03/05/11

Anjo ou Demónio?

Perfeita, uma vez mais, a crónica de Manuel António Pina no JN sobre as reacções pastorais de diversos guias dos crentes à morte de Bin Laden. Aqui fica na íntegra, com a devida vénia:

A morte de bin Laden (alguns noticiários referiam-se ontem cepticamente à "alegada morte de bin Laden"), a fotografia manipulada que circulou na Net, a estranha história do corpo lançado ao mar e, sobretudo, a decepção que o anúncio dessa morte provocou nas hostes do antiamericanismo primário, simétrica da euforia acrítica das hostes do americanismo primário, já estão a dar pano para mangas aos vivaços locais e internacionais das teorias da conspiração.

À míngua de "provas científicas" como as que irrefutavelmente demonstram que foram a CIA e a Mossad os autores dos atentados contra as Torres Gémeas (tudo, aliás, como vem nos "Protocolos dos sábios do Sião"), as explicações do que "verdadeiramente" terá acontecido ficam-se, para já, pelo engenho elucubrativo, e vão desde o óbvio facto de bin Laden nunca ter existido até à constatação, não menos óbvia, de que era um agente sionista.

Há também quem esteja sinceramente convencido de que irá ressuscitar ao terceiro dia, se calhar sob a forma de bebé bombista suicida como o que o Hamas mostrou à imprensa em 2002, ou que a sua morte é o tão esperado milagre que promoverá João Paulo II a santo.

Isto enquanto em Nova Iorque e Washington se festeja nas ruas como, em 11 de Setembro de 2001, se festejou nas ruas de Ramallah, menos os tiros para o ar.

Talvez o mundo (ou, vá lá, meio mundo) não esteja maluco mas sim quem acha que meio mundo está maluco.

18 comentários:

Anónimo disse...

o objectivo desta crónica é explanar porque não se deve ter em atenção as teorias da conspiração?
podia-me dizer qual a sua opinião acerca do que aconteceu no 11 de setembro? acha que foram os aviões que derrubaram os edifícios?
ou tudo isto não interessa e só vale a pena falarmos do FMI?

Miguel Serras Pereira disse...

Prezado Anónimo,
longe de mim a ideia de que só vale a pena falarmos do FMI. De resto, penso que, para falarmos e agirmos bem no que se refere ao FMI, não poderemos limitar-nos a essa realidade.

O que é preocupante para mim é a destruição/erosão maciça da faculdade do juízo político - ingrediente indispensável da cidadania democrática - que transparecem nas teorias da conspiração ou noutros tipos de leitura dos acontecimentos do dia. Assim, por exemplo, vemos "jornalistas" como o Renato Teixeira publicar a poucas horas de distância dois posts contraditórios - um dando por falsa a notícia da morte de Bin Laden (que já estaria morto há anos, etc.), outro dando-a por boa - e tirando conclusões idênticas tanto num caso como noutro (Cf. http://5dias.net/2011/05/02/benazir-bhutto-bin-laden-was-killed-years-ago-omar-sheikh-was-the-man-who-murdered/ e http://5dias.net/2011/05/03/robert-fisk-explica-a-morte-de-bin-laden-em-exclusivo-para-o-i-e-para-o-5dias-o-assassinato-de-bin-laden-representa-o-fracasso-da-estrategia-dos-eua-e-dos-seus-aliados/ ) Ou ver o mesmo jornalista intrépido aplaudir ontem as conclusões éticas de um post do Rafael Fortes sem se penitenciar da violação decidida que há tempos levou a cabo dos mesmos preceitos éticos de que agora se reclama. (Cf. http://5dias.net/2011/05/02/venceu-a-barbarie/ e http://5dias.net/2011/01/04/longa-vida-ao-ariel-sharon/ )

Finalmente, sim, houve um atentado no 11 de Setembro; Bin Laden foi morto por uma operação militar americana; a cadela Laika viajou no espaço a bordo de um "satélite" soviético; Gagarine não foi um mito da Guerra Fria; uma nave espacial poisou na superficie lunar em 1967 - e você tem nome, embora não o revele.

Com os meus cumprimentos

msp

Anónimo disse...

fico sensibilizado com a preocupação que revela com os "jornalistas" portugueses, mas permita-me que lhe coloque só mais algumas perguntas:
- não acha que o que aconteceu no dia 11 de setembro é demasiado importante para ainda hoje não haver uma explicação satisfatória (à luz da ciência)?
- não acha que catalogar todas as histórias mal contadas como teorias da conspiração contribui para a erosão da ética jornalística, no sentido da obrigação moral de informar correctamente o publico, e consequentemente para a descredibilização da actividade pública e política?
- não acha que há coisas mais importantes do que andar a picar-se com o R.Teixeira? ou pleo menos, que há coisas que não justifica estar pôr em causa só para expôr o outro ao ridiculo?
- não acha que o meu nome não tem a minima importância, e que o que conta mesmo é podermos estar aqui a trocar opiniões sérias? ou já está tão conspiranoico que acha que eu sou um agente da cia/ps/casa_civil_da_presidencia_da_republica infiltrado?
cumprimentos democraticos mas desconfiados,

Anónimo disse...

calma rapaziada,

ainda os vamos ver proclamar aqui veementemente que os disparos contra os manifestantes no dia 1 de maio em setubal aconteceram mesmo... e não são uma teoria da conspiração!

