Compare-se, por contraste com as aqui referidas declarações politicamente nulas de Paulo Pedroso - que de momento parece preocupar-se apenas com o problema de saber como poderá o PS manter-se partido de governo, sem se dar ao trabalho de se perguntar sequer para que outra coisa que não seja garantir ao aparelho o benefício da governamentalidade - o que Ana Benavente escreve hoje no Público, identificando pelo menos uma parte substancial dos problemas graves do PS e, por extensão, do esatdo de privação democrática que caracteriza a paisagem política e social do país.
Por exemplo: "O problema são as pessoas, sempre as pessoas, a quererem saúde e educação, e paz e pão também, não?? E habitação, já agora. Querem tudo. Será por isso que votaram no PS? E o que lhes deu o meu partido? Contradições e desacertos, e políticas que teriam ficado menos mal no anterior PSD. O próximo vai ser pior. Este que concorda discordando e discorda concordando. Não percebem? É pelo país, pelo país. Por isso o futuro se assombra. Agora, dizem PS e PSD , dizem tantos comentadores, em vários tons e vozes desafinadas, agora estamo-nos a afogar. Não há mais conversa nem discussão. Nada a fazer. É uma fatalidade. Não, não é, o presente e o futuro somos nós que os construímos. Vamos aceitar a fatalidade que nos querem impor?"
Ou ainda: "Nunca se lembraram as autoridades de pensar que quando se fecha uma escola se fecha uma aldeia, que o fecho das escolas reforça a desertificação, acaba com comunidades, isola as crianças e dissolve-as no anonimato de pequenas cidades onde passam o dia sem amigos nem vizinhos nem família, de manhã à noite.É isso que está a acontecer: os mais novos e os mais velhos a viver em instituições. Os da idade activa em liberdade vigiada. Não quero uma sociedade assim. Criminoso, fechar todas as escolas com menos de 21 alunos. Vamos deixar que isso aconteça?"
E também: "Serei só eu que vejo no Governo pessoas do PS em quem não acredito? Que falam com chavões cansados e usam retóricas como quem repete uma fórmula já gasta? Sem alma? E que será do PS quando deixar de ser Governo? Travessias do deserto são normais, afirmam. Não concordo. Os coveiros do partido são conhecidos. Depois, ficará o pior de todos nós, dentro e fora. Solidários e caridosos, sempre fomos. Mas a liberdade, a fraternidade, a esperança, por onde andam? PS, que lhes fizeste? (…) Quero viver agora, aqui ou noutro lado, convosco, como sempre fizemos (…). Este país, no mundo, é nosso. De cada cidadão que nele habita. (…) A luta continua... e agora quem vai para a rua? Nós? Todos?"
Dir-se-á que esta interpelação não dá o passo decisivo de encarar alternativas para os males que denuncia. Ou que a sua autora deixa por formular perguntas tão indispensáveis como: Que atitude tomar em relação ao PS, dentro e/ou fora dele? Como não desistir da democratização garantindo aos cidadãos o poder (político) de mudar e decidir, sem o qual a canção dizia que não há "liberdade a sério" - e tendo em conta que a mesma "liberdade a sério" requer a transformação radical do "poder político" que é a direcção da economia? Como deve um partido ou movimento organizado e responsável lutar ao lado dos cidadãos pela democratização necessária, sem pretender substituir à sua participação directa formas de representação que, à partida, pressupõem a expropriação das suas capacidades políticas governantes? Mas, ainda que não as explicitando nem, por maioria de razão, especificando que começos de resposta poderemos propor para elas nas circunstâncias presentes, Ana Benavente dá voz a um mal-estar e a uma revolta que, politicamente assumidos, só podem pô-las na ordem do dia. Com o PS ou sem ele, por um movimento, socialista porque democrático, que reanime a sua área de influência, e pelos que, nessa área ou tradição, ainda não desistiram de tornar a expressão "socialismo democrático" algo mais do que uma mistificação, para efeitos decorativos, invocada por políticos e governantes ao serviço de todas as "reformas" reclamadas pelos interesses da ordem económica estabelecida à escala global.
07/06/10
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3 comentários:
ana benavente num anterior artigo também no público apresentou alternativas para os males que denuncia no seu Partido. Chama-se "5 teses para o futuro do PS" e foi publicado em 17 de Fevereiro! Mas claro que no seu partido (e fora dele) ninguém o quis (ou pôde...)comentar. è talvez das figuras mais interessantes do PS, mas parece não ter grandes solidariedades internas exactamente porque mantém a coluna na vertical, É sem dúvida a única ex e actual dirigente do PS que pode aparecer numa reunião de professores!
Caro Asinus,
tem razão. Não pretendia entrar na discussão dos cinco pontos, embora reconheça que, subscreva-se ou não a sua formulação, seriam bons pontos de partida para uma reflexão na linha da que a crónica de ontem suscita.
O link para o artigo a que você se refere aqui fica: http://jornal.publico.pt/noticia/17-02-2010/cinco-teses-para-o-futuro-do-ps-e-do-pais-18806897.htm
Obrigado pelo contributo.
Saudações democráticas
msp
Caro Miguel
Penso também que as cinco teses, concorde-se ou não com elas, são merecedoras de reflexão e debate. Mas vivemos em Portugal, não temos tradição de debate político sério e a autora é...mulher o que nesta terra torna tudo mais difícil e mesmo impossível no terreno da ciência política. Os meios de comunicação e as TVs preferem as banalidades dos do costume. Veja-se só o painel de comentadores e os entrevistados. Nível intelectual confrangedor!
Saudações democráticas (e socialistas!)
asinus
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