

Construir mais, mas construir melhor, com níveis mais elevados de construção e de isolamento e com uma relação entre as áreas úteis e o número de moradores mais adequada.  Construir com uma força de trabalho mais qualificada, com melhores salários na industria da construção.

Controlar o preço das rendas e das novas habitações e banir as agências que especulam com as rendas e que operam no sentido de as inflacionar. Abolir as decisões dos conservadores que acabaram com os benefícios no acesso à habitação atribuído aos  adquirintes mais jovens.

Alguém será capaz de encontrar um programa politico com esta amplitude e esta clareza de princípios e de objectivos? Se encontrar pode vir aqui divulgá-lo. Eu não conheço nada assim no passado recente.

PS- apesar dos atentados, apesar da campanha ignóbil dos Tories, que visa estabelecer uma correlação entre os autores dos atentados e Corbyn, apesar da imprensa hostil, aposto na vitória de Corbyn. Apesar do crescente impacto da candidatura do velho socialista nenhuma sondagem lhe atribui a vitória.
No entanto, há uma força que emerge da proposta politica dos trabalhistas e da liderança partilhada de Corbyn que está a mobilizar os cidadãos e por cujos resultados espero no dia 8 de Junho.

Afinal, limito-me a partilhar a esperança que conquista milhões de britânicos: esperança num mundo melhor e numa melhor democracia.

ACTUALIZADO.  O Daily Mail desce a um nível grotesco. O jornal dedica 13 páginas a associar Corbyn e os seus camaradas mais destacados nesta campanha aos terroristas. Terrorismo puro ou um exemplo práctico de como os tablóides ao serviço dos interesses financeiros dos seus proprietários são uma ameaça terrorista que todos os dias vitima a democracia.

Do outro lado vale a pena ler a posição tomada pelo Guardian de apoio ao voto no Labour. Apesar de o jornal não ter resistido a manifestar desde cedo a sua descrença na liderança e nas ideias de Corbyn foi justo ao tomar uma posição determinada pela análise dos factos.


05/06/17

A crise no Golfo Pérsico

A respeito da rutura da Arábia Saudita e dos outros emiratos do Golfo com o Qatar, dá-me a ideia que o Médio Oriente está dividido em três blocos:

- O bloco Irão-Síria, apoiado pela Rússia

- O bloco Arábia Saudita-Egito-Emiratos Árabes Unidos, apoiado pelos EUA (e provavelmente também por Israel, embora todas as partes provavelmente negarão qualquer ligação)

- O bloco Turquia-Qatar

A relação entre os 3 blocos é complicada (e até ontem à noite o segundo e o terceiro podiam ser vistos como sub-blocos de um bloco comum): na Síria e (até ontem) no Iemén o segundo e o terceiro estão do mesmo lado contra o primeiro, mas Líbia o que há é uma guerra entre os aliados do segundo e do terceiro (os aliados naturais do primeiro bloco seriam provavelmente os apoiantes de Kaddafy, mas parecem não terem importância).

Para quem cresceu nos anos 80, o primeiro bloco parece-me o herdeiro do que na altura se chamava os "radicais" (Argélia, Líbia, Síria, Iraque, Irão e Iémen do Sul) e o segundo dos "moderados" (Egito, Jordânia, Arábia Saudita e emiratos do Golfo); o terceiro é que é a novidade.

Já agora, interrogo-me se a rutura Arábia Saudita - Qatar não terá sido o resultado da visita de Trump, estilo "façam qualquer coisa para mostrar que estão contra o terrorismo"; as monarquias do Golfo têm todas as mão sujas, mas singularizar aquela que tem laços mais visíveis com a Irmandade Muçulmana (e, para bónus, um país fraquinho) talvez seja a maneira das outras darem a entender que elas são boazinhas.

