27/07/16

A tentativa de golpe no Labour. Militantes levam partido a tribunal.(actualizado)

Como se viu recentemente, com as eleições americanas, as oligarquias partidárias, mesmo dos partidos situados na ala esquerda, olham para os militantes como um constrangimento. De preferência organizam estruturas e procedimentos que visam "aliviar" os militantes de base, da cansativa necessidade de tomar decisões. Basta-lhes abanar a cabeça regularmente e submeterem-se a rituais de obediência aos poderes instituídos. A unidade é a palavra mágica que legitima o exercício do poder das oligarquias sobre as bases. Na práctica tratou-se de internalizar, no funcionamento dos partidos, a receita que a social-democracia europeia adoptou para promover a sua própria decadência e irrelevância: despolitizar o dia a dia dos cidadãos, deixando-os completamente "livres" para se dedicarem, com todas as suas energias, ao consumo. No caso dos partidos os cidadãos são substituídos por militantes.

Quando os militantes se revoltam e decidem apoiar um improvável candidato, a coisa pode complicar-se. Foi o que aconteceu com Bernie Sanders nos Estados Unidos. É aquilo que está a acontecer com Jeremy Corbyn no Labour.
Como aqui referi o golpe pelo controlo do Labour, a partir do grupo parlamentar maioritariamente hostil a Corbyn, arrancou logo após a vitória do Brexit. Num primeiro round o sector afecto ao Partido Parlamentar perdeu. Mas, como se costuma dizer, derrotados mas não convencidos. Inconformados com o apoio manifestado ao líder em todas as sondagens divulgadas, reuniram e tomaram medidas. Em primeiro lugar acharam Angela Eagle, a que primeiro se perfilou para desafiar o líder, demasiado conotada com as politicas que os militantes e simpatizantes detestam. Resolveram promover um outro candidato mais à esquerda, mais eficaz a invadir o eleitorado que apoia Corbyn. Alguém que pode até copiar, sem rebuço, o programa que o líder tem estado a defender e, ao mesmo tempo, com uma imagem mais jovem, eventualmente mais sedutora. O pequeno senão de ser um lobysta da indústria farmacêutica, pareceu-lhes coisa resolúvel. O facto de ter sido, até lhe acenarem com o poder, um apoiante de Corbyn, não os deteve.

Owen Smith foi o homem escolhido pelo Partido Parlamentar para derrotar o líder do Partido.
As sondagens continuam negativas para os desafiantes de Corbyn. Porque será?
Mas - nestas coisas de comportamentos partidários desafiadores de regras democráticas e violadoras do dever de tratar todos em pé de igualdade, o Labour parece ter sólidos pregaminhos - o Comité Executivo Nacional (NEC) do Labour decidiu que todos os militantes que aderiram ao partido em 2016 não podem votar. A menos que paguem 25 Libras. As reacções foram violentas já que, desde que Corbyn lidera o partido, sucedem-se as adesões e os regressos dos que até então estavam desiludidos com a liderança neoliberal de Blair e Gordon. Com esta decisão o NEC tenta impedir que 130 mil novos militantes possam participar na votação, ao mesmo tempo, dificulta a regularização da situação pela via do pagamento de uma taxa prevista nos estatutos. Nas últimas eleições essa taxa era de 3 Libras, registe-se. Agora passou a ser de 25 Libras. A coisa adquire tais proporções que muitos militantes decidiram colocar o partido em Tribunal. Assim mesmo. Exigindo que lhe seja reconhecido o direito a participarem. Corbyn defende esse direito e prometeu apoiar os militantes. De Owen Smith nem uma palavra.

Não é apenas o Partido Parlamentar que quer derrotar Corbyn. A maioria dos deputados trabalhistas votaram favoravelmente ao rearmamento da frota nuclear de submarinos. Cameron aproveitou a divisão no Labour para passar esta polémica medida ajudando a acentuar as divisões no Labour. Isso ajuda a perceber as declarações do ex-líder da Unite, que acusou o MI5, a CIA dos ingleses, de estar a lançar uma campanha negra para desacreditar Corbyn.

São invios os caminhos da democracia. São perversos os caminhos da partidarite e do tachismo. Por isso mesmo faz cada vez mais sentido defender a qualidade da democracia. Uma democracia de cidadãos em que o compromisso seja com a defesa dos seus direitos sociais e políticos, e não com a defesa dos lugares e das carreiras dos que ascendem aos lugares electivos.

ADENDA: O Supremo decidiu esta tarde -28.07.2016 - que não havia nenhuma ilegalidade na admissão de Corbyn como candidato à sua sucessão. Um membro do partido, em representação dos que se lhe opõem, tinha recorrido da decisão de que demos conta aqui. Uma vontade incontrolável de "banirem" Corbyn da liderança anima esta gente.

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