31/05/16

Uma boa iniciativa. Uma má decisão.

Não conheço a proposta do BE relativa à introdução de algumas limitações ao alojamento temporário, no entanto aplaudo a iniciativa dos bloquistas. Estão mais do que identificados os problemas que esta forma de alojamento, potenciado pelas plataformas online, provoca nas cidades (aqui e aqui). Discutir esses problemas e propor soluções é vital para impedir a progressiva gentrificação de partes importantes da cidade e a cada vez mais acentuada segregação espacial de lisboetas ou portugueses de rendimento médio ou baixo.  O que faz muito pouco sentido é o tipo de argumentação do vereador socialista da autarquia, Duarte Cordeiro. O alojamento local pode ser um factor de reabilitação urbana, mas Duarte Cordeiro saberá que a reabilitação urbana não é boa por si só. Afinal reabilitamos para quem, a que custos e para que usos? Esta é uma questão prévia e admitindo que, por distracção, ninguém a colocou, estamos sempre a tempo de corrigir o erro. Reabilitamos à custa de expulsarmos ainda mais lisboetas para as periferias, à custa de "libertarmos bairros inteiros" dos seus moradores, à  custa de impormos a oferta de alojamento turístico sacrificando o alojamento permanente?  Onde é que entra o alojamento acessível neste processo? Será que a actual dinâmica é defensável, ainda que por detrás da decisão  de nada fazer, possam estar manifestações de "economia partilhada", como lhes chama o vereador?

Adenda: São cada vez mais as cidades que se vêm obrigadas a tomar medidas de controlo dos efeitos da massificação do turismo. Agora foi a vez de Reiquiavique reagir à subida dos preços das casas no centro da cidade.

28/05/16

Contratos de Associação. Manipulações.

A posição corajosa do ME de romper com a práctica do bloco central, que ao longo de anos fomentou os negócios privados da educação com financiamento público em locais em que existia oferta pública, tem despoletado uma oposição feroz das entidades envolvidas,  que se consideram espoliadas nos seus direitos. As associações representativas do sector não olham a meios para atingir os seus fins. O Presidente da República viu-se envolvido na questão, por força de um comunicado emitido pelo Movimento em Defesa da Escola Ponto. Foi obrigado a vir a terreiro demarcar-se do que afirmaram os empenhados defensores dos privados abrangidos por contratos de associação. Um momento embaraçoso mas revelador dos métodos a que estavam dispostos a recorrer. Contra atacou o Governo com o parecer  emitido pela PGR. Parecer que foi solicitado pelo Governo e que, note-se, incide sobre os termos desta polémica concreta. O parecer, divulgado na sexta-feira, dá razão ao Governo, segundo o que foi divulgado. Entretanto, hoje de manhã, o Público fazia manchete de uma posição do Tribunal de Contas(TC) "que dá razão aos colégios na guerra contra ministério" Afinal o TC veio durante a tarde  demarcar-se desta interpretação, esclarecendo que não tinha emitido qualquer parecer sobre a polémica concreta entre Governo e Associações de ensino privado.(aqui e aqui) Parece que a manchete do Público pecou por excessiva, face ao que os acontecimentos vieram mostrar. O bom senso impõe que haja alguma cautela porque se corre o risco - como aconteceu com o Presidente da República - de se ser manipulado nesta guerra sem quartel que os privados travam contra este Governo.
Nas pequenas coisas boas que este Governo, apoiado pelas esquerdas, nos vai possibilitando, destaca-se o desempenho do Ministério da Educação,  em particular nesta questão concreta. Romper com estes "direitos adquiridos" a usufruir do financiamento público para alimentar negócios privados, que concorrem - e não aqueles que são supletivos da intervenção pública - com a oferta pública, não é fácil. Os nossos liberais são, na sua maioria, avessos ao risco e fervorosos adeptos do estado providência. Quando são eles e as suas empresas os beneficiados.

26/05/16

Os tijolos de ouro.

