20/12/10

No mínimo, bufo

Óscar Mascarenhas, no JN:

Ninguém, mas ninguém mesmo, se esquece de quando foi obrigado a ir à PIDE: fica na memória para sempre. É que esta, para mais, foi uma declaração presencial, certificada na hora pelo chefe de brigada da Pide e por isso dispensada de reconhecimento notarial. Tem ele o despudor de dizer que não se lembra? Abram a ala VIP da psiquiatria, por favor!

A mentira (ou doença incurável do candidato) tornou-me mais atento. O que me chamou mais a atenção foi a anotação final, num espaço de preenchimento facultativo, a dizer que «não priva» com a segunda mulher do sogro, dando o nome completo da senhora.

Ah, isso é demais - e nada tem a ver com «tentativas de o ligar ao anterior regime», como Cavaco se lamuriou. Nada! A ligação é só à sua têmpera, à sua capacidade ou não de enfrentar situações difíceis. Toda a gente de bem que conheci, desafecta ou mesmo afecta ao salazarismo, respeitava este princípio: à polícia (e então à secreta!) só se diz o mínimo. Era questão de fidalguia, de sobranceria, de desprezo. Não era exigido a Cavaco que escrevesse o nome da segunda mulher do sogro e muito menos que declarasse que não privava com ela. Qualquer um com dois dedos de siso saberia que isso iria pôr a PIDE de sobreaviso contra a senhora - ou então queria mesmo denunciá-la.

Cavaco não seria tão reles: apenas estaria tão tremeliques que escreveu até o que não queria, coitado. E logo ele que diz que há palavras de mais na política. Lá sabe do que fala, quando falou, à PIDE, do que não devia ter falado.

Nota: A Joana Lopes também mete os pontos nos ii sobre o tema. Quanto ao “documento”, ele pode ser consultado aqui.

(publicado também aqui)

1 comentários:

Miguel Serras Pereira disse...

Nem mais, muito caro camarada João Tunes.
E o Óscar diz também o essencial, corroborando a leitura da nossa amiga Joana. Mas, já que aqui estamos, aproveiro, para sobre o mesmo assunto, recomendar também a leitura do post do Miguel Cardina: "A pulsão da vidinha" (http://arrastao.org/2114413.html).
Por fim, como eu próprio escrevi num comentário, na caixa do post da Joana: "Num regime de ditadura, vir denunciar como (politicamente) infrequentáveis ou pouco recomendáveis relações familiares cujo comportamento as autoridades possam ter por menos correcto é, pura e simplesmente, abaixo de cão". E, neste caso, o resto - desculpas, justificações, invocações de contexto, etc. - são cantigas.

Abraço solidário

miguel sp