Miguel Serras Pereira disse...

Anónimo das 12 e 30

já o fez por todos o nosso camarada Ricardo no post exemplar cuja leitura lhe recomendo e recomende que divulgue.
Uma "teoria da conspiração", na circunstância, o que faria era negar os disparos e sanha da polícia - diria que eram tudo figurantes para um filme de propaganda anti-FMI… Não sei se está a ver a diferença.

msp

Anónimo disse...

A " Operação " contra a " fortaleza " de Bin-Laden não foi a primeira levada a cabo pelos EUA no Paquistão. Em 2002 e 2003, os EUA conduziram três atentados coroados de êxito contra operacionais da Al-Qheda. No primeiro ano referido, 2002, em Faislabad e Karachi; em 2003, em Rawalpindi, e que vitimou um dos maiores operacionais da organização, Khalid-Sheik Mohammad. A entrevista de Robert Fisk - publicada no diário " I"- tem a virtude de colocar questões estratégicas muito importantes sobre o futuro do Afeganistão e o cruzamento de " interesses " geopolíticos nele envolvidos pelo Paquistão, a India e o Irão.Niet

Anónimo disse...

estou a ver a diferença, sim senhora... mas o msp anda um pouco impaciente, dê-lhe tempo, miguel, dê-lhe tempo... e verá como a negação dos disparos e da sanha da polícia fará parte do discurso oficial... ou então, farão as pedras, os desacatos e a sanha dos manifestantes. vai uma aposta?

Zé_dopipo disse...

Presumo que seja o mais fino sarcasmo, quiçà ironia, que leve o MSP a chamar perfeita a mais uma bosta em forma de opinião escrita saída da pena deste senhor MAP.
Repare-se na subtileza da divisão maniqueísta dos anti e prós. Logo a seguir, pás, levas logo com a teoria da conspiração. E, como cerveja no topo do bolo, os tiros em Ramallah, não interessando que a CNN tenha confessado que foi uma manipulação barata de imagens de arquivo.
Pastoral mesmo.

Miguel Serras Pereira disse...

Prezado Zé-Lucas,

posso perguntar-lhe se é dos que acreditam que Bin Laden já estava morto há muito tempo, dos que sustentam que não foi liquidado e continua vivo, dos que argumentam que ele nunca existiu, ou dos que adoptam os três - pelo menos - pontos de vista ao mesmo tempo. É só uma curiosidade que tenho comigo. Desculpe a maçada.

msp

Zé_dopipo disse...

E porquê só três, MSP? Não acha que está a ser redutor? Pelo menos está-lhe a faltar a teoria da conspiração oficial, com o desenlace conhecido nos últimos dias. Quem lhe diz que eu não sou freguês dessa fé?

ZLM

Miguel Serras Pereira disse...

ZL, se vir bem, a minha pergunta antecipava a possibilidade dessa sua resposta. Não é muito clara, mas a verdade é que não se pode ter tudo. E é também verdade que o excesso de clareza pode indiciar a alucinação. Portanto, muito bem - não quero pedir-lhe que explique em que consiste, em seu enetnder, a versão oficial…

msp

Zé_dopipo disse...

A D. Beatriz, organista numa igreja, tem 80 anos e é solteira. Era
admirada por todos pela sua simpatia e doçura. Uma tarde, convidou o
novo padre da igreja para ir lanchar a sua casa e ele ficou sentado no
sofá, enquanto ela foi preparar um chá.
Olhando para cima do órgão, o jovem padre reparou numa jarra de vidro
com água e, lá dentro, boiava um preservativo.
Quando a D. Beatriz voltou com o chá e as torradas, o padre não resistiu
tirar a sua curiosidade perguntando o porquê de tal decoração em cima do
órgão.
E responde ela apontando para a jarra: "Ah! refere-se a isto?
Maravilhoso, não é? Há uns meses atrás, ia eu a passear pelo parque,
quando encontrei este pacotinho no chão. As indicações diziam para
colocar no órgão, manter húmido e que, assim, ficava prevenida contra
todas as doenças. E sabe uma coisa? Este Inverno ainda não me constipei".