O novo presidente de Londres, o trabalhista Sadiq Khan, denunciou na sua primeira intervenção na Assembleia de Londres o rumo que a politica de habitação,  sob o domínio dos conservadores, seguiu ao longo das últimas décadas. O estado e a cidade demitiram-se de intervir no sector da habitação, deixando ao mercado a liderança do processo. O mercado são as oligarquias  russas, asiáticas e africanas, que utilizam a habitação para lavar dinheiro e tornar respeitável aquilo que resultou de esquemas corruptos. Talvez por isso o investimento de várias oligarquias foi canalizado para a habitação de luxo, sendo que, muitas vezes esses empreendimentos estão em grande parte vazios.
Sadiq Khan denunciou o facto de a habitação se ter tornado numa espécie de gold bricks for investment  e de a maioria dos empreendimentos, entretanto construídos, estarem vazios ou serem utilizados como segunda habitação. O reverso desta situação é a ausência de oferta daquilo que os anglo-saxónicos chamam a affordable housing. Sadiq revelou que  just 13% of the homes given planning consent in London last year were affordable . O significado práctico desta situação é a falta de habitação na cidade para a generalidade da população.
Esta intervenção do novo mayor de Londres poderia servir de exemplo para muita e boa gente.(estava a pensar no actual presidente da Câmara Municipal de Lisboa, por exemplo) Há sempre uma escolha a fazer: deixar ao mercado a condução da política ou actuar de modo a que os objectivos dessa politica sejam atingidos, ainda que o mercado não concorde com esses objectivos.

25/05/16

Justiça Animal

Acabo de ler a seguinte peça que, parafraseando o que Ricœur dizia do mito, dá deveras que pensar:

Justicia Animal ha denunciado hoy miércoles al Teatro Real por usar un toro enorme en Moisés y Aarón, la ópera de Schönberg que se estrenó en la noche del martes en el recinto madrileño. La asociación animalista cree que el teatro está vulnerando la Ley de Protección Animal de la Comunidad de Madrid por utilizar un toro en la representación.

Está versión de Moisés y Aaron está dirigida por Romeo Castelluci y el martes fue la primera vez que la obra inconclusa del compositor austriaco se representó en el Real. En ella aparece el toro Easy Rider, un charolés de 1.500 kilos al que, según Justicia Animal, se le somete a maltrato.. Según esta asociación, el Real estaría vulnerando el artículo 4 de la Ley 1/90 de Protección Animal de la Comunidad de Madrid, que prohíbe la utilización de animales "en espectáculos, peleas, fiestas populares y otras actividades que impliquen crueldad o mal trato, puedan ocasionarles sufrimientos o hacerles objeto de tratamientos antinaturales".

La asociación afirma que en la obra el toro tiene dos apariciones "de aproximadamente 20 minutos" y que en la primera está "inmóvil (...) en una urna de plexiglás transparente": "No hace falta ser muy listo para comprender que un toro de 1.500 kilos no pinta nada en un escenario", sostienen. "Es claramente una situación antinatural y sin lugar a duda muy sospechoso que quede quieto sin moverse, pudiendo estar el animal sedado o drogado, por lo que hemos solicitado que se le haga una analítica para comprobar si da positivo a algún tipo de droga", dicen.

Fuentes del Real han asegurado que es "radicalmente falso" que se drogue al animal y han recordado que es un toro manso, no de lidia, y que, por su pedigrí, está "muy habituado a ser exhibido en ferias". Sus movimientos son muy lentos, y no ha sido "amaestrado" para esta función sino que sus dos cuidadores han introducido en su rutina "llevarle desde la cuadra que está dispuesta al lado del Real —en el Palacio Real— a otra en la que hay música".

Exibir um touro em cena na ópera viola a “justiça animal”, que a associação do mesmo nome reclama, porque é “claramente anti-natural”. Estamos esclarecidos. Mas, sendo assim, os animalistas poderiam ir mais longe. Porque, se fossem consequentes, seria a própria ópera que declarariam anti-natural. E, com um pequeno esforço mais, tomariam por alvo, nos mesmos termos do mesmo irracionalismo galopante, a própria instituição da linguagem. Calar-se-iam, então, pelo menos? Hélas, o mais provável é que, honrando a sua natureza enfim liberta, urrassem, esmurrassem, mordessem e irrompessem ao coice em redor. Ponto final.



Mais uma derrota da ideia de Europa

O Eurogrupo aprovou o pagamento da segunda tranche do empréstimo concedido à Grécia em Agosto de 2015. São 10,3 mil milhões de euros que, em grande parte, assegurarão a possibilidade de efectuar a amortização das dívidas aos credores internacionais. Esta decisão foi precedida da cedência do FMI relativamente à exigência que tinha colocado sobre a mesa: apenas admitia participar no financiamento desde que fosse previamente discutido o alívio da dívida grega -que o FMI considera insustentável - e daí se tirassem imediatas conclusões. Quem se opôs a esta proposta não foi o Eurogrupo, foi a Alemanha. A Alemanha exerceu um poder de veto, que na realidade detêm. Como se escreve no The Guardian " But the debt relief plan was a far cry from the “upfront” and “unconditional” debt relief the IMF had demanded on Monday, when it warned that Greece would face an ever-growing bill to service its loans. Poul Thomsen, director of the IMF’s European programme, said the IMF had made “a major concession”. “We had argued that [debt relief measures] should be approved up front and [now] we have agreed that they should be made at the end of the programme period.”
The fund had been locked in a stand-off with Germany, which was adamant that debt relief could not be considered before the end of Greece’s current €86bn bailout programme in mid-2018."
Aqui radica a essência do conflito, os interesses soberanos da Alemanha, conflituam com os interesses dos restantes países e da generalidade dos cidadãos europeus. Na politica da UE todas as discussões e todos os pontos de vista são admissíveis mas no fim cumpre-se a vontade da Alemanha. 
Na notícia do Expresso, coloca-se no centro da questão uma eventual divergência entre o Eurogrupo e o FMI. Não se trata disso. O Eurogrupo, através do fiel vassalo Dijsselbloem, apenas existe como uma expressão do interesse alemão. Dijsselbloem garante que todos pensam e agem a uma só voz: a do interesse alemão. Voluntariamente ou à força.
No caso grego Wolfgang Schäuble verá com um incontido prazer o Syriza a aplicar medidas de austeridade cada vez mais brutais, e a mobilizar contra si camadas cada vez mais amplas da população. O Syriza paga com língua de palmo as ousadias anti-austeritárias dos dias, longínquos,  da conquista do poder. Que sejam os socialistas europeus, liderados pelos pró-austeritários Hollande e Dijsselbloem, a ajudar na concretização da obra, é apenas a cereja no topo  do bolo.

PS - a fotografia do Expresso vale mais do que mil palavras. Centeno e o ministro Grego com uma cara de enterro,  e uma expressão de impotência,  e Schäuble com um sorriso indisfarçadamente sádico.

23/05/16

Protecção da casa de família. Entra amanhã em vigor.

Foi hoje publicada no Diário da República a lei nº13/2016 que protege a  casa de família no caso de processos de execução determinados pela Autoridade Tributária.
Já tínhamos falado desta lei, aqui. Falta agora reunir as vontades políticas, e o conhecimento técnico, para corrigir os aspectos, igualmente socialmente injustos, da relação dos cidadãos com os bancos em caso de incumprimento. E aí não basta apenas estender esta proibição de venda da casa de família - os bancos não devem poder vender a casa de família em caso de incumprimento -  é necessário dar outros passos.


22/05/16

Os poderes do presidente da Aústria (II)

Austria’s presidency, por Matthew Shuggart:
The BBC item (...) says that Austria’s presidency “is a largely ceremonial post”. An earlier version followed up that statement by noting that the president can dismiss the government, and that Hofer has promised to do so if elected. One might question whether a president who can, on his or her political initiative, dismiss a government that has the confidence of parties controlling a majority of parliamentary seats, is “ceremonial” (...)

The Austrian presidency actually has quite significant constitutional powers. In fact, it would be a “president parliamentary” system, according to formal powers. This is the hybrid in which the popularly elected president does indeed have powers to dismiss a government. Presidents have not actually deployed these powers in the past, owing to the “establishment” consensus that the system should operate in a fundamentally parliamentary manner. However, a president from outside this consensus could certainly be expected to attempt to deploy the powers.

