27/02/16

A importância do jornalismo de Investigação. O caso do "Sexta às Nove"

O jornalismo de investigação é uma raridade em Portugal. São cada vez menos os profissionais que se dedicam a esta actividade.  José António Cerejo*, no Público, é uma das referências desta actividade e, certamente, um dos jornalistas mais odiados pela classe política.
Este post é para falar de um programa da RTP1 que homenageia, todas as sextas-feiras, o serviço público que a estação deveria, mais vezes, prestar.
São vários os exemplos de temas e de situações que, sem o "Sexta às Nove", teriam continuado no esquecimento de que o programa os  recuperou para o debate público.
Ontem, mais uma vez, a equipa representada pela jornalista Sandra Felgueiras,  abordou um tema da actualidade - a prisão do ex-procurador, Orlando Figueiras, aparentemente corrompido pelo todo poderoso vice-Presidente de Angola -e dois outros que parece já terem dela saído, se é que algum vez lá estiveram.

O primeiro foi o tema da fome e da pobreza extrema, documentado pela situação dramática de uma família de Vila de Rei, a cerca de 100 Km de Coimbra.  Família que vive com menos de 600 euros mensais. Família fortemente afectada pelo facto de os membros do casal estarem ou inválidos ou gravemente doentes. Pessoas que não podem ir ao centro de saúde porque isso custa 80 euros. Que não podem comprar medicamentos porque o dinheiro não chega. Que não podem comer uma parte do mês, porque não se compra nada com 60 cêntimos. Gente assim, está ao abandono. As estruturas da solidariedade social, transformaram-se em máquinas de cobrar dinheiro - o máximo que conseguirem - e de pagar o mínimo que puderem, mesmo que mudem sucessivamente a lei para atingir esse objectivo.
Pouco mudou nessa cultura, se é que algo irá mudar. Vieira da Silva, na sua primeira passagem pelo sector, começou a construir essa máquina mais eficiente e mais desumana, que a direita radical aperfeiçoou. Aplaude-se a eficiência mas dispensa-se a desumanidade.
A pobreza extrema, a insensibilidade extrema do Estado que era suposto ser social, não acabaram com as últimas eleições. Os deputados eleitos, sobretudo os que suportam o Governo, têm muito trabalho para fazer. Pagamos-lhes muito bem para isso. Mexam-se. Estas situações têm solução no quadro de um País democrático, com uma Constituição que defende a dignidade da pessoa humana.

O outro tema foi uma das maiores vigarices do anterior Governo. A possibilidade de os sócios-gerentes das empresas passarem a beneficiar do subsídio de desemprego quando as empresas fecham.
O Governo legislou - julgo que terá existido unanimidade - e a Lei foi aprovada. Segundo revela a Confederação Portuguesa das Pequenas e Médias Empresas esta lei traduziu-se num bom negócio para o Estado, já que lhe permitiu arrecadar um acréscimo de 600 milhões de euros além do que estava previsto. E, ardilosamente, estabelecer um conjunto de "regras" que impedem quem quer que seja de receber, alguma vez, qualquer subsídio.
Basta ter alguma dívida à SS ou alguma dívida fiscal para que isso não aconteça. Algo inevitável para quem caiu na insolvência, diria o cidadão comum.  Basta que a empresa não apresente dois anos consecutivos de prejuízos para que o subsídio não seja atribuído. Uma sacanice, de Passos-Portas e Mota Soares, que tenderá a permanecer como eles o deixaram.
Um bom trabalho para deputados que além de capacidade para exercerem o voto electrónico ou o voto através de movimentos da cabeça, possam conseguir usar a própria para pensar.
É muito importante o jornalismo que a equipa liderada pela Sandra Felgueiras pratica. Num país em que deputados - e a classe política em geral - ascenderam ao limbo daqueles que se libertaram das pequenas dificuldades do dia a dia de todos os outros, é muito importante chamar-lhes a atenção para o facto de que, enquanto eles beneficiam do estatuto adquirido, há gente que, fruto das leis e das regras que eles criaram, são vitimas de injustiças várias e da inaceitável falta de honestidade do Estado, o tal que é suposto ser uma pessoa de bem.

* - Por um lapso inexplicável resolvi trocar o nome ao jornalista, chamando-lhe António José. As minhas desculpas e o agradecimento ao autor do alerta, cuja mensagem não é publicada, porque fica feita a alteração.

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