26/05/11

Querem perceber como é que o PP até é capaz de cumprir o objectivo de ter mais votos do que o Bloco e a CDU somados?

Ouçam hoje a TSF, com um dossiê sobre a "pobreza e exclusão social". E ouçam Paulo Portas a disparar sobre o microfone uma arenga destinada a convencer os papalvos da dedicação da sua trupe a outra causa que não seja o auto-enriquecimento: com propostas concretas, entendíveis pelo eleitor médio, quase convincentes.
Jerónimo, por oposição, decidiu dar razão ao estereótipo da esquerda irrealista e simplista: para acabar com a pobreza basta... aumentar os ordenados. Pronto; dinheiro para todos e acaba-se a miséria. Assim, sem mais nem menos, a milhas do relambório de promessas articuladas, com ar fazível, do homem dos sobreiros e das fotocópias. Menorizando a inteligência e as preocupações dos ouvintes, por certo menos interessados em magia do que em soluções concretas.
Se até no campo da melhoria das condições de vida dos mais fracos conseguimos fazer esta ineficaz figura, se calhar é mesmo merecido que o PP consiga atingir aquele seu objectivo.
Pode ser que no dia 6 de Junho apareça alguém decidido a aprender com asneiras como esta. Embora duvide um pouco disso.

11 comentários:

Anónimo disse...

Concordo com a observação e acrescento:
não seria possível que a esquerda fosse avançando com as propostas passo a passo, sem ter que ir cortando as hipóteses de o que quer que proponha ser rejeitado como um todo? Por exemplo, eu acho que a defesa da auditoria da dívida é de algum modo mais facilmente aceite e aceite por mais gente do que a sua renegociação. Que a renegociação da dívida é mais facilmente maioritaria do que a nacionalização da banca e programas de relançamento Keynesianos. É preciso apresentar sempre tudo interligado? Não se corre o risco de se perder batalhas por querer entrar em todas as guerras ao mesmo tempo?

Rui Santos (eu li e concordo com a Declaração da Conferência de Atenas há dias apresentada)

Luis Rainha disse...

Rui,

Precisamente. Não me passa pela cabeça sequer sugerir qe o PCP não tem propostas. Mas ignorá-las e substituir tudo por uma espécie de pensamento mágico, com tudo reduzido a um só argumento... isso é que não serve. Sobretudo aos microfones da TSF.

LAM disse...

Com outro pormenor que daí decorre: Portas apresenta-se como mais que provável membro de um futuro governo, logo alguém com posição para poder concretizar (por mínimo que seja, é melhor do que nada, pensarão), algumas das preocupações dos excluídos. Ao contrário, o tudo ou nada apresentado por algum tipo de discurso de Bloco ou CDU, se bem que coerente ideologicamente, demite-se de dar respostas que os eleitores considerem exequíveis no curto/médio prazo e, não menos importante, tornaram-se cartas fora do baralho da agenda política institucional nos próximos tempos, sem capacidade de, por essa via, influírem no que quer que seja.

(continuo a achar que a auto-exclusão de Bloco e CDU de qualquer conversa, nem que tivesse sido apenas para a fotografia, com a troika do FMI foi um tiro no pé que remeteu esses partidos para o papel de apanha bolas nas matérias que agora estão em causa.)

Anónimo disse...

Mesmo simplificando, e embora a amanhã não ajude, não vejo como se combata a pobreza fora de duas grandes alternativas:

- ou pelo crescimento económico,maior qualificação das pessoas, menos desigualdade na distribuição dos rendimentos e melhores salários e pensões;

- ou por um improvávelmente reforçado assistencialismo, mais ou menos caritativo, do Estado, da Igreja ou e dos bancos da fome.

Escusado será dizer que, para mim, a primeira alternativa é a única compatível com a dignidade plena dos seres humanos.

Anónimo disse...

Vítor Dias,

a questão (no meu ponto de vista) é mais de estratégia de apresentação das propostas, para além de existir uma certa autonomia de umas relativamente às outras, do que uma simples escolha entre as duas propostas que apresenta.
Explicando:
- imagino que alguém minimamente democrata, esclarecido, não comprometido com uma agenda neoliberal, aceita mais ou menos pacificamente a possibilidade de uma auditoria da dívida - forma da sociedade civil ter conhecimento real do que vai ser pago, quanto, em que termos, a quem.
- imagino igualmente que essas mesmas pessoas podem até aceitar e defender uma espécie de frente comum dos países endividados do sul da Europa (Greçia, Portugal, Irlanda, Espanha) para reestruturar as dívidas de cada país.

