1. Nada mostra melhor os limites da concepção representativa de democracia de Daniel Oliveira do que o seu post sobre os "caloiros" do novo governo. Não há uma linha deste post em que, de uma maneira ou de outra, não se afirme que o governo deve ser confiado a políticos profissionais experientes e/ou que os governantes devem ter qualificações técnicas especializadas que os distinguem do comum dos cidadãos e os qualificam para o seu papel de condutores. O que é o mesmo que adoptar na íntegra o princípio da distinção entre governantes e governados, que a razão de Estado formula, e todas as suas consequências classistas e hierárquicas. E o mesmo que excluir esse direito de todos a uma igual participação organizada e regular nas deliberações e decisões que política e economicamente os governam pelo qual classicamente se define a democracia. Esta, com efeito, não é mais — nem pode ser menos — do que a universalização da participação governante no seu próprio governo através da qual Aristóteles definia a cidadania.
2. Uma limitação homóloga onera também a distinção que Boaventura Sousa Santos propõe — e me surpreende, apesar de tudo, que o Rui Bebiano celebre pondo de lado o sentido crítico que noutras ocasiões exibe — entre "luta pela democracia" e "anticapitalismo", ao declarar que "«neste momento a questão fundamental não é o capitalismo, é a democracia» e "a sobrevivência da democracia". Na realidade, se podemos dizer, como eu próprio tenho feito, que a vontade de democracia é mais ampla e fundamental do que o anticapitalismo, sendo este uma conclusão subsidiária — mas nem por isso menos necessária — da exigência de democracia, não vejo que sentido político possa fazer a oposição ou distinção entre uma coisa e outra, nos termos em que BSS a formula. "Lutar pela democracia", entendida, nos termos acima indicados, como recusa da divisão hierárquica entre as condições de governado e governante de cada cidadão, pondo entre parênteses ou deixando para mais tarde a exigência de democratização dessa instância fundamental do governo que é a direcção da economia e a organização do trabalho e do mercado, só pode significar, de facto, pôr entre parênteses ou deixar para mais tarde a conquista da cidadania governante — da participação igualitária e regular dos homens e mulheres comuns nas deliberações e decisões por que se governam - que é condição instituinte e necessária da própria democracia.
20/06/11
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3 comentários:
foste linkado no vida breve. e bem, acho eu
Saliento que BSS desafia o BE a substituir o anti-capitalismo pela "(...)defesa desta democracia(...)" (um pouco nates do minuto 8). Não por uma melhor democracia. É mesmo pela defesa deste logro em que vivemos e a que chamam democracia, a que BSS chama democracia. Mais à frente na entrevista, menciona umas ideias muito superficiais sobre como se poderia avançar na direcção duma verdadeira democracia. Mas toda a tónica é colocada na necessidade de defender o status quo. Torna-se claro que aquele famoso manifesto que assinou em conjunto com alguns ex-presidentes não foi um acidente, uma desatenção.
Tinha pedido, e o DO tinha-lhe feito um desenho. Escusava de fazer mais figuras tristes. Faça lá um esforço, e vá ler outra vez...
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