07/09/10

Santa pachorra



Não sei se Pedro Quartin Graça tem dificuldades em interpretar um pequeno escrito, se os afazeres diários o impediram de ler com atenção o que aqui escrevi ou se, perante a ausência de argumentos, optou pela velha táctica da desconversa. Para o caso pouco importa já que, voluntária ou involuntária, a tresleitura é demasiado óbvia para poder passar incólume. Em vez de rebater os apontamentos críticos que fiz à carta do comandante António Fontes, Quartin Graça optou por citar metade de uma frase que usei, fazendo uma interpretação abusiva do que escrevi e extrapolando a todo o post esse sentido enviesado. Basicamente, sou um tipo que dá muito pouco (ou nenhum?) valor à vida humana porque escrevi: «É claro que a morte de um elemento da tripulação é de lamentar, mas o assalto ao "Santa Maria" não se pode obviamente reduzir a essa vida perdida.»

Reitero: a morte de um elemento da tripulação é de lamentar, mas o assalto ao “Santa Maria” não se pode reduzir a essa vida perdida. E quando digo que a morte é de lamentar, espero que se entenda que é isso mesmo que estou a dizer. Sabendo que cada vida é irrepetível e que ela é, em última análise, a única coisa que verdadeiramente os seres humanos possuem, lamento a morte de cada indivíduo porque nela antecipo a minha. Só que ninguém, nem o mais pio dos pios, interpreta a história com o sangue dos mortos a cobrir-lhe integralmente os olhos. A intenção de quem age, as circunstâncias históricas e a espessura dos factos são elementos importantes. E uma morte, sendo uma enormidade, pode não esgotar um evento. Não entender isto é considerar que os activistas políticos que fizeram o assalto ao Santa Maria com o intuito de denunciar ao mundo a ditadura portuguesa – ditadura essa que estava em vésperas de se envolver numa guerra colonial que resultou em milhares de mortos – eram meros piratas de instintos e intenções assassinas. Nada mais nada menos do que a imagem que deles tentou fazer passar o Estado Novo.

É assim tão difícil de entender ou a vontade é que é pouca?

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