And, oh by the way, among the powers of initiative that the Austrian presidency has is the right to dissolve parliament. So that election “scheduled for 2018” may be coming a bit sooner.
E um comentário ao post:
Austria has operated de facto as a parliamentary system since 1945. The informal deal that brought this about and kept it that way was, it seems to me, only made possible through enforcement by the two main parties (and their presidential candidates). With someone not from one of those parties in the president’s office, that deal falls apart. Even if van der Bellen is elected, I think the next few years will come to remind everyone that Austria is actually semi-presidential.

Os poderes do presidente da Áustria

A respeito de uma eventual vitória da extrema-direita nas presidenciais austríacas de hoje, tem-se comentado que a presidência austríaca é "largamente cerimonial"; será verdade?

Na realidade, pela letra da constituição austríaca, o presidente é capaz de ter mais (ou, no mínimo, tantos) poderes que o português (talvez comparáveis ao francês); ao que parece, em 1929, por influência de um catolicismo autoritário (que daria origem, nos anos 30, ao chamado "austrofascismo", e, após a II Guerra Mundial,  ao Partido Popular Austríaco, o partido tradicional do centro-direita), os poderes presidenciais foram radicalmente aumentados; após a II Guerra Mundial, a constituição austríaca foi essencialmente restaurada nessa versão, mas passou a ser considerado "má educação" o presidente utilizar os poderes que tem legalmente (penso que desde 1945 nenhum presidente dissolveu o parlamento nem demitiu, mas legalmente poderiam fazê-lo, e creio que nem há a condição de "crise das instituições", como em Portugal).

19/05/16

Uma notícia que passou despercebida sobre as Honduras

Lembram.se do golpe hondurenho de 2009 (e esse sem dúvida um golpe; não é como o caso brasileiro em que a letra da constituição foi cumprida, mesmo que provavelmente não o seu espírito)? O argumento dos golpistas é que o presidente Zelaya pretendia alterar a constituição para ser reeleito, e que até propor essa alteração era inconstitucional.

Na verdade, esse argumento nunca teve grandes pernas para andar - o que Zelaya pretendia era que, no dia das presidenciais, se fizesse um referendo sobre a eleição de uma assembleia constituinte. Portanto, mesmo que isso fizesse parte (como a oposição alegava) de um plano secreto para permitir a reeleição presidencial, a assembleia constituinte seria eleita já depois das presidenciais, a a hipotética nova constituição seria aprovada já a meio do mandato presidencial seguinte - ou seja, mesmo que fosse permitida a reeleição, não iria servir para Zelaya se eternizar no poder (quando muito iria servir para o próximo presidente).

Mas o que é curioso (e pelos vistos quase ninguém ligou a isso) é que afinal o tal artigo "inalterável" da Constituição hondurenha já foi revogado, e nem precisou de referendo nem assembleia constituinte nem nada - o supremo tribunal simplesmente decidiu que o artigo da constituição que proibia a reeleição era inconstitucional, ou coisa parecida (pelos vistos, todos os juízes que tomaram a decisão foram escolhidos pelo atual presidente - cujo partido, o conservador Partido Nacional, já anunciou que o pretende recandidatar).

[Via AntiWar.com]

18/05/16

Repensando "Música no Coração"


A castanho, a votação nas eleições legislativas alemãs do Partido da Direita Alemã (1949), do Partido do Reich Alemão (de 1953 até 1961), do Partido Nacional Democrático da Alemanha (desde 1965) e da União do Povo Alemão (em 1998); a azul, a votação nas eleições legislativas austríacas da Federação dos Independentes (até 1953) e do Partido da Liberdade da Áustria (desde 1956).

17/05/16

Irlanda - crescimento artificial graças à Pfizer?

Em parte (o crescimento irlandês parece que é mesmo o maior da Europa, mas será menor do que as estatísticas milagrosas de 7% ou 8%).

Doing the maths: how real is Ireland's economic growth? (Independent)
The ESRI estimates that the Irish economy grew by 6.7pc in 2015 and is forecasting GDP growth of 4.8pc for this year. GNP, which is generally regarded as a better measurement of the underlying performance of the Irish economy, is also growing strongly, with the ESRI reckoning that it grew by 5.2pc last year and that it will grow by a further 5.3pc this year.

But how real is this economic growth? (...)

Measuring the true level of Irish economic activity has always been a tricky topic for economists. The generally accepted international standard is gross domestic product (GDP). The problem with GDP for Ireland is that it includes the undistributed profits of foreign-owned multinationals. This has the effect of artificially boosting the value of Irish economic output, since those profits belong not to Irish residents, but to the multinationals' overseas shareholders.

It is for this reason that gross national product (GNP), which excludes undistributed multinational profits, is the usually preferred measure of Irish economic output. (...)
Unfortunately, just when it seemed as if it was safe to trust the GNP figures once more, a new cloud has appeared on the horizon.

While re-registration may have had its day, a new but closely related phenomenon has since emerged to take its place: tax inversion.

Tax inversion takes place when a much larger, usually American, company agrees to be taken over by an Irish-registered company.

Under existing international tax law, this allows the enlarged company to be classified as 'Irish' and to qualify for our 12.5pc corporate profits tax rate - rather than Uncle Sam's punitive 35pc rate.

Since 2012, at least 21 major US corporations with a combined value of well over a third of a trillion dollars have gone through the tax inversion process. Many of these tax inversions have involved Irish-registered companies including Medtronic's takeover of Covidien, Perrigo's acquisition of Elan and Actavis' takeover of Allergan. 
However, it is the latest tax inversion-driven deal that has focused attention on the emerging problem. In November 2015, Pfizer, the world's largest pharmaceutical company, announced that it had agreed a $160bn 'merger' with Allergan, which, following the previous Actavis transaction, is an Irish-registered company.

This means that the combined Pfizer/Allergan will be tax-resident in Ireland - and presumably that the $21bn of undistributed profits that Pfizer has on its balance sheet would be added to the Irish GNP figure. (...)

Professor FitzGerald doesn't specifically address the tax inversion issue in his June 2015 paper, but he does identify another potential problem, aircraft leasing, with up to 20pc of the world's civil aviation fleet either owned or managed by Irish-based leasing companies.

So how on Earth is one supposed to make sense of official Irish economic statistics?
In fairness to the CSO, it is not unaware of the problem. It set up a Large Cases Unit in 2009 to liaise with the largest Irish-based companies in an effort to identify potential distortions.

However, even with the best will in the world, the CSO is constrained, as it is obliged to produce its data in accordance with international standards - standards that aren't always appropriate to Irish conditions.

"GDP and GNP are very imperfect measures of how the economy is actually doing. The focus should be on domestic demand; investment, consumption and government spending," says Goodbody Stockbrokers economist Dermot O'Leary.

Using these indicators, Mr O'Leary reckons the Irish economy grew by 4.5pc in 2015 and that it will grow by a further 4pc in 2016.

"We are living in a 4pc-plus economy, rather than in a 7pc economy. If you compare that with the rest of Europe, we still have the best-performing economy," he says. (...) 
With GDP and now GNP having been apparently skewed by factors such as non-repatriated profits, companies re-registering and now tax inversions, readers of Irish economic statistics would be well advised to proceed with caution.
Também sobre isto - Pfizer as Irish firm would swamp Ireland's national accounts (1 de novembro de 2015)

14/05/16

Quando Marcelo ultrapassa a coligação pela Esquerda.

