06/11/10

Da democratização como plataforma necessária e suficiente da acção comum

Dois textos consistentemente argumentados, do José Castro Caldas e da Sandra Monteiro, mostram bem, nas perspectivas que lhes são próprias, o que, também eu, mais improvisadamente, tenho vindo a repetir aqui, uma e outra vez: ou seja, e nos meus termos, que a absolutização tendencial do poder económico que politicamente nos governa requer a tendencial absolutização antidemocrática do poder político formal e das suas instituições explícitas.
A divergência entre nós começa quando, tanto o Zé Maria como a Sandra, sugerem a possibilidade de combater esta tendência de fundo através de, à escala da Europa, uma mudança de governos e do pessoal político dos partidos, bem como da composição partidária das forças governantes. Com efeito, do meu ponto de vista, a necessidade de obter o mínimo — travar a ofensiva oligárquica tão convincentemente descrita pelos meus dois interlocutores — requer mais do que a simples modificação da distribuição dos lugares da cena política existente. Se, sem dúvida, quem quer o mais, não pode deixar de querer o menos, é também verdade que o mínimo que podemos querer com verosimilhança exige, mais do que uma mudança de governos, a transformação do regime.
Mas se esta diferença é de peso, não impede, do meu ponto de vista pelo menos, a acção comum e a formulação de objectivos solidários. Na medida exacta em que, assente na participação igualitária e na auto-organização dos trabalhadores e do conjunto dos cidadãos, a extensão do exercício das liberdades e o aprofundamento da democracia entendida em termos inseparavelmente políticos e económicos — e uma coisa porque outra — de que falam o Zé Maria e a Sandra forem conseguidos, será de facto uma mudança de regime de exercício do poder o que teremos, muito para além da simples mudança dos governos e da composição partidária dos governos, ainda que complementada por uma renovação do pessoal político dos partidos. As reformas que defendem a Sandra e o Zé Maria serão uma democratização radicalmente instituinte — e, por isso, se assim quisermos chamar-lhe, mas sem abusar da palavra, revolucionária — ou não serão.
Esta breve conclusão sugere um ponto de partida prometedor: a democratização como plataforma necessária e suficiente tanto da resistência à oligarquia como da ousadia de explorarmos e aprofundarmos a "crise" desenvolvendo as capacidades governantes da cidadania política comum

0 comentários: