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Yoani Sánchez, a blogger mais conhecida da diferença cubana, é um caso especial e julgo que único, uma espécie de Anne Frank dos tempos cibernéticos. Não é uma programática nem uma ideóloga, apenas regista o quotidiano cubano e narra os conflitos entre a sua lucidez e a sua sede de liberdade com a ordem totalitária que encarcera o seu povo. Num conflito tanto mais exasperante porque tem pela frente a opressão poderosa e absoluta dos que reprimem em nome de uma das mais belas utopias criadas pelos homens, a da fraternidade-igualdade. Como Yoani diz, com amargura mas sem cinismo:
“Vivo numa utopia que não é a minha. Por ela se sacrificaram os meus avós e os meus pais renunciaram aos melhores anos da sua vida. Carrego-a às costas sem poder aliviar-me do seu peso.”
“Alguns que não a conhecem tentam convencer-me de que devo preservá-la, mas não sabem quão alienante é carregar o peso de sonhos alheios e viver uma ilusão que me é estranha.”
“A quantos me impuseram – sem me consultar – esta falsa quimera, quero dizer, desde já, que não tenciono deixá-la em herança aos meus filhos.”
Impedida de sair de Cuba, sem acesso sequer a visualizar o seu blogue, isolada, vigiada de perto e controlados todos os seus passos, constantemente ameaçada, várias vezes maltratada fisicamente, caluniada por uns e outros (uns acusam-na de ser paga pela CIA e por Miami, outros espalham o boato de que é uma agente dos serviços policiais cubanos usada para “penetrar” a dissidência cubana), o espantoso é a resistência desta jovem e teimosa cubana. Que bloga e não pára de blogar. Fazendo uma ponte entre a realidade claustrofóbica do interior quotidiano de uma ditadura e o mundo. Permitindo a quem está por fora, espreitar para dentro do íntimo da ditadura, sentir-lhe o sufoco, a opressão e o cinismo colectivo necessário para um povo (sobre)viver entre a celebração dos donos do poder, a penúria e a repressão, sempre em nome da utopia mais bonita.
Merece leitura atenta e despreconceituada a recente edição portuguesa do livro com os seus textos publicados no “Generación Y” (*). Confirmando que “há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não”. Mesmo na ditadura “mais triste” (que cobre, paradoxalmente, um dos povos mais alegres).
(*) – “Cuba Livre”, Yoani Sánchez, Edições Casa das Letras.
(publicado também aqui)
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