O Presidente da República promulgou a lei que protege a casa de família no caso de processos de execução fiscal. Esta lei constitui uma das iniciativas mais importantes deste Governo apoiado pelas esquerdas. A forma cruel como a Administração Fiscal, a pretexto de processos de execução fiscal muitas vezes de valores baixos, procedia à penhora e posterior alienação das habitações próprias dos portugueses, aproximava-se quase sempre da extrema crueldade. Se quisermos ser rigorosos podemos dizer que despejar uma família, por dívidas fiscais, retirar-lhe a casa e aliená-la apenas para obter o valor em dívida, é uma intervenção claramente desproporcionada. Um chocante abuso de poder.
Fez muito bem o  Presidente da República em ter aprovado esta lei. Fez ainda melhor por ter chamado a atenção para a sua incompreensível insuficiência. Como ele referiu no seu despacho, não há razão nenhuma para a lei não ter abrangido todas as situações em que a casa de família possa ser retirada à família e posteriormente vendida. Uma critica pela esquerda a uma actuação práctica insuficiente, do Governo das esquerdas.  Isso acontece com as dívidas aos bancos e com o posterior despejo das famílias e venda do imóvel pelo valor da dívida existente. Um procedimento legal mas de uma violência chocante. Esta situação não foi alterada com esta lei aprovada pelo Governo. Marcelo achou mal e referiu-o. Não há nenhuma razão para a lei não ser mais abrangente. Não há nenhuma razão para a nova lei não ser alterada e corrigida.
Mas mesmo que a lei o fosse outros aspectos ficariam, provavelmente, por resolver. Como se sabe as famílias pagam IMI sobre as casas que não são suas. Casas que  estão hipotecadas como garante dos valores obtidos como empréstimo para permitir a aquisição dos imóveis. Quando são despejados perdem a casa e todas as verbas pagas a título de amortização e de juros, bem como o imposto sobre o património. Património que afinal não é seu, é do banco. O banco vai vender o imóvel pelo valor não amortizado do capital que emprestou o que permite a algumas entidades, ou particulares, detentores de liquidez fazerem um verdadeiro negócio da China. Infelizmente a lei não obriga os bancos a venderem as casas pelo seu valor patrimonial - aqui entendido como o valor de aquisição ou do capital contratado antes de juros - e a devolverem às famílias o valor já amortizado. Pelo capital emprestado o banco, durante o período em que a família conseguiu fazer face aos seus compromissos, recebeu os juros contratuais. O capital amortizado já foi recebido  e com a venda o banco não perde nada recuperando a totalidade do que emprestou. A Lei limitar-se-ia a assegurar que a família em dificuldades não se constituía como financiador do novo proprietário e da avidez com que o banco pretende livrar-se desse património.
Mas o ideal é mesmo impedir o despejo e a alienação do imóvel sobretudo quando situações de desemprego e de perda de rendimento por razões que não são da responsabilidade da família estão na origem do incumprimento. Há evidência histórica de que os portugueses apenas em último caso deixam de pagar as rendas dos empréstimos. Quando chegam a esse ponto já percorreram um longo caminho de sofrimento.
Para alterar a lei é necessário que a coligação se entenda e diz-se a bola estará no campo do PS. Compreende-se mal que esta questão não tivesse sido incluída nos compromissos pré-governamentais. A menos que a coligação tenha pensado que era a administração fiscal a principal origem da perda de casa de família. Mas não é.

13/05/16

Já que tanto se fala em "liberdade de educação"...

Sociedade sem Escolas [pdf], de Ivan Ilich:
Devo meu interesse pela educação como uma função pública a Everett Reimer. Antes de nosso primeiro encontro em Porto Rico, em 1958, nunca havia questionado o valor de estender a obrigatoriedade escolar a todo o povo. Juntos, chegamos à conclusão de que a maioria dos homens tem seu direito de aprender cortado pela obrigação de freqüentar a escola.

10/05/16

Ainda as eleições no Reino Unido. O caso de Bristol.

Não tem merecido quase nenhuma atenção na nossa imprensa a eleição de Marvin Rees, como mayor de Bristol. Mas merece toda a atenção, já que simboliza a eleição de um jovem politico negro que nasceu e  cresceu na cidade, filho de uma mãe solteira e pertença dos grupos sociais mais desfavorecidos. Ele que foi vitima, na sua infância e adolescência, do facto de pertencer a uma minoria numa das cidades então das mais racistas do Reino Unido. Talvez por isso as suas primeiras declarações tenham servido para agradecer ao lutador dos direitos civis, Paul Stephensen -com quem aliás passou a noite após ter sido eleito -  que organizou, em 1960, o boicote aos transportes públicos o que obrigou à suspensão da proibição de pessoas das minorias étnicas trabalharem nos seus serviços.

