O post anterior com título homónimo mereceu comentários que não comento porque falam por si e são suficientemente respeitáveis, até nas suas derrapagens. Gostando de polémicas, não gosto de entrar naquelas em que, pela argumentação no contraditório, procuram atribuir-me o papel de idiota de serviço.
Regresso ao tema apenas porque me escapou no post anterior um importante dado de contexto da declaração de MA. Há pouco tempo (sirvo-me de relato lido na imprensa), MA foi convidado para um debate numa assembleia de oficiais (no activo ou na reserva) das Forças Armadas (não registo de memória as organizações que promoveram o debate). Logo de entrada, um almirante que devia estar na mesa a representar a Marinha, recusou-se a sentar-se ao lado de MA para poder interpelá-lo a partir da Assembleia. O debate, animado pelo tal almirante e pelo coronel aviador Brandão, um activista da extrema-direita militar, secundado por outros que tentam recuperar a gesta militar da guerra colonial como património patriótico, resumiu-se a um massacre do convidado tendo como plataforma comum de ataque exactamente a adopção do boato de que MA tinha sido um desertor das Forças Armadas e colocando assim o aspecto formalmente contraditório de MA “ex-desertor” aspirar a ocupar o cargo de comandante supremo das Forças Armadas (inerente ao de Presidente da República). O que evidenciou, para MA, a consistência do efeito da difusão do boato (de que os “comentários” na internet têm sido um veículo privilegiado) pela sua repetição constante e que a transformou em “verdade adquirida”. Não tendo procuração de MA nem conhecendo as suas motivações concretas no esclarecimento do seu passado militar feito no seu site, julgo que esta vivência concreta do nível de difusão e eficácia de uma falsidade sobre o seu passado, foi a gota de água que o levou a dizer “basta” e invocar o direito de proceder judicialmente aqueles que insistirem em falsificarem o seu passado sob intuito difamatório. Do meu ponto de vista, com todo o direito e toda a razão.
Adenda (em 20/5/10):
Transcrevo da revista “Visão” publicada hoje um pequeno excerto da entrevista com Manuel Alegre:
P – Reparou nas críticas que lhe fizeram por estar, implicitamente, a censurar a opção pela deserção que muitos tomaram, nos anos sessenta, ao publicar a sua folha militar?
R – Não! A deserção era perfeitamente legítima. Não pretendi condenar. Simplesmente, eu não desertei. É uma situação de facto. A deserção era uma das formas de luta contra o regime. Só que eu não a utilizei.
P – Na altura, pensou em desertar?
R – Não. Discuti esse problema, mas por razões pessoais nunca pensei desertar. Mas anda aí uma campanha, numa grande impunidade, porque a internet permite a calúnia e a maldade, já que não sou eu o visado, é a resistência antifascista. Querem ilegitimar a resistência, a voz da liberdade. Era o que faltava!
13/05/10
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3 comentários:
Caro João Tunes,
Correndo o risco de, apesar de ser companheiro de blogue e de outras frentes de luta não obter resposta, quero esclarecer alguns aspectos.
- Primeiro um que nada parece ter a ver com a conversa, mas por acaso até tem: para mim, o qualificativo «caro» significa admiração, amizade, carinho, e não o uso para dizer a alguém «meu caro Sr. Almeida, você é um pulha». Para mim, se é pulha, não é «caro». Foi isso que quis dizer noutra conversa.
- Outro aspecto: todos os comentários que constam do post anterior, que eu saiba, estão no registo da franca discordância entre pessoas que têm alguma confiança entre si. Não vi quem quer que fosse a fazer o outro de idiota. No que me toca não aceito é transformar qualquer conversa informal, como a dita, num «combate de chefes».
- Último aspecto: eu percebo esse dilema do Manuel Alegre, aceito que tenha preocupações tácticas, e conheço suficientemente o meio militar (não só por ter sido militar, mas por ter sido consultor civil de um organismo da área durante uma boa dúzia de anos) para saber que o labéu de «ex-desertor» cria engulhos. Nada tenho contra o facto de Alegre procurar repor a verdade perante situações concretas. Mas o que disse, e com o estardalhaço que disse, acaba por afrontar implicitamente os desertores: ora isso toca directamente a honra (falemos então nestes termos) de muitos portugueses. A minha também, por exemplo. E quem não se sente…
- Adenda: já o disse, mas repito, que nada disto me faz retirar o apoio que dei publicamente a Manuel Alegre (se calhar até fui dos primeiros a fazê-lo na blogosfera fora do circuito do MIC), mas também não passo cheques em branco a ninguém.
Um abraço,
Rui
Esqueci-me de um aspecto importante: por que motivo um ex-desertor, e por isso «traidor» para a casta militar, não pode ser formalmente CEMFA? O regime é outro, felizmente. Por esta lógica, Havel ou Walesa nunca teriam chegado a PRs lá do sítio. Soares, Sampaio, iriam quase pelo mesmo caminho...
Caro Rui Bebiano,
MA apenas exerceu o direito que qualquer cidadão tem de que não permitir que digam de si o que não é nem foi. E não vejo que tivesse obrigação de estender essa declaração anexando-lhe juízos sobre opções e trajectórias diferentes. Aliás, não tendo desertado, MA, enquanto integrava a FPLN, apoiou os que desertavam da guerra colonial pois, como se sabe, os que desertavam no teatro de guerra e se entregavam aos guerrilheiros, estes, se fosse essa a sua vontade, entregavam-nos em Argel à FPLN. Eu ouvi várias emissões da RVL com entrevistas de MA a alguns desses desertores.
Mas se MA não produziu juízos de valor sobre opçóes diferentes das suas quanto à guerra, o mesmo não me parece da sua posição. Estarei enganado se disser que vc hierarquiza as posições face à geurra colonial, colocando como única "posição justa" a sua, a de deserção prévia à ida para a guerra? E que foi isso, apenas isso, que o irritou em Alegre?
Abraço.
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