Vivemos tempos difíceis, em que se conspira mais ou menos abertamente para pôr os trabalhadores a pagar a crise e a os custos do relançamento da economia capitalista. Tempos em que estratégias, tácticas, organizações, programas e concepções de política são postos à prova quotidianamente. Tempos em que o medo alastra e a única solução, para muitos, é emigrar. Tempos em que o espaço noticioso se vê integralmente coberto pelo discurso obscurantista e socialmente regressivo, que atribui a quem trabalha a responsabilidade pelo estado em que estamos e repete sem qualquer prurido que vivemos acima das nossas possibilidades. O tempo está bom para ser impaciente, precisamente porque a paciência tem sido o mais duvidoso dos nossos méritos. Duas, três, muitas acrópoles, podem bem ser o programa mínimo para quem queira mudar as coisas.
Se isto chegou onde chegou, não o devemos apenas ao cinismo de Sócrates, à maldade de Passos Coelho ou à ganância do poder financeiro e dos grandes grupos económicos. Atribuir as causas das nossas dificuldades às patifarias dos poderosos pode servir de consolo momentâneo, mas não nos tira do buraco onde estamos. As causas da nossa situação devem ser procuradas em nós e as nossas fraquezas identificadas nas nossas escolhas. Nesse sentido, a constante emergência de homens providenciais a propósito das eleições presidenciais é um péssimo sinal. Só a nós compete enfrentar a situação e invertê-la.
É por isso que a convocatória que aqui publiquei me parece ser um excelente contributo para uma resposta política e social a esta pilhagem organizada. E que os argumentos do Nuno aqui desenvolvidos me parecem injustificados.
Quem disser que tem neste momento uma solução mágica para todos os nossos problemas estará a mentir. Mas quem prefere ignorar que os nossos problemas começam na própria forma como conduzimos as nossas lutas faz o pior dos serviços.
Para que isto mude, é necessário correr riscos, experimentar, testar, errar e fazer o balanço dos erros, cair e voltar a levantar-se. Tudo menos a imagem pacificada de pessoas que protestam ordeira e previsivelmente para regressarem ao trabalho na 2ª feira com a consciência tranquila, por terem dado o derradeiro contributo para a luta por um mundo melhor. Arrumados, enquadrados e bem comportados, para que tudo fique estranhamente da mesma maneira. Hoje, perante esta cuspidela atirada à cara de todos nós, o pior que poderíamos fazer seria precisamente fazer o mesmo de sempre. E é precisamente porque estou com a luta que acho que não estamos a lutar da melhor maneira.
3 comentários:
http://www.youtube.com/watch?v=V7JXlmE60r0&feature=player_embedded
Abraço,
Patrick
Ricardo
Subscrevo o essencial do que tem vindo a dizer.
Penso apenas ser necessário que, sendo a própria realidade a mostrar aos cidadãos a falência cada vez mais evidente do sistema, a par da afirmação disso se avance também, de forma mais concreta, relativamente ao essencial do que se propõe como alternativa.
Como ideia geral, o enunciado de uma "cidadania governante" seduz-me. Mas parece-me ser necessário desenvolver essa ideia. Para que os cidadãos se possam mobilizar não apenas em nome do que não querem, mas principalmente em nome de uma alternativa concreta e credível. Pelo menos nas suas linhas mais gerais.
nelson anjos
Claro Nélson. Mas não me parece que exista um momento em que se constrói a alternativa que possa ser desligado de todos os outros momentos.
Parece-me, pela minha experiência modesta, que cada luta/conflito/processo levanta problemas que nos desafiam e que apontam no sentido de qualquer coisa como uma alternativa. De resto, colóquios/encontros/congressos dedicados a elaborar programas brilhantes podem ser encontrados com fartura, mas não consta que tenham produzido qualquer transformação digna desse nome. Não que as ideias e os objectivos não sejam importantes, simplesmente têm que surgir precisamente a partir de lutas e mobilizações como esta.
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