24/12/10

Afinal, o que é que dizem as agências de "rating"?

Nos últimos dias tem-se falado das agências de rating terem voltado a descer a classificação de Portugal, com uns a dizerem "estão a ver como temos que fazer mais sacrificios?" e outros "continua a chantagem dos mercados sobre os estados soberanos" (provavelmente ninguém disse isto textualmente, mas muita gente terá expressado pensamentos equivalentes.

Mas, afinal, o que é que as tais agências dizem que pode correr mal na economia portuguesa?

Vamos lá ver a Moody's (via Finantial Times):
The main triggers for the review include:
(1) Uncertainties about Portugal’s longer-term economic vitality, which will be exacerbated by the impact of fiscal austerity;
(2) Concerns about Portugal’s ability to access the capital markets at a sustainable price; and
(3) Concerns about the possible impact on the government’s debt metrics of further support for the banking sector, which may be needed for the banks to regain access to the private capital markets.
 E a Fitch (também via FT):
“A sizeable fiscal shock against a backdrop of relative macroeconomic and structural weaknesses has reduced Portugal’s creditworthiness,” said Douglas Renwick, Associate Director in Fitch’s Sovereign team…

The downgrade reflects significant budgetary underperformance in 2009. The general government deficit in that year was 9.3% of GDP, versus 6.5% of GDP forecast by Fitch last September…

The Negative Outlook reflects Fitch’s concern about the potential impact of the global economic crisis on Portugal’s economy and public finances over the medium term, given the country’s existing structural weaknesses and high indebtedness across all sectors of the economy. Portugal’s GDP per capita and trend growth are significantly below the ‘AA’ median, which reduces debt tolerance relative to other high-grade sovereigns.

(...)

Fitch considers the government’s recently-announced consolidation plans to be broadly credible, incorporating a high level of detail underpinning a largely expenditure-based adjustment and reasonable macroeconomic assumptions. It builds on a track record of public wage bill reduction over 2005-2008 and significant achievements in public pension reform.

However, the planned deficit adjustment is back-loaded and the risk of macroeconomic disappointment (with knock-on effects to the deficit) is significant, particularly in the latter years of the government’s projections (2012-13). Further fiscal and/or economic underperformance in 2010 and 2011 could lead to another downgrade…
Ou seja, parece que os problemas que as tais agências de rating vêm na economia portuguesa até não têm a ver principalmente com "despesa pública excessiva" (nomeadamente no "Estado Social"), como se poderia pensar pelo que dizem os comentadores que costumam aparecer na televisão.

Pelos vistos, os problemas são:

  • Possibilidade de agravamento da recessão (e portanto redução da receita em impostos), perigo esse que está a ser aumentado pelas politicas de austeridade
  • Possibilidade de o Estado ter que gastar ainda mais dinheiro em apoios à banca
  • Aumento dos juros que o Estado paga pela dívida (diga-se que este aspecto é largamente circular - se o aumento dos juros está a por em causa as contas públicas, é também a ideia que o país corre risco de bancarrota que está a fazer subir os juros; ou seja, quando as agências de rating baixam o rating dum Estado dizendo que a sua situação vai piorar devido ao aumento dos juros estão a fazer uma profecia auto-cumprida: em grande medida é exactamente essa descida do rating que vai provocar a subida dos juros)
Já agora, por vezes há quem distinga entre a situação da Irlanda e de Espanha, por um lado, da de Portugal e da Grécia, por outro, dizendo que irlandeses e espanhóis o que têm é um problema nos bancos e que antes disso os orçamentos até iam bem, enquanto que Portugal e a Grécia tem mesmo um problema de despesismo estatal. Mas, pelos vistos, Portugal não está assim tão diferente da Espanha ou da Irlanda - pode não ter gasto ainda muito dinheiro a salvar bancos (ou se calhar já está a gastar, só que ninguém viu...), mas a expectativa de ter que, no futuro, ir gastar esse dinheiro está a assustar "os mercados" e a aumentar o risco do Estado português; como o risco de Portugal aumenta, aumenta a taxa de juro paga e a dificuldade em conseguir empréstimos; para compensar isso, o Governo corta no subsídio de desemprego e no abono de família e agrava a recessão; ou seja, já estamos a contribuir para a  família Espírito Santo e para lá quem for que sejam os donos do BCP, mesmo que não tenhamos consciência disso.

2 comentários:

Anónimo disse...

muito bom

Anónimo disse...

e tudo isto feito por um partido socialista, é de bradar aos céus. Talvez as pessoas de esquerda devessem pensar na inutilidade de ter um partido como o ps no poder.