07/05/16

Se se afogar é inocente se flutuar é culpado.

O título deste post faz referência à forma como no século XVII as mulheres acusadas de bruxaria eram avaliadas. Atiradas ao rio duas possibilidades lhes restavam: se flutuassem eram obviamente culpadas e seriam queimadas; caso se afogassem, não restariam duvidas da sua inocência. No entanto, a morte era o seu destino inevitável. Esta história foi recordada por Gary Young, no "The Guardian" de hoje, a propósito da posição adoptada pela imprensa  britânica relativamente a Jeremy Corbyn, o líder do Labour. Sob o título "Ignorem os profetas da desgraça. Corbyn mostrou que é um líder viável",  Young analisa a evolução do Labour sob a liderança de Corbyn e compara o posicionamento da imprensa com parte dos seus opositores internos. Desmonta a tese de que uma liderança tão obsessivamente identificado com posições radicais seria insusceptível de conquistar a classe média, essa condição tão hipervalorizada de sucesso eleitoral e de conquista do Governo do país. Dá como exemplo os resultados obtidos em cidades identificadas com elevados níveis de vida (bellwether towns),como Southampton ou Harlow. Vale a pena ler.
Por cá, falando de imprensa, o panorama é o mesmo. Hoje no Público, dá-se um grande destaque às eleições em Inglaterra. Valorizando o resultado na Escócia, que identifica com um cartão vermelho mostrado a Corbyn é na notícia sobre a vitória do Labour em Londres - edição em papel -  que o carácter anti-Corbyn se destaca. A jornalista salienta que "Sadiq Khan não está disposto a partilhar a vitória com o líder trabalhista Jeremy Corbyn". Lendo e relendo a notícia não se percebe onde é que foi encontrado o fundamento para esta conclusão. Declarações de Sadiq? Declarações de alguém que integra a sua candidatura? Nada disso. Apenas declarações que foram retiradas da imprensa ao longo das últimas semanas. Quer de criticos de Corbyn - os que anunciavam a implosão do Labour nestas eleições -  quer dos que, prevendo a vitória em Londres, começaram imediatamente a construir o cenário do julgamento da bruxa, não fosse o caso de ela flutuar. Mas se ignorarmos o destque dado na notícia junto à foto de Sadiq e lermos apenas o texto o que encontramos? Escreve a jornalista "Khan conseguiu que o Labour retirasse a cidade aos tories, mas não estará disposto a partilhar a vitória com Jeremy Corbyn, o líder do Partido Trabalhista." Neste caso o tempo verbal era ainda marcado pelo condicional. No destaque essa condição desaparece e recorre-se à afirmação. Afinal a bruxa flutua.

06/05/16

Labour conquista câmara de Londres. Ainda não é desta que se livram de Jeremy Corbyn.

