27/08/14

O ISIS e os outros muçulmanos

Ultimamente, têm surgido alegações que os "muçulmanos moderados" não condenam e/ou não se distanciam do ISIS.

Já muita gente desmontou essa conversa, dando exemplos de muçulmanos a protestar contra o ISIS e referindo que a maior parte das vitimas do ISIS são outros muçulmanos; mas eu iria ainda mais longe - não só a maioria esmagadora das vitimas do ISIS são muçulmanos, como quase de certeza que a maioria esmagadora de soldados do ISIS que têm sido mortos em combate têm sido mortos por outros muçulmanos: quem é que está a lutar contra o ISIS? Antes dos bombardeamentos norte-americanos, eram os exércitos da Síria, do Iraque, do Irão, do Líbano, e mais as milícias curdas e do Hezbollah, provavelmente quase todos muçulmanos (poderá haver muitos cristãos no exército libanês e alguns no sírio, mas de certeza que os muçulmanos são a maioria esmagadora do total das forças anti-ISIS).

Aliás, pode haver excepções, mas dá-me a ideia que essa conversa de que "os muçulmanos não condenam o ISIS" vem muitas vezes de pessoas que, em politica externa, defendem a linha "o que é preciso é ação, não basta palavras".  Mas neste caso, tudo se inverte - o que lhes interessa é que os outros muçulmanos emitam palavras condenando o ISIS, não interessando para nada as balas e bombas que há meses (ou anos, se contarmos com as organizações que lhe deram origem) os outros muçulmanos dirigem contra o ISIS.

Um caso que me parece particularmente desfasado deste argumento é este post de José Simões, onde o autor critica "os ayatollahs e os mullahs, sempre tão lestos com fatwas de cada vez que alguém escreve um livro ou desenha um cartoon, [que não] se lembram agora de publicar, urbi et orbi, uma"; se o autor tivesse falado em "imãs, sheiks e ulemas" ainda poderia fazer algum sentido - mas ir buscar nomes de autoridades religiosas especificas do xiismo ("ayatollah" é um título xiita; "mullah" não é especifico do xiismo, mas sendo um termo usado tipicamente no Irão, acaba por estar também mais associado ao xiismo) torna a coisa completamente sem sentido, já que o inimigo principal do ISIS são exatamente os xiitas e está mais ou menos comprovado que o Irão (um país governado pelos ayatollahs e pelos mullahs) tem tropas no Iraque a apoiar o governo de Bagdade contra o ISIS.

Finalmente noto que, quando há umas semanas, houve a intervenção norte-americana em defesa dos yazidis, não me parece que tenha aparecido alguém a querer aplicar-lhes o mesmo critério, exigindo que os yazidis moderados condenassem os atos dos yazidis radicais (e estamos a falar de uma religião que, antes dos últimos acontecimentos, praticamente só era conhecida no resto do mundo pelos "crimes de honra" em que alguns dos seus crentes se envolviam)

2 comentários:

Anónimo disse...

Muito bom.

Niet disse...

Miguel Madeira: O ISIS é uma falange minima! Até parece ser uma " tropa " paga pela Mossad, topa? De modo, claro, a arranjar pretextos para os USA e& Cia bombardearem a seu belo prazer. O " lote! absolutamente fabuloso de ouro negro a " capturar naquele triângulo de sonho, a este da Siria e nordeste do Iraque " justifica" todos os meios para levar a cabo a rapina. Salut! Niet