07/06/10

Do Bufo ao Beato

O clero polaco foi um dos mais influentes e conservadores no catolicismo europeu. E profundamente contraditório no exercício do seu enorme poder eclesiástico. A poderosa Igreja polaca, enquanto cometia a proeza de meter um Papa em Roma (João Paulo II), eminentemente apostólico e carismático, com a alta missão de ajudar a destruir o comunismo e recuperar o conservadorismo ideológico na expressão da fé católica, praticava, portas dentro, uma cumplicidade gritante com a ditadura comunista para garantir a sua sobrevivência e privilégios. Entretanto, o poder comunista polaco cobrava à Igreja esse seu desejo de sobrevivência e sustentação, infiltrando o clero através da sua polícia política (15% dos bispos e padres católicos polacos eram agentes ou informadores da polícia política ao serviço do governo comunista). Entre estes colaboradores, o mais famoso (desmascarado em 2007, após a reconversão democrática da Polónia) foi o arcebispo de Varsóvia, Stanislaw Wielgus, que renunciou ao seu cargo após se descobrir o seu passado como bufo da polícia comunista.

Desde que a Polónia perdeu o seu Papa, com a morte de João Paulo II, e com a denúncia da colaboração profunda do clero católico polaco com o aparelho repressivo comunista, o catolicismo entrou naquele país numa crise profunda. Assim, precisava urgentemente, para recuperar balanço pastoral, de um mártir anticomunista beatificável e santificável com um sinal contrário ao do colaboracionismo com a ditadura marxista-leninista que manchava a reputação da Igreja polaca. Para isso, nada melhor que o Padre Jerzy Popieluszko (Capelão do “Solidaridade”, assassinado em 1984, quando tinha 37 anos, por três agentes da polícia política, a mesma que, entretanto, “controlava” o seu colega e “bófia” Stanislaw Wielgus). E Bento XVI, muito atento a tácticas e estratégias, foi célere nas decisões. O Padre Jerzy Popieluszko já é oficialmente Beato e em breve será Santo. Para que a Igreja Católica, na Polónia, possa, finalmente, lamber a ferida “Stanislaw Wielgus” e dos seus camaradas agentes e bufos ao serviço do “terror vermelho”. Com sucesso garantido, pois 150.000 católicos polacos reuniram-se imediatamente em Varsóvia num acto religioso celebrando a beatificação de Jerzy Popieluszko (foto).

(também publicado aqui)

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