A Fé é que nos salva... não é verdade, MSP?

Mário Abrantes disse...

*****

E agora para algo con pateta mente diferencial disse...

O que é preocupante para mim é a destruição/erosão maciça da faculdade do juízo crítico ou outro qualquer

é um episódio é mais um zapata que cai, surgirão outros e serão enterrados outros tantos

se tem clones como saddam

se morreu 3 vezes e ressuscitará outras 3

qué quisso intressa

zeh disse...

Não faz nenhum sentido equiparar a justa desconfiança e cepticismo perante as convenientes versões oficiais com a aceitação acrítica dessas mesmas versões. É certo que existe depois por vezes uma tendência pouco saudável para a partir desse cepticismo lançar explicações e versões alternativas com pouco ou nenhum fundamento. Mas também é certo que esta tendência é alimentada e faz parte do arsenal de técnicas de desinformação do sistema de poder, que assim se legitimiza e ás suas narrativas, por contraste com outras de calibre similar. Mas larguemos a parte das "teorias". Nós sabemos que as conspirações existem e existiram! Bilderberg, Reichstag, intervenções paramilitares, "diplomacia" posta a nú pelo wikileaks. E agora colocam-se no mesmo plano os que desconfiam das mentiras presentes à luz destas outras e os que reforçam as do imperialismo? Precisamente quando apontam as incongruências e conveniências das versões oficiais? Neste momento, o que é necessário é associar isto à imagem de "teorias da conspiração"? O Zé Lucas tem razão ao desafiar MSP a definir em quais dos campos se coloca, paranoico-conspirativos ou crentes fiéis nas verdades do sistema imperial, uma vez que aceita o maniqueísmo dessa falsa dicotomia.

Miguel Serras Pereira disse...

zeh,

não, não aceito a dicotomia - ou acreditamos nas paranóias irracionalistas dos "crentes", ou temos de aceitar as versões dos governantes das oligarquias ocidentais. Talvez me limite apenas a considerar uma ameaça mais grave do que lhe parece a si aquilo a que V. chama "tendência pouco saudável para a partir desse cepticismo lançar explicações e versões alternativas com pouco ou nenhum fundamento".
A emancipação exige mais, e não menos, racionalidade e reflexão incorporada na acção. E exige também que distingamos entre projectos de dominação rivais, alimentados por diferentes agentes oligárquicos em diferentes regiões do globo e diferentes condições sociais e políticas, e a alternativa da democratização das relações de poder (incluindo, evidentemente, as que governam a economia e a tornam governante) ao nível tanto "local" ou "regional" como "global".

Saudações democráticas

msp

zeh disse...

Bom, talvez nos comecemos a entender então. Se não aceita a dicotomia, a crónica do MAP não será "perfeita", já que tem implícita a tal falsa dicotomia, por um lado, e tem explícita por outro a associação do justo e saudável cepticismo face às versões oficiais à concepção de "teorias da conspiração". Contribui MAP aqui e desta forma para legitimização das narrativas do poder, quando não distingue este cepticismo das especulações infundadas que se lhe seguem vezes demais (e muitas dessas semeadas pelos agentes dessas oligarquias).

Não me parece também que tenha desvalorizado a confusão gerada por falta de análise consistente e a decorrente inconsequência na acção - disse até que o imperialismo e as burguesias locais usam essa ferramenta com muito sucesso.

Quanto ao resto, e como a maior parte das vezes, de acordo.

Cumprimentos.

Miguel Serras Pereira disse...

Caro zeh

fazemos, pelos vistos, uma leitura diferente da crónica do MAP.
Nem ele, nem eu, nem mesmo V. diz tudo a todo o momento e ao mesmo tempo. Assim, concluir que o MAP desposa a dicotomia parece-me excessivo - e, depois, não é bem o género dele (do grande MAP).

Falando por mim, ao citar e comentar a crónica que transcrevi, também eu não disse mais do que uma parte - ou comentei mais do que um aspecto - das coisas.

Tentei ser menos unilateral noutras observações, como as que fiz comentando um post da Joana Lopes (cf. http://www.blogger.com/comment.g?blogID=1565842508268911669&postID=856039476089791806) ou citando e comentando aqui no Vias uma bela reflexão do Ricardo Alves (cf. http://viasfacto.blogspot.com/2011/05/vitorias-de-bin-laden.html). Mas nada do que acrescento invalida o juízo que continuo a fazer sobre o que escreveu o MAP - ou me leva a pôr sequer remotamente a hipótese de o considerar "crédulo" perante as diversas verdades oficiais em confronto global.

Saudações democráticas

msp

P.S. Tanto quanto consigo entendê-los bem, também eu me sinto de acordo com os pressupostos do seu comentário…