25/01/11

Alternativas

Na caixa de comentários de um post do Nuno Ramos de Almeida, deparo com estas linhas, assinadas por Pedro Rodrigues:

A única viabilidade para um projecto alternativo à esquerda terá que passar sempre por um compromisso entre o PC, Bloco e até com alguns sectores do PS no estabelecimento de um programa mínimo, mas que as pessoas possam realmente se rever e percepcionar.

Pois bem, também eu penso que a possibilidade de resistir à ofensiva oligárquica e ao governo exercido sobre nós por decretos pela sua economia política passa pela construção de qualquer coisa como um "programa mínimo", a que prefiro (mas sem fazer disso cavalo de batalha) chamar "plataforma necessária e suficiente", tendo por denominador comum a democratização a todos os níveis do exercíco do poder e das relações de forças governantes.

Em segundo lugar, parece-me igualmente claro que essa plataforma terá de reunir enquanto base da maioria dos que actualmente se reconhecem mais ou menos militantemente no PCP, no BE e no PS, bem como um conjunto muito mais amplo de elementos não integrados nesses ou noutros partidos.

O problema é que estes protagonistas da plataforma ou programa de acção comum só poderão levar a sua construção por diante — ou: (1) deixando de se reconhecer nos partidos referidos, cujos métodos, formas de organização, divisão interna do trabalho político, etc. são um dos principais obstáculos a esse projecto — ou: (2) transformando os mesmos partidos, se quiserem poder reconhecer-se neles, em termos necessariamente tão radicais que os tornarão irreconhecíveis na exacta medida em que os transformem em forças alternativas tanto ao regime da economia política dominante como ao dos seus próprios modos actuais de intervenção e funcionamento.

7 comentários:

Niet disse...

MS.Pereira: Como nos incitou Castoriadis, " aquele que receia a recuperação já está recuperado ". Linha mínima que se confronta, como ele também o indica, " a abertura absoluta é o nada,isto é, de um modo imediato encerramento absoluto. A abertura é aquilo que constantemente desloca e transforma os seus próprios termos e até o seu próprio campo, mas só poderá existir se, em cada instante, se apoiar numa organização provisória do campo". Que tal este compasso para a " dança "? Que dizes(m) a montarem um comité contra a videovigilância na Baixa de Lisboa? Não será um campo fértil para ensaiarem a teoria crítica global desta sociedade que faz da desigualdade e da hierarquia o seu nec plus ultra repressivo e alienante? Niet

Miguel Serras Pereira disse...

Um pouco ao lado do meu post, a proposta de sabotagem da videoviglância, demasiado específica para uma plataforma… Mas interessante, sem dúvida. Quanto a mim, que vivo longe da Baixa, apoio qualquer iniciativa inteligente nesse sentido, mas só poderei participar nela como franco-atirador esporádico…

Salut et liberté

msp

André Carapinha disse...

Estando de acordo com o princípio, a verdade é que não se pode comparar a prática de ambos os partidos, PCP e BE, quanto à vontade em romper com o sectarismo e encontrar pontes: o BE já é, na sua génese, um compromisso entre forças de diferentes origens, e a verdade é que tem feito um esforço para estender o campo de uma alternativa de esquerda para a esquerda do PS. A desastrada aposta em Alegre, se foi um falhanço total na análise tanto das circunstâncias como da própria personalidade de Alegre, não deixa de se inscrever nesta linha, e essa é, ainda mais, uma das grandes tragédias desta derrota, já que além de reduzir a cacos a ala esquerda do PS, enfraquece o Bloco, também quanto à possibilidade de fazer alianças com essa tal ala esquerda (a partir de agora, e durante muito tempo, sempre que tal possibilidade existir, todos se vão lembrar do falhanço destas presidenciais). O PCP, pelo contrário, é um verdadeiro bastião do sectarismo, e estará disposto a todas as alianças desde que estas sejam sempre sob a sua capa, e apenas com essa condição.

Com certeza que a intervenção deve passar também por outro tipo de estruturas que escapem aos partidos tradicionais, agora, no meu caso, nunca desprezarei o papel dos partidos na criação de alternativas viáveis, sublinho o viáveis, que permitam, pelo menos, alguma forma de resistência à selvajaria que nos aguarda ao virar da esquina. E para isso, lamento, o melhor é não contar com o PCP, aliás, melhor seria que desaparecesse de vez (wishful thinking, apenas, não me parece que isso vá acontecer nos tempos mais próximos).

Niet disse...

MS Pereira: Entendes que não é possível estabelecer um movimento político-anti-burocrático por excelência, claro-a partir de um comité de luta alargado contra a instalação da videovigilância na Baixa? Como é que se desencadeou a Revolta Húngara de 1956, a da Polónia em 58,o rastilho de Maio 68 em Paris, as manifestações de Tunis em 2011? Preferes um Clube Político?!? Niet

Miguel Serras Pereira disse...

Niet,
leste mal o que escrevi. Sim, um movimento de democratização radical pode e só pode nascer da acção visando transformar as condições existentes através da participação igualitária dos que as sofrem e serão levados a reproduzi-las e a continuar a sofrê-las enquanto não se auto-organizarem para se governarem de outro modo.
No que te respondi, creio não haver nada que contrarie esta ideia ou autorize a tua interpretação das minhas palavras como proposta de substituir pela direcção deste ou daquele clube ou estado-maior a acção comum e a vontade de igualdade e liberdade.
Entendidos?

Salut et liberté

Caro André Carapinha,

o meu ponto - que espero que reconheça e aprove - é que dentro ou fora dos partidos, sindicatos, etc. tradicionais, a construção de alternativas e mais democráticas de exercício do poder e de relação com as instituições passa pela criação desde já de formas alternativas de acção comum e de auto-organização democrática da acção; as forças que se batem pela democratização de que falo só podem fazê-lo democratizando o seu próprio regime de funcionamento (deliberação, decisão, elaboração de propostas, intervenção e iniciativa). O que não significa que possamos fazer tudo de uma vez ou instantaneamente. Mas significa que a transformação no sentido indicado exigiria uma transformação tão decidida e profunda dos partidos tradicionais, se estes não quiserem continuar a ser obstáculos do ponto de vista das alternativas, que os tornaria irreconhecíveis. Dito isto, concordo consigo em que a luta pela democratização do regime da acção comum presente tem, apesar de a evolução dos últimos anos no BE se ter orientado sobretudo no sentido oposto, condições mais favoráveis do que no PCP.

Cordiais saudações republicanas

msp

Niet disse...

A hipótese de criação de um movimento de democratização radical, meu caro,tem todas as hipóteses no terreno caso as adesões(deliberação) e participação se estruture com objectivos precisos e transparentes sintetizados temporariamente pelo colectivo criado ad-hoc para iniciar a luta, no justo sentido que Castoriadis dá à noção táctica de abertura! Falei em modelos históricos de grande impacto. Eu já tinha escrito no post do NR de Almeida que há hipóteses de esperança de transformação histórica com a geração que souber criticar a experiência que realizou nas fileiras do B.E...A instalação de um sistema de videovigilância na Baixa lisboeta é um processo político muito concreto e intolerável- ineficaz em resultados técnico-operativos como se sabe hoje por toda a Europa- e que visa a criar um suplemento repressivo no quotidiano das pessoas. Niet

Niet disse...

Errata: Onde há hipóteses substituir por chances, alternando; e a concordância verbal conjugando deliberação e participação - todo um processo!!!-implica o plural:estruturem! Fica a ressalva, pois. Salut! Niet