O Labour e o seu líder Jeremy Corbyn, afinal, não foram na enxurrada que muitos vaticinavam, num exercício jornalístico muito próximo do Wishful thinking e, naturalmente, a léguas do jornalismo independente e rigoroso que devia ser. Quem leu os jornais nos dias que antecederam as eleições encontrou infinitas análises que vaticinavam o pior resultado possível para o Labour e um fim próximo - e por eles desejado - para a liderança de Corbyn. Pouco ou nenhum eco foi dado à campanha infame que Cameron e o seu candidato à Câmara de Londres encetaram contra o candidato do Labour. Num grotesco exercício de racismo tentaram identificar o candidato com os terroristas tendo como base a sua origem étnica. Aproveitando declarações lamentáveis de um velho dirigente do Labour, tentaram capturar o voto judeu, identificando Corbyn com alguém com simpatias pelo anti-semitismo dos nacional-socialistas. Uma vergonha.
Não resultou. Sadiq Khan foi eleito mayor de Londres, pondo termo a um longo período de domínio dos conservadores, então sob a batuta de Boris Johnson. A candidatura do Labour colocou o acento tónico na resolução da crise da habitação que a cidade enfrenta, com a completa ausência de oferta de habitação para todos aqueles que não pertençam ao grupo do muitissímos ricos. Londres é uma cidade que personifica a quinta essência de uma economia construída numa lógica que faz da desigualdade extrema o seu projecto político. Corbyn não o esqueceu na hora de salientar os resultados.
Mas em geral o Labour foi o partido que mais autarcas elegeu, que mais autarquias lidera e, com a excepção da Escócia - com os nacionalistas/independentistas imbatíveis nos dias que passam - teve resultados que fortalecem a sua liderança.
talvez por isso a Escócia se tenha tornado a questão central destas eleições, do ponto de vista da inprensa. O facto de o Labour se ter tornado o terceiro partido em número de eleitos é a grande questão. Mas, não é. O Labour enfrenta uma força poderosa, o SNP, e a perda de influência do Labour escocês é um processo que vem da anterior liderança, que na realidade já vem do tempo de Blair.
Cameron, deve estar por esta altura a pensar que afinal Corbyn é mesmo um osso duro de roer e  deve ter saudades dos tempos em que os dirigentes do Labour pareciam ter como único objectivo fazer o mesmo que ele, mas com uma muito superior consciência social. Esses não são os novos tempos que o "velho" Corbyn representa.

A respeito da polémica sobre as escolas com contrato de associação

Relembro o meu post de 2011, Sobre as escolas públicas e privadas (nomeadamente a parte em que falo do custo marginal).

03/05/16

O Estado e o Mercado. Alemanha toma medidas contra a Airbnb

Afinal quem manda aqui? O Estado ou o Mercado? Os alemães viram-se confrontados com o aumento do preço do arrendamento nas suas cidades. Um aumento de 56% num curto espaço de tempo - de 2009 a 2014 - que fez subir o preço por m2 para uns intoleráveis 10 €. Intoleráveis para eles que ganham em média 4 vezes mais do que nós . Recorde-se, a talhe de foice, que isso não seria nada que nos assustasse já que na "Lisboa para todos" o preço médio do arrendamento ultrapassou recentemente os 12€/m2 e não pára de subir.
Esta subida, no caso alemão, está associada à presença  e operação da plataforma online americana de aluguer de alojamento de curto prazo, a Aibnb. A sua presença no mercado alemão determinou uma mudança na estrutura da oferta de habitação para arrendar. Com os preços a aumentarem constantemente, os proprietários optam por retirar as suas propriedades do mercado tradicional de arrendamento de média e longa duração, tornando esta oferta cada vez mais escassa e cada vez menos "affordable".
Além disso, com obras que alteram a configuração do espaço interior, os proprietários
maximizam o número de fracções que podem arrendar.  No alojamento de curta duração a área utilizada não é relevante. Uma evolução neste sentido, associada à crescente alteração na estrutura da propriedade, induzida pelas taxas de juro anormalmente baixas, pode deitar por terra num ápice o modelo de "Soziale Stadt" que os alemães tanto valorizam. Por isso as dúvidas seriam  poucas e a acção não tardou. A Alemanha acaba de legislar no sentido de impedir a operação da Airbnb no seu território. Aposto que o impedimento vai ser efectivo. Vejam-se as multas demolidoras. Ler aqui embora aqui exista uma versão nacional da noticia, pobrezita. Por cá a Airbnb não corre estes riscos. Vai continuar a operar à grande e à portuguesa.

01/05/16

Cenas da luta de classes na Arábia Saudita

Saudi Arabia: Workers set fire to buses after '50,000 sacked and salaries not paid':
Workers at a major Saudi construction firm have set fire to nine company buses in protest over thousands of sackings and their salaries not being paid.

Employees at Binladin Group have staged several demonstrations within Saudi Arabia’s Mecca region in recent weeks, with some claiming they have not received their wages for six months.

The attack on the company buses came after Saudi Al-Watan newspaper reported the company had laid off 50,000 foreign employees and issued them exit visas.(...)

 Reports say the company, set up by the father of al-Qaeda leader Osama Bin laden, is in $30 billion worth of debt due to falling oil prices.