Se pelo menos estas duas ideias num primeiro momento fossem aplicadas pelo menos (e talvez pela primeira vez) poder-se-ia ver mais pessoas em Portugal e na Europa a acompanhar e a tomar consciência de como se cria uma dívida, em que medida ela foi fruto do Estado Social ou se de um Estado que nacionaliza bancos falidos.

Quanto ao resto - implementação de políticas redistributivas, de pleno emprego, combate às desigualdades sociais(que eu defendo igualmente) parece-me muito mais difícil de conseguir - por agora pelos menos -maiorias sociais que as aceitem, isto é, que aceitem sem ver isso como um lirismo revolucionário e radical (em que a palavra radical tem sempre uma carga negativa).
Até porque isso tem outras implicações de âmbito europeu.
De algum modo parece-me a situação actual permite trazer mais pessoas - normalmente afastadas do debate político - a que formem uma consciência social. E isso é muito importante, e um debate e um rediscutir da dívida tem esse aspecto funcional fundamental.

Rui Santos

LAM disse...

Sem dúvida, Vitor Dias.
O problema é que esses eleitores acreditam mais facilmente como viável no curto prazo, atendendo até ao quadro insistentemente pintado pelos dirigentes, figuras e figurões da direita e órgãos de comunicação atrelados, num tipo qualquer que seja de assistencialismo caritativo, do que na concretização, no imediato ou médio prazo, das condições necessárias que aponta para erradicar a pobreza e a exclusão. Nas circunstancias atuais e quando as perspetivas apontadas indiciam até retrocesso, (por exemplo na desigualdade de distribuição de rendimentos), é muito difícil que os partidos de esquerda ampliem a votação para lá do voto ideológico.

A precariedade é tal,e em cada vez mais amplos sectores sociais, que não pode ser tratada em termos de perdas de benefícios como o são outras classes (professores, FPs, etc) que, apesar de muitos males, ainda vão tendo prá sopa. E o P. Portas sabe isso.

vítor dias disse...

Tudo visto, até agora dos comentários posteriores ao meu não vi ninguém contestar o bom senso das minhas observações.

Parece portanto que, ao contrário do Luís Rainha, ninguém viu nenhum especial escândalo em Jerónimo de Sousa ter falado da necessidade do aumento dos salários para sair da pobreza.

LAM disse...

Não é uma questão de escândalo, é uma questão de propostas que esses eleitores (pq agora de eleitores se fala), vejam como concretizáveis e, o partido(s) que a propõe, com aceitação institucional para a fazer cumprir. Não sendo assim, esticamos mais o sonho e aderimos à proposta do candidato Vieira de um Ferrari amarelo para cada português.

Anónimo disse...

L.A.M. fala tranquilamente de « é uma questão de propostas que esses eleitores (pq agora de eleitores se fala), vejam como concretizáveis e, o partido(s) que a propõe, com aceitação institucional para a fazer cumprir».

A L.A. M. não lhe passa pela cabeça reflectir sobre se a cabeça desses eleitores por acaso funciona em redoma fechada ou é imune à ideologia dominante e correspondentes e impostos critérios de avaliação e juízo político.

Por fim, L.A.M. imprudentemente não põe a hipótese de que parte grande desses eleitores só vejam como «concretizáveis» e com «aceitação institucional»
algo igual ao semelhante ao que aqui nos conduziu.

Luis Rainha disse...

Vítor,

Claro que o aumento dos rendimentos, da riqueza, seria a panaceia universal para a pobreza em Portugal. Quem contestou isso?
Mas limitar a apresentação de soluções a esse desejo é pueril e ineficaz. Os eleitores esperam mais e acabam por o ter... de Paulo Portas. O contraste não podia ser mais cruel: a direita a propor respostas, soluções, medidas imediatas; a esquerda perdida em truísmos sonhadores. Assim não vamos a lado algum!
É como falar dos problemas do SNS afirmando que eles acabarão quando todos tivermos mais saúde.

LAM disse...

Vitor Dias,
Tudo antes pelo contrário do que responde. Ou eu não me soube explicar no comentário anterior, ou o Vitor neste último baralha o que digo.
Como diz o post do Luis Rainha, Paulo Portas está a cativar sectores que deveriam ser quase unanimemente atraídos pelas propostas da esquerda. Falha passar a mensagem, ou falha adaptar as propostas a algo que esses eleitores vejam, no momento presente e próximo futuro, como propostas atingíveis?
Resumidamente o meu ponto é este, o que o Luis Rainha bem traduz no comentário acima.