Sou daqueles que admiram Francisco Louçã. Tanto assim é que dou por mim uma e outra vez a lamentar o tipo de críticas a que ele é frequentemente sujeito. Não porque sejam críticas, mas porque são, a meu ver, críticas medíocres. E como poderia dizer o Professor Marcelo, para aqueles que admiramos não devemos desejar menos do que a melhor das críticas. Terá sido, parece-me, esse nobilíssimo desejo que fez o Carlos Carujo escrever este texto que o Hugo Dias aqui publica. Bom, mas já lá iremos. Dizia eu que me irritam amiúde as críticas dirigidas a Louçã. Cada vez que ouço um deputado do PS dizer que Louçã tende ao moralismo, eu próprio, que de moralista não pretendo ter nada, tendo a advogar a necessidade do moralismo. O mesmo para o chamado proselitismo de Louçã. E quando um desses “SENHORES” (como diria o Carlos Vidal, que para estas coisas de sacudirmos a água do capote dá um certo jeito) do comentário político diz que Louçã é populista porque grita bem alto que enquanto uns ganham tostões outros ganham milhões, chego mesmo ao ponto de pensar se a solução populista não terá a vantagem de fazer persistir a contradição classista no palco da política institucional (ou pelo menos a dicotomia ricos e pobres) e de nos lembrar que a democracia supõe alguma relação entre a acção dos eleitos e a chamada vontade popular. Ou seja, quando ouço o "sistema" criticar Louçã, abdico de criticar a própria questão do moralismo, do populismo, da vontade popular, e por aí adiante. No entanto,
No entanto, acontece que a admiração que tenho por Louçã não é diferente da que tenho por centenas de outros militantes comunistas, bloquistas, anarquistas, situacionistas, o que queiram. Sem daqui excluir activismos e militâncias que escapam (umas apontando às melhores direcções, outras nem por isso) a um certo linguajar político-ideológico de eu que não me consigo (nem quero) libertar. E é aqui que resulta claro o seguinte: hoje sinto-me mais distante de Louçã do que ontem. Essa distância tem que ver com algumas das posições assumidas pelo Bloco nos últimos anos, mas a maior razão do distanciamento, no entanto, não está nas suas posições e sim na sua posição. A posição do líder. Que, desde logo, faz com que Louçã e Bloco se tornem uma e a mesma coisa, de tal modo que nenhum dos cinco leitores deste post terá estranhado que eu tenha acabado de apresentar posições do Bloco como razão do meu distanciamento face a Louçã.
Louçã é incontestavelmente um líder e uma figura extraordinária na vida política portuguesa mas o problema reside justamente em muitas das palavras que utilizei neste início de parágrafo: líder, figura extraordinária, vida política portuguesa. Tudo expressões de um imaginário e de uma realidade políticas que haveria que ir desconstruindo. Construir a revolução, como se diz em boa linguagem obreirista, implica desde logo destruir o edifício político vigente. E eu não tenho, diga-se, nenhuma resistência absoluta à participação na chamada vida política portuguesa (isto é, na política institucional, a democracia parlamentar, o que queiram), embora seja céptico em relação às possibilidades de transformação que daí resultem. Repito, porém, que não tenho nenhuma resistência absoluta a jogar no interior do sistema, mas apenas porque admito que a acção de construção e a acção de desconstrução podem decorrer simultaneamente. Nunca em tempos diferentes, primeiro construindo e depois destruindo. Que é, temo, aquilo para que tem tendido o protagonismo de Louçã.
O simples facto do debate em torno da participação ou não no sistema (palavra manhosa e tão útil como prejudicial à saúde da nossa inteligência) se colocar em termos de resultados denuncia já a nefasta eliminação do problema relativo aos meios da transformação. Estando eu de acordo que os meios e os fins devem ser mantidos a uma certa distância, não creio que faça sentido pensar essa distância como um primeito tempo (o dos meios) e um segundo tempo (o dos fins) mas sim (e uso uma imagem de Michael Hardt a propósito de Thomas Jefferson!) numa relação de espiral, com meios para fins que de novo incidem sobre novos meios a caminho de novos fins.
Louçã sabe bem que há um debate em torno dos meios que não deve nem pode ser adiado e lembrou-o uma e outra vez nas suas críticas ao marxismo-leninismo e à social-democracia. Além de que a isso mesmo foi lembrado uma e outra vez em debates onde as críticas de que foi alvo eram bem mais interessantes do que aquelas de que hoje é objecto nos media. Caso, por exemplo, de uma polémica (demasiado fraticida, é certo) entre Louçã e Miguel Serras Pereira e de outras no seio do próprio PSR.
Em resumo, o líder da oposição não é a mesma coisa que o líder do governo, o líder do partido anticapitalista não é a mesma coisa do que o líder do partido capitalista, o dirigente da fábrica não é o mesmo que o líder do sindicato, mas o que os aproxima é por demais desvalorizado nos tempos que correm, a começar por nós, os da esquerda. Isto tudo, já o disse, veio aqui parar a propósito do tal texto do Carlos Carujo, dirigente Bloco de Esquerda e da associação do PSR, e que o Hugo Dias publica aqui. É um texto que coloca muitas questões interssantes e que valerá a pena continuarmos a debater. Para já, ao argumentário do Carujo, ou do Hugo, e não pretendendo eu dar lições de bairrismo, patriotismo e sectarismo a ninguém (pelo contrário, é o movimento inverso que me interessa), a única coisa que me apetece acrescentar é esta: para a sua reflexão sobre liderança, revolução e media, o Carlos Carujo não encontrou nenhum exemplo mais perto de si do que o de Olivier Besancenot, o trotsquista que lidera o Nouveau Parti Anticapitaliste? Ou tratar-se-á de um daqueles exercícios em que a história do movimento comunista internacional foi pródiga, em particular em certos momentos: o chamado “ir para dentro lá por fora”? Se foi este o caso, óptimo. Se não foi, também não está mal: é pelo menos sinal de que há dois militantes trotsquistas em Portugal, o Carujo e o Hugo, que sentem que a "realidade francesa" é tão "sua" como a realidade da chamada "vida política portuguesa".
13/07/10
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3 comentários:
«Nouveau Parti Anticapitaliste» (o género de partido é masculino, em francês como em português).
Começo a concluir que é substancialmente mais fácil ouvir da tua análise elogios ao BE do que a concretização de críticas, mesmo quando ameaçadas. Continuo à espera de resposta às sucessivas tentativas de perceber o que opinas sobre o isolamento internacional do BE em matéria de apoio ao empréstimo grego.
Pormeto, contudo, não voltar a chatear-te com o assunto.
Ricardo Alves, está corrigido! Obrigado pela atenção. Quando escrever o meu próximo livro em francês, já sei quem contratar para revisor.
renato, tento não me orientar por esse critério - fazer elogios ou fazer críticas. em relação ao empréstimo grego, é como já havia deixado claro na altura: se o be tomou a decisão sem consultar o seu partido irmão na Grécia ou qualquer instância internacional que os superintenda, acho qeu foi um erro. E, de facto, parece-me que foi isso qu se passou, um erro. Tanto mais agravado na medida em que não foi "corrigido". O que nem custaria muito. E até não lhes dava má imagem.
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