Theresa May e a internet

Theresa May wants to ban crypto: here's what that would cost, and here's why it won't work anyway (Boing Boing):
This, then, is what Theresa May is proposing:

* All Britons' communications must be easy for criminals, voyeurs and foreign spies to intercept
* Any firms within reach of the UK government must be banned from producing secure software
* All major code repositories, such as Github and Sourceforge, must be blocked
* Search engines must not answer queries about web-pages that carry secure software
* Virtually all academic security work in the UK must cease -- security research must only take place in proprietary research environments where there is no onus to publish one's findings, such as industry R&D and the security services
* All packets in and out of the country, and within the country, must be subject to Chinese-style deep-packet inspection and any packets that appear to originate from secure software must be dropped
* Existing walled gardens (like Ios and games consoles) must be ordered to ban their users from installing secure software
* Anyone visiting the country from abroad must have their smartphones held at the border until they leave
* Proprietary operating system vendors (Microsoft and Apple) must be ordered to redesign their operating systems as walled gardens that only allow users to run software from an app store, which will not sell or give secure software to Britons
* Free/open source operating systems -- that power the energy, banking, ecommerce, and infrastructure sectors -- must be banned outright

Theresa May will say that she doesn't want to do any of this. She'll say that she can implement weaker versions of it -- say, only blocking some "notorious" sites that carry secure software. But anything less than the programme above will have no material effect on the ability of criminals to carry on perfectly secret conversations that "we cannot read". If any commodity PC or jailbroken phone can run any of the world's most popular communications applications, then "bad guys" will just use them. Jailbreaking an OS isn't hard. Downloading an app isn't hard. Stopping people from running code they want to run is -- and what's more, it puts the whole nation -- individuals and industry -- in terrible jeopardy.

04/06/17

O ataque em Londres. Serão os resultados alterados?

Não há forma de evitar a relação entre estes ataques consecutivos e a emergência da candidatura do Labour cada vez mais próxima de vencer as eleições.
Trata-se de uma tentativa de condicionar os resultados eleitorais e de condicionar o funcionamento da própria democracia. Trata-se de uma tentativa de colocar o medo no centro da politica. Trata-se de uma tentativa de agredir o líder trabalhista, identificando-o, como tem feito May desde o primeiro atentado, com os atentados.
A resposta de Theresa May alimenta e justifica estas preocupações. Uma resposta sem sentido, uma resposta errada, como salientou o Guardian numa posição sobre o assunto.
Talvez por isso a resposta de Corbyn tenha sido tão rápida e eficaz. Recordando que as politicas austeritárias que May promoveu quando esteve no Governo e desempenhou funções na Administração das forças policiais se traduziram em cortes e no despedimento de 20 mil agentes.
Há uma tentativa dos conservadores de adiar as eleições e de instalar uma espécie de estado de sitio.
Pelos vistos com uma mãoznha do alucinado do outro lado do Atlântico.

02/06/17

O apoio de Bernie Sanders a Jeremy Corbyn.

Bernie Sanders apoia Corbyn embora diga  que o líder trabalhista não precisa dele. O que me parece mais importante é salientar dois políticos que elegeram o combate à desigualdade chocante e a construção de uma sociedade mais justa, uma sociedade para todos e não apenas para alguns, como o objectivo central da politica.
Dois veteranos das causas supostamente perdidas, das lutas que não garantem carreiras brilhantes e poder pessoal em doses superlativas, dos que primaram sempre por colocar-se do lado dos mais necessitados. Dois políticos ostracizados pelos média e arrumados no lado sombrio dos velhos e dos sem préstimo.
Dois homens que estão a revolucionar o socialismo democrático e a revitalizar a social-democracia libertando-a das teias de aranha que a tornaram numa triste cópia do reaccionário neoliberalismo.

Uma vitória de Corbyn e um governo trabalhista no Reino Unido, capaz de aplicar o seu Manifesto, ajudará a reconstruir a esperança no futuro, por toda a Europa e pelo Mundo. Talvez Sanders ainda tenha uma palavra a dizer no futuro dos US pós-Trump. As suas ideias garantidamente irão desempenhar um papel nesse futuro.

01/06/17

"Já não se pode dizer nada!"

O que a patrulha do anti-politicamente correto (os tais que estão sempre a reclamar que "já não se pode dizer nada que fica logo tudo ofendido!") achará disto?