27/12/10

O voto obrigatório

No Cinco Dias, Daniel Medina levanta a discussão sobre o voto obrigatório
1º – Seria democraticamente correcto?

2º – Que mecanismos deviam/poderiam ser implementados para esse efeito?

3º – Ganharia a esquerda mais votos?

4º – Tanta foi a luta para que as mulheres, por exemplo, pudessem exercer o direito de voto, porque não torna-lo agora obrigatório?

5º – Quais os entraves que seriam colocados?
Eu sou capaz de escrever mais algo sobre isto, mas só um pequeno exercicio intelectual - no ponto 4, substituir "voto" por "aborto".

3 comentários:

Miguel Serras Pereira disse...

Insigne e libertário caro camarada Miguel Madeira,

por uma vez, receio ter de te levantar algumas objecções.
Sem dúvida, que a tua boutade é brilhante e inspirada. Evidente, também, que os considerandos do autor do post que citas são um tanto precipitados e acabam por produzir, do ponto de vista argumentativo, demasiado ruído.
Dito isto, não vejo porque é que a obrigação de votar seria mais autoritária do que a de pagar impostos, sendo que creio sê-lo bastante menos do que uma série de imposições, talvez mais informais, mas não menos efectivas, inseparáveis da actual esfera da economia.
Irei até um pouco mais longe. Se exceptuarmos o cenário mítico do comunismo integral (em que cada um se serve dos bens que quer, quando e como quer e sem contrapartida, na ausência de regras de atribuição e distribuição), até mesmo numa regime económico plenamente democrático (ao nível macro: igualização de rendimentos; ao nível micro: autogestão ou gestão democrática do trabalho), trabalhar ou assegurar certas tarefas definidas como indispensáveis pelo autogoverno dos cidadãos continará a ser "obrigatório" (isto é, não poderá resultar do simples arbítrio individual incondicionado). Provavelmente, nesse quadro, essas tarefas obrigatórias serão a contrapartida da plena participação igualitária de cada um nas decisões que se lhe aplicam - ou ainda, um aspecto da obrigação de participar no exercício da cidadania governante.
Ora, a mesma ordem de razões poderá valer para o voto. Este é um direito ao qual corresponde o dever de assumir uma responsabilidade. E confesso que a ideia não me parece chocante, mas bastante razoável.
Admito, contudo, que seja defensável uma outra posição: quem não quiser votar não votará, mas será obrigado pelos resultados da votação tal como se tivesse votado - poderá renunciar ao exercício do direito de participar na definição da lei ou das regras que o vinculam, mas não aos deveres que elas (lei geral e regras particulares) lhe impõem.
Conclusão e pressuposto: a sociedade livre e igualitária a que podemos chamar "autónoma" ou "democrática" ("democrática libertária", entenda-se) partilha com todos os outros tipos de sociedade humana conhecidos (ou, até ao momento, concebíveis sem contradição) o traço essencial e decisivo de não ser uma associação voluntária. É, de resto, por isso que a política, no sentido mais nobre do termo, é uma necessidade da nossa liberdade, quer a consideremos na perspectiva individual, quer na colectiva e comum.
O meu ponto não é tanto saber se o voto deve ser ou não obrigatório, como pôr em evidência que há obrigações e responsabilidades cuja imposição política explícita é condição daquilo a que chamamos democracia e liberdade.

Vigoroso abraço

miguel (sp)

josé manuel faria disse...

O voto obrigatório não é defensável em circunstancia alguma.

Muito menos num país com um nível de iliteracia e analfabetismo altíssimo.

Provavelmente metade das opções políticas (hoje)são por amizade/família/empatia/simpatia do candidato do que propriamente pelo que defende.

Miguel Serras Pereira disse...

Caro José Manuel Faria,
de acordo, com os seus considerandos, mas não com a sua conclusão. O voto obrigatório - que não defendo por princípio - não impede o voto em branco ou nulo.
Cordiais saudações republicanas

msp