21/06/16

Re: A ilusão da esquerda com o Brexit

N'O Insurgente, Carlos Guimarães Pinto escreve que:
Anda por aí algum entusiasmo entre a esquerda portuguesa perante a possibilidade de uma saída do Reino Unido da União Europeia permitir mais desvarios internos. Esse entusiasmo resulta de uma fraca compreensão da origem da insatisfação de alguns países do norte europeu com a União Europeia.  (...) 
Se o Reino Unido sair da União Europeia, a União Europeia fará tudo para manter os países escandinavos (os próximo na fila para saír – ver aqui,aqui, e aqui) satisfeitos. Convencê-los a ficar não passará por mais benevolência com os países do sul, com mais atirar de dinheiro dos contribuintes desses países para as contas públicas da Grécia e de Portugal. Será precisamente o oposto. A União Orçamental, já hoje politicamente improvável, passará a ser impossível.
Para falar a verdade, não me parece que haja mesmo esse grande "entusiasmo entre a esquerda portuguesa" com o Brexit. Mas vamos deixar isso de lado - qual serão os efeitos de um eventual Brexit sobre a austeridade?

Eu suponho que os efeitos a curto prazo e a longo prazo serão diferentes, de certa forma de sinal contrário: por um lado, um principio de desagregação da UE vai tornar mais difícil avançar para a tal união orçamental; mas, por outro, acho que vai também tornar mais improvável que a Comissão levante multas e processos contra os países com deficit excessivo - basicamente, acho que o resultado de um Brexit vai ser paralisar os órgãos dirigentes da UE, levando-os a querer fazer o mínimo de ondas possível, com medo de desencadearem mais um -exit.

Parte desta diferença de efeitos a curto e longo prazo resulta da natureza da atual política europeia - neste momento, a UE têm uma política de ingerência ativa a favor da austeridade (com limites ao deficit e processos - frequentemente simbólicos - contra os países com grandes deficits); a longo prazo, o que os anti-austeritários querem é uma politica de ingerência ativa a favor do expansionismo orçamental (com eurobonds ou coisa parecida), mas a curto prazo o que querem é uma redução da ingerência pró-austeridade (no caso português, o objetivo imediato é que não haja multas por causa do deficit de 2015) - ou aquilo que os socialistas europeus têm chamado "leitura inteligente do Tratado Orçamental". Ou seja, algo que leve os dirigentes europeus a terem medo de decidir seja o que for beneficiará a curto prazo o campo anti-austeridade, mesmo que o prejudique a longo prazo.

Uma nota - poderá-se contra-argumentar que a compra de dívida pelo BCE desmente a minha descrição de que "neste momento, a UE têm uma política de ingerência ativa a favor da austeridade"; mas refiro-me sobretudo à Comissão e ao Conselho, que são os órgãos mais abertamente políticos (de qualquer maneira, imagino que, mesmo no que diz respeito ao BCE, neste momento a política de "não fazer ondas" e não decidir nada seja exatamente manter o "quantitative easing" como está a ser praticado).

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