29/11/10

O programa da "Aliança de Esquerda Unida" irlandesa

Um dos nossos leitores teve a gentiliza de traduzir o programa da nova aliança de partidos de esquerda irlandeses:

PROGRAMA DA ALIANÇA ESQUERDA UNIDA (IRLANDA): PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA ALTERNATIVA POLÍTICA REAL

A crise económica tem-se traduzido num ataque sem precedentes ao nível de vida dos irlandeses, criando uma espiral de desemprego em massa e aumento de pobreza. Entretanto, tira-se milhões a quem trabalha para se dar a banqueiros e especuladores internacionais.

A recém-criada ULA (United Left Alliance) opõe-se à política de bailout e cortes orçamentais, políticas que pioram a crise. Nas eleições legislativas, temos por objectivo fornecer uma alternativa real aos partidos do sistema, bem como o Labour e o Sinn Fein, que também aceitam o capitalismo e se recusam a descartar a hipótese de se coligarem com partidos de direita. Um governo Fine Gael / Labour no poder não seria fundamentalmente diferente deste governo.


A ULA está a procurar candidatos em todo o país, e convidamos todas as pessoas e grupos que queiram lutar pela mudança e que aceitem as nossas exigências para se tornarem parte da Aliança.

A ULA: 1 - Rejeita as chamadas soluções para a crise económica que têm por base o corte de despesa pública, gastos sociais e salários de quem trabalha. Não pode haver uma solução justa ou sustentável apoiada no mercado capitalista. Em vez disso, somos a favor do controlo público e democrático dos recursos de modo a que a necessidade social seja priorizada em relação ao lucro.

2 - Os eleitos como parte da aliança não vão fazer nenhum acordo ou apoio a qualquer coligação dos partidos de direita, particularmente o Fianna Fail e Fine Gael. Comprometemo-nos com a construção de uma alternativa de esquerda para unir quem trabalha no sector público ou no privado, irlandeses ou imigrantes, desempregados, reformados e estudantes, na luta para mudar a sociedade.
A ULA chegou a acordo nas seguintes exigências-chave.

1 - Fim do resgate dos bancos e dos promotores imobiliários

A ULA pede o fim da NAMA (nota: National Assets Management Agency, entidade criada pelo governo em 2009 para lidar com a crise financeira) e dos resgates dos bancos e dos promotores imobiliários. Tornar públicos os bancos, as instituições financeiras, grandes construtoras e terrenos para construção, com gestão democrática, para benefício das pessoas e não para o lucro de poucos. Os bancos, sendo propriedade pública, garantiriam a poupança dos titulares de contas bancárias, mas não dariam garantias de pagamento aos obrigacionistas e especuladores financeiros que ajudaram a causar a crise global.

Queremos utilizar os recursos, incluindo o grande número de imóveis vagos, para oferecer instalações e habitação social acessíveis para todos, para compra ou aluguer.

Reduzir o valor das hipotecas e amortizações para níveis acessíveis, que reflictam o custo real das propriedades, e tornar ilegais despejos de famílias com base na incapacidade de pagamento.

2 - Tributar os gananciosos e não os necessitados

A Irlanda não é um país pobre. Enormes quantidades de riqueza foram gerados durante o boom. O problema é que a riqueza está nas mãos de uma minoria riquíssima. Rejeitamos completamente a noção de que toda esta riqueza desapareceu repentinamente. Muitas empresas, especialmente multinacionais, continuam a ser rentáveis.

A ULA propõe um sistema de impostos progressivos, onde os lucros enormes realizados na Irlanda por algumas corporações representariam um aumento significativo que, juntamente com um um imposto de renda progressivo mudaria drasticamente a carga fiscal dos trabalhadores para as grandes empresas e para os ricos.

Exigimos igualmente um imposto sobre a riqueza do património dos ricos, o aumento no imposto sobre ganhos de capital e um fim a todas as fugas fiscais para os ricos.

Opomo-nos a toda a dupla tributação e impostos ocultos, incluindo taxas de lixo e planos para introduzir tarifas de água, um imposto sobre a propriedade, ou um "imposto sobre o agregado familiar". Somos contra a inclusão de quem aufere baixos salários na rede fiscal.

3 - Acabar com a crise do emprego

A ULA condena o fracasso total do governo e do sector privado no manutenção ou criação de empregos. As suas políticas são deflaccionárias e estão a piorar a crise do emprego.

Apelamos a um programa de desenvolvimento social real que possa criar centenas de milhares de postos de trabalho na construção de infra-estruturas necessárias, como sejam os transportes públicos, energias renováveis, banda larga, creches, escolas, hospitais, centros de saúde e outras estruturas da comunidade.

Opomo-nos a planos de venda de empresas estatais. Em vez disso, essas empresas devem ser utilizadas como veículo de criação de emprego.

Acabar com a dependência do sector privado, utilizar a propriedade pública de recursos naturais e bancos para criar empregos lançando um programa estatal de desenvolvimento industrial e inovação para construir capacidade produtiva na economia. Tornar a Corrib Gas Fied pública.

Reduzir a jornada de trabalho sem perda de remuneração e criar dezenas de milhares de postos de trabalho, dividindo o trabalho.

