14/02/11

Bloco fragmentado

A posição do Daniel Oliveira (DO) sobre a anunciada moção de censura do Bloco de Esquerda sugere a existência duma fractura dentro da tendência maioritária no seio do BE. Fractura cujo aparecimento foi potenciado pelo apoio do BE à candidatura presidencial de Manuel Alegre. De um lado estão os que, como o DO, acham que o objectivo do BE deve ser o de tornar-se uma espécie de consciência crítica do PS, o CDS do PS, em princípio sempre disponível para coligar-se com o PS. Mas para que isso aconteça, precisam que o BE dê mostras de "moderação", e se quebre a desconfiança que existe entre militantes e dirigentes de BE e PS. E viram no apoio simultâneo de BE e PS a Manuel Alegre o meio ideal para quebrar essa barreira de desconfiança. Acham que no actual sistema político português a diferença ideológica fundamental é entre PS e PSD, e por isso pretendem que o BE se concentre em atacar antes de mais o PSD e CDS, estando dispostos a tudo (até apoiar José Sócrates) para impedir que PSD e CDS cheguem ao governo. O Tiago Mota Saraiva identifica mais alguns apoiantes desta linha de pensamento. Do outro lado, estão os que, como Francisco Louçã, acham que a diferença ideológica fundamental no actual sistema político encontra-se entre BE/PCP e o PS. Na sua opinião, o adversário principal do BE é o PS, obstáculo principal ao surgimento duma verdadeira alternativa de governo ancorada à Esquerda. Donde, estrategicamente o objectivo do BE é substituir o PS como partido eleitoralmente mais forte à Esquerda do PSD/CDS. Viram no apoio a Manuel Alegre uma excelente oportunidade de dividir e enfraquecer o PS, que não surtiu todos os efeitos desejados porque o PS percebeu o perigo que corria e relutantemente decidiu apoiar Manuel Alegre.

1 comentários:

joão viegas disse...

Gostei da reflexão. Eu sou um zé-ninguém pragmatico, não pertenço ao PS nem ao Bloco e voto, consoante, num ou noutro. Julgo que isso me habilita ao estatuto de eleitor alvo para a ala reformista não-folclorica do Bloco, e também para a ala esquerda do PS.

Gosto de olhar para os problemas de forma inteiramente pragmatica, sem atenção às pessoas ou àquilo que você chama "ideias" e que se me afigura ser bastante mais proximo de "fantasmas".

Tudo bem espremido, o que você diz é que a tendência de fundo do BE é, ou devia ser, procurar fazer com que o PS governe à esquerda.

Mas se assim é, o dilema que v. coloca é falso : se o PS não governar, também não vai governar à esquerda, por hipotese... E com certeza que nem o PSD nem o CDS o vão fazer por ele.

Surge depois o medo de ceder para o "centrão". Não ha que ter medo, que diabos. Qualquer pais, incluindo a URSS de Lénine, tem sempre que ceder ao centrão, da mesma forma que o navio tem de contar com as aguas em que navega. Esta questão é perfeitamente secundaria : nenhum capitão se avisa de dizer : meus amigos, não podemos fazer nada, ou estamos a correr para a catastrofe, porque estamos a navegar na agua !!!

Portanto, do meu ponto de vista, a questão é apenas de medir os resultados : quanto mais o BE aparece com traços focloricos de guerrilha aspirando a impossibilidades, mais ele tem como efeito concreto empurrar o PS para a direita e demovê-lo tomar de medidas de esquerda. A situação que resulta das ultimas eleições (legislativas, claro, as presidenciais são mero folclore que so se justificam porque antes isso do que um PR com poderes) corresponde a esse cenario.

Em contrapartida, quanto mais o BE é pragmatico, pronto a bater-se por objectivos realizaveis, mais obriga o PS a ceder-lhe terreno e a tomar medidas decentes (quero dizer de esquerda).

Gostei da formula : o BE deve ser o CDS da esquerda. Digo mais, o BE não deve aspirar a ter um primeiro ministro. O sonho mais elevado do BE devia ser ter um ministro do trabalho, ou melhor ainda, um ministro das finanças. Um Bagão Félix de esquerda !

Gostei.