Não conheci pessoalmente o arquitecto Manuel Graça Dias. Não calhou. Trata-se, no entanto, de um dos mais marcantes arquitectos portugueses da minha geração. Pela sua obra, naturalmente, mas sobretudo pela sua capacidade de ler criticamente a forma como construímos as cidades em que vivemos. Gosto de muitos dos seus edifícios, do Teatro Azul em Almada aos edifícios de habitação social em Salgueiral, Guimarães, mas gostava sobretudo de o ouvir, nos programas de rádio e de televisão, e de o ler.
Graça Dias, mais que um arquitecto era um urbanista. Não porque tenha feito planeamento, planos directores, de urbanização ou de pormenor - desconheço se fez alguma coisa nessa área - mas porque era um homem profundamente apaixonado pela cidade. Tinha uma ideia clara e límpida sobre a cidade, sobre a sua complexidade e riqueza, e um enorme respeito pela diversidade dos seus construtores. Não fazia a hipervalorização do papel do arquitecto, antes pelo contrário, prestava uma atenção profunda aos saberes informais que se expressam nas nossas cidades, na forma como elas vão sendo construídas. Era um espírito aberto, pouco dado a corporativismos.
Mais do que um divulgador da arquitectura foi sobretudo, na sua geração, o mais importante divulgador da cidade, dos seus encantos e desencantos. Mais encantos, porque a cidade exerceu sempre uma enorme atracção sobre Graça Dias, logo desde a sua infância passada entre Lisboa e Lourenço Marques.
A entrevista que o Expresso recuperou a propósito da sua morte é uma entrevista dotada de uma frescura e de uma actualidade que sobreviveu à passagem do tempo. Vale a pena reler e ... pensar.
Numa cidade como Lisboa, na qual ainda se aponta o exemplo do Parque das Nações como o novo paradigma a seguir quando se fala em desenvolvimento urbano e reabilitação urbana, à margem de qualquer leitura crítica, Graça Dias colocou a nu as fragilidades e as contradições desse modelo urbano. Vale a pena ler, como vale a pena ler e reler o seu livro "Ao volante pela Cidade".
30/03/19
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