Claro que há.
Para perceber isso melhor, vamos por partes; temos basicamente 3 sectores económicos:
a) sectores que não necessitam de grande contacto interpessoal presencial, e que continuaram a trabalhar
b) sectores que foram considerados essenciais, e que continuaram a trabalhar
c) sectores que fecharam
O sectores a) e b) na prática são iguais, portanto não os vou distinguir mais ao longo do post; a grande questão aqui é o que fazer às pessoas dos sectores c).
Entre os defensores da "abertura" são frequente argumentos como "ir comer ao restaurante é uma despesa essencial - para quem trabalha no restaurante" ou "podiamos fazer ginástica em casa, mas os preparadores fisicos dos ginásios também precisam de viver"; um contra-argumento imediato que aparentemente poderia ser feito era dizer que as pessoas que iriam comer ao restaurante podem sempre de vez em quando mandar para o NIB do restaurante uma transferênca bancária no valor da refeição que iriam fazer, os clientes dos ginásios continuar a pagar as mensalidades, etc, etc. e em termos de distribuição do rendimento ficaria tudo na mesma - os trabalhadores dos sectores a)+b) deixavam de comprar produtos c), mas continuavam a mandar aos trabalhadores dos sectores c) o mesmo dinheiro que antes gastavam lá.
Claro que ninguém ou quase ninguém vai voluntariamente fazer isso - mas há dinheiro para se fazer isso: afinal, as pessoas dos sectores a)+b) estão provavelmente a poupar muito dinheiro, já que deixaram de fazer despesas nos sectores c) (e duvido muito que tenha havido grande redirecionamento de despesas para outros sectores) - como o aumento da poupança dos sectores a)+b) seria possível compensar parte da quebra do rendimento dos sectores c) (não toda - as receitas dos sectores "c" incluíam não apenas as despesas dos sectores "a+b" em produtos "c", mas também os "c" a comprarem coisas a outros "c" - mas grande parte). Agora, se as pessoas dos sectores "a+b" não contribuírem voluntariamente para sustentar as dos sectores "c", que medidas se podem tomar?
- lançar um imposto extraordinário aos "a+b" para financiar os "c" (como os "a+b" têm menos despesas do que tinham, teriam dinheiro para pagar esse imposto)
- o estado endividar-se para pagar o tal subsídio aos "c" (como os "a+b" aumentaram a sua poupança, em principio haverá dinheiro disponível nos mercados de crédito para financiar esse deficit)
- o BCE imprimir dinheiro para pagar o tal subsídio aos "c" (como muita gente está a acumular dinheiro sem o gastar, essa impressão de dinheiro - se fosse em valor correspondente ao aumento da poupança - não iria causar inflação)
[Note-se que no fundo, todas estas variantes seriam a mesma transferência de dinheiro que no caso da família que todos os sábados ordenasse uma transferência bancária de 80 euros para o seu restaurante de peixe grelhado favorito, apenas feita por meios coercivos e generalizados]
Outra questão seria como identificar as pessoas "c", que perderam rendimentos devido ao fecho da economia (o que inclui não apenas as que ficaram sem emprego mas também - e essas são mais dificeis de identificar - as que deixaram de arranjar emprego por causa da pandemia e/ou da quarentena) - mas na prática o melhor seria continuar com a natureza do que se tem feito (alargamento dos subsídios de desemprego, lay-offs, subsidios às empresas que pararam), mas com a dose reforçada (em termos de dinheiro e abrangência).
[Post publicado no Vento Sueste; podem comentar lá]
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