07/06/10

Bhopal continua tóxico

Os responsáveis da multinacional Union Carbide no acidente que provocou milhares de mortos (3.000 indianos morreram imediatamente e, mais tarde, devido aos efeitos mais lentos e secundários, sucumbiram outras 25.000, após uma fuga, por negligência, no fabrico de pesticidas) em Bhopal (Índia), só julgados ao fim de vinte e seis anos, foram agora condenados a penas simbólicas (dois anos de prisão e 2.100 dólares de multa). Uma vergonha. A impunidade tóxica continua, agora através da justiça temerosa perante os criminosos poderosos.

Na altura do enorme escândalo pelo acidente de Bhopal, lembro-me, não só a imagem da Union Carbide foi fortemente afectada como se gerou, em consequência, um novo paradigma no manuseamento e produção de produtos tóxicos. As empresas químicas passaram a ter novas preocupações ambientais e os seus produtos foram sujeitos a um rastreamento muito mais exigente, multiplicando-se a regulamentação restritiva e preventiva. Algo de parecido com o que depois se passou com a energia nuclear após Chernobyl. Neste sentido, as vítimas de Bhopal funcionaram como mártires da irresponsabilidade químico-industrial e aos seus sacrifícios involuntários e criminosos se devem muitos dos posteriores procedimentos mais exigentes quanto à poluição industrial, sobretudo a que comporta o manuseamento e produção de substâncias perigosas. Mas tal como quanto a Chernobyl e ao actual derrame da BP no golfo do México, e outros, um acidente que provoca vítimas nas populações e no meio ambiente, sendo um crime, implica a responsabilização dos criminosos (que têm nomes e a maior parte das vezes fortunas). As condenações ridículas dos criminosos de Bhopal vão ao arrepio de um acto decente de justiça. E funcionam muito mal em termos de responsabilização dos gestores e outros responsáveis. Estes não servem, não podem servir, apenas para recolher gordos salários e chorudos prémios por lucros muitas vezes obtidos selvaticamente e a qualquer custo do ambiente e da saúde pública. Quando cometem crimes ou são seus cúmplices por negligências ou omissões, devem pagar segundo a dimensão dos crimes cometidos e das vítimas. A indignação dos familiares das vítimas de Bhopal perante estas sentenças miseráveis é justificável e merece todo o apoio. Pelas memória das vítimas, pelo ambiente, pela saúde pública, pelo planeta. Sendo nosso dever exigir sucesso aos recursos que vão ser apresentados perante a toxicidade infame destas sentenças.

(publicado também aqui)

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