Como "declaração de voto" do post que aqui acabo de publicar, apelando à participação na manifestação anunciada em apoio da Wikileaks, gostaria de deixar um outro, exprimindo a posição que sei ser a de muitos que apoiam esta iniciativa e se contam entre os que pensam que está em jogo, em todo este caso, a necessidade de responder a uma ofensiva antidemocrática dos aparelhos das oligarquias governantes contra tudo o que se pareça com uma reivindicação de democracia.
Este segundo apelo vai no sentido de todos os que defendemos as liberdades fundamentais e apostamos na democratização das instituições e das leis comuns nos esforçarmos por evitar fórmulas como "a Wikileaks somos todos nós", ou "Todos somos a Wikileaks", etc. São fórmulas inaceitáveis, perigosas e equívocas, sugerindo um unanimismo que se arrisca a desfigurar e corromper a unidade democrática em identificação com uma organização que, ao contrário, de integrar e definir a unidade em aberto dos cidadãos no exercício dos seus direitos, tende a ser apresentada como integrando e definindo o movimento mais vasto do qual deverá ser parte e do qual, enquanto parte, tira a sua legitimidade democrática e merece o nosso apoio. O exercício da cidadania democrática não está ao serviço nem pode ser instrumento de nenhuma organização, partido ou associação particular, por maiores que sejam os seus méritos. É o combate da Wikileaks contra as prerrogativas das oligarquias governantes que é uma arma ao serviço da democracia - e não o contrário. É a Wikileaks que, para ter o nosso apoio, se deve orientar por e assumir formas e critérios da acção democrática. O que é muito diferente de fazermos dela ou da solidariedade com ela critério de legitimação ou definição da democracia.
Nos idos do PREC, ouvia-se na rádio muitas vezes um hino angolano cujo refrão era: "O MPLA é o Povo - o Povo é o MPLA". Convém lembrar o que foi feito do povo angolano por esse "ser "que superiormente, acima dele, se propunha como sua definição. E o que foi feito de outros povos, também - sempre que a definição do seu "ser" conheceu definições semelhantes por obra de um poder político que se propunha como verdadeira identidade do conjunto de uma população.
Dir-se-á - e é incontestável - que a Wikileaks está longe de ameaçar constituir-se em vanguarda político-partidária e potencial matriz de um regime que, em nome da sua definição do "povo" ou dos "trabalhadores", assente na expropriação de toda a cidadania activa ou autónoma dos governados. No entanto, nem por isso a lógica profunda e involuntária das fórmulas que referi deixa de ser aparentada, arriscando-se a contribuir para o caldo de cultura da legitimação do poder dos partidos-guias - ou utrosdetentores da essência superior da verdade do nosso "ser", aspirações e interesses -, cuja influência e poder só poderão ser inversamente proporcionais à influência e poder da nossa autonomia democrática. Sendo assim, mais vale prevenir do que remediar, ou, se se preferir, é de pequenino que se torce o pepino ao movimento da democracia.
09/12/10
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