Dizer não a esquemas de trabalho compulsivo para os beneficiários de prestações sociais ou falsos trabalhos Necessitamos de empregos reais e uma inversão de todos os cortes sociais e pagamentos de benefícios.

4 - Impedir os cortes, defender os serviços públicos

A ULA defende o fim dos lucros na Saúde. Defendemos um sistema de saúde devidamente apoiado em recursos públicos, gratuito nos pontos de acesso e pago através de um sistema de impostos progressivos. Acabar a privatização dos serviços de saúde e os subsídios à saúde privada. Não aos hospitais privados em terrenos de hospitais públicos.

Exigimos um financiamento estatal adequado para um sistema de educação democraticamente gerida e secular, gratuito para todos desde a infância à universidade. Aumentar o número de professores para reduzir o tamanho das turmas e cuidados especiais e assistência no idioma, para que todas necessidades das crianças sejam atendidas. Fim dos subsídios às escolas privadas. Não à reintrodução de propinas no ensino superior, pelo pagamento, aos estudantes, de bolsas.

Não aos cortes nas prestações sociais e pensões, e não aos cortes, tributação ou estabelecimento de condições de recursos para obtenção do abono de família.

Por uma campanha de massa pelo movimento sindical e das comunidades para reverter os cortes nos serviços públicos.

Queremos uma reforma real dos nossos serviços públicos. É tempo de parar de copiar as falhas das práticas do sector privado. Queremos o fim dos salários inflaccionados, bónus e prémios dos altos funcionários públicos e políticos. Queremos um tecto nos salários e escrutínio público da despesa pública. Os serviços públicos deveriam ser administrados democraticamente com a plena participação dos trabalhadores, dos utilizadores dos serviços e da comunidade em geral.

5 - Igualdade para todos

A ULA apoia a igualdade para todos, pela eliminação de todas as formas de discriminação baseada no sexo, raça, nacionalidade, religião, orientação sexual, deficiência ou idade.

Defendemos uma campanha por parte dos sindicatos, no sentido de todos os trabalhadores se sindicalizarem, e do reconhecimento legal dos direitos dos sindicatos.

Acabar com todas as leis anti-imigração e contra os refugiados. Dar o direito ao trabalho por parte dos refugiados, e, a ambos, todos os direitos laborais de que usufruem os outros trabalhadores, de modo a ajudar a combater a “corrida para baixo” nos salários e condições de trabalho.

Somos pela plena igualdade para lésbicas, gays, bissexuais e transexuais, incluindo o direito ao casamento .

6 - Proteger o ambiente

Apesar da retórica, a destruição ambiental continua em ritmo acelerado. O Estado deve investir massivamente em energias renováveis. Através da propriedade pública e planeamento democrático, a economia pode ser direccionada para a sustentabilidade.

Precisamos de uma verdadeira reforma do nosso sistema de planeamento, de modo que as necessidades das pessoas e a protecção do ambiente venham antes dos lucros dos promotores dos projectos. Apelamos a um grande investimento em equipamentos colectivos, gestão de resíduos, reciclagem e transportes públicos.

Opomo-nos à incineração como solução para o problema dos resíduos, devido aos riscos sérios que representam para a saúde. Propomos um plano de gestão integrada de resíduos adequada, incluindo uma redução drástica da embalagem, combinada com uma abordagem séria para a reciclagem e compostagem.

7 - Construir uma verdadeira alternativa de esquerda na Irlanda e na Europa

A formação da ULA é parte de um processo de dimensão europeia e, internacionalmente, do desenvolvimento de movimentos e organizações que combatem ataques aos trabalhadores, aos desempregados e aos pobres, pela luta de uma nova visão de sociedade.

Opomo-nos ao diktat da União Europeia e as suas políticas neoliberais de redução de despesa pública e promoção da austeridade. As políticas de dirigir os gastos públicos para cumprir metas da UE destruirá emprego e levará a miséria aos trabalhadores, desempregados e pobres. Os trabalhadores não criaram a dívida e não devem pagá-la.

Estamos comprometidos com a construção da solidariedade com os trabalhadores de toda a Europa para forjar uma nova direcção que coloca as necessidades dos trabalhadores e dos desempregados antes da ganância dos especuladores.

Uma parte importante do processo é a necessidade urgente de recuperar e reconstruir os sindicatos, e mobilizar o poder dos trabalhadores através de acção de massas. A abordagem da Parceria Social (nota: acordos trienais na Irlanda, negociados entre patronato, governo e sindicatos) deixou os trabalhadores indefesos e levou a uma transferência maciça de riqueza dos trabalhadores para os empregadores, por isso deve ser descartada.

Os nossos deputados eleitos darão total apoio aos sindicatos e trabalhadores que se oponham ao acordo Croke Park e usará o Dail (parlamento) para levantar os problemas reais que afectam os trabalhadores comuns.

Uma plataforma similar poderia servir como programa mínimo a subscrever por partidos e movimentos de outros países; neste caso, serve de base a uma coligação eleitoral, mas também poderia servir como programa de reivindicações comum entre movimentos que não se coligassem eleitoralmente (ou até que se dediquem a outras actividades que não concorrer a eleições).

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