23/03/11

Da queda do governo à democratização das lutas e à transformação do regime

Há mais de um mês, publiquei o post que aqui republico quase sem alterações (assinaladas por rectos), porque me parece que a sua pertinência neste momento talvez ganhe contornos mais precisos, podendo contribuir para um debate que, esboçado embora aqui e ali, tarda em alargar-se e aprofundar-se.

1. No interior do BE, provavelmente, e, com toda a certeza, na área mais vasta a que se dirige e que o potencia, há [uma divisão fundamental, entre os] que, se não o pensam até ao fim, agem pelo menos como se o problema fosse termos um melhor governo e os que apostam — implicando isso, como indico adiante uma extensão urgente da acção à escala da UE, etc.. — numa orientação, a assumir desde já, ainda que a sua plena concretização possa parecer remota, a exigência de outra forma de governo, de poder político, de funcionamento económico, que ponha na ordem do dia uma mudança de regime, a ruptura ou "reforma revolucionária" (chamem-lhe como quiserem, contanto que a terminologia não sirva só para aumentar a confusão) de uma democratzação consequente, insituinte de novas relações de poder.

A opção pela segunda alternativa implica desde já, não o abandono completo e sumário do chamado "plano institucional", mas a adopção e extensão de formas organizativas democráticas radicais que efectivamente revolucionem o regime das lutas ou do fazer política dominante. Do mesmo modo, exigiria, no que se refere ao BE ou outros movimentos que surjam na mesma área, uma redefinição profunda das prioridades e temas da agenda política.

Dito isto, não se trata de uma perspectiva maximalista, no sentido de equacionar a cada momento todas as questões em termos de "tudo ou nada". E endereça-se não apenas aos que prevêem que os fins propostos tenderão a implicar uma mudança global brusca e discreta, mas aos que, achando pouco verosímil que a mobilização maioritária dos cidadãos inseparável dos objectivos propostos (o autogoverno político, uma economia política democrática, a participação governante igualitária, etc.) possa ser instantânea, nem por isso desistam de organizar de acordo com eles a sua acção e propostas imediatas.

2. Esta alternativa não coincide exactamente com a que se traça [neste] post [do Pedro Viana] entre os que entendem, no que se refere à cena política instituída, que afastar a presente liderança do bloco central é clarificador e cria melhores condições de luta, e os que entendem que a substituição deste governo por um governo do PSD ou do PSD-CDS, ou do PSD-PS, seria uma derrota da "esquerda".
Com efeito, não se segue automaticamente da primeira opção a assunção da perspectiva da orientação do combate político e social para a mudança de regime e da forma de governo. Longe disso. A verdade é que entre os partidários da moção de censura encontramos gente com pesadas responsabilidades na profissionalização e reprodução da divisão do trabalho político que a alternativa que tracei começa por pôr em causa, e é possível que alguns daqueles que privilegiam a democratização efectiva das relações de poder existentes e de um regime alternativo das lutas vejam com maus olhos a apresentação da moção de censura.

3. Pessoalmente, creio que, não devendo sobrestimar-se excessivamente [este aspecto], a luta pela democratização e a democratização da luta e da acção política quotidianas terão, apesar de tudo, melhores condições na situação clarificada que resultaria do derrubamento do actual governo. Depois da queda deste (ou sendo esta adiada), espera-nos, em meu entender, um período relativamente prolongado durante o qual a transformação do regime, a instauração de formas alternativas de poder político central, não será imediatamente possível. O que não quer dizer que a influência política do que as defendem tenha de ser menor ainda do que é hoje, ou não possa crescer e produzir efeitos profundos e sensíveis, fazendo recuar a ofensiva oligárquica, num quadro em que o governo seja assumido mais declaradamente pelo chamado bloco central.

Ou seja, como já disse num comentário (que passo a transcrever com algumas modificações de redacção) a um post do Zé Neves sobre este tema, é verosímil que a recomposição político-partidária explícita do bloco central permita clarificação e desenvolvimentos significativos:

"(…) é possível que a área do PS e o próprio partido conheça algumas convulsões, recomposições, rupturas, libertando energias que terão repercussões na área do BE e imediações. Por outro lado, a oposição ao novo governo sairá reforçada e isso criará condições para que o combate deixe de ser fundamentalmente por outro governo, para reivindicar mudanças de regime - sendo que aqui se terá de jogar a cartada europeia: formular com outras formações e forças da UE uma carta de reivindicações e princípios 'constitucionais', repolitizando explicitamente a economia política vigente contra o neoliberalismo e a oligarquia financeira e promovendo a participação democrática dos cidadãos, etc, etc.


"É também razoável apostar que, sem governos com cosméticas de 'esquerda', o campo da cidadania democrática possa sair reforçado e exercer uma influência muito maior do que até ao momento no curso das coisas. A oligarquia conservará no imediato o governo, mas poderá ser abalada e forçada a recuar.


"Claro que nada disto é automático ou geometricamente demonstrável. Só pretendo mostrar que a queda de Sócrates não será necessariamente uma catástrofe maior ou causadora de mais estragos do que a sua eternização e do que a aquiescência ao seu argumento de que não pode ser de outro modo.Tudo dependerá das orientações da acção democratizadora e da capacidade de proposta e de extensão dos terrenos de luta para além das fronteiras e das formas de organização habituais".

4 comentários:

Diogo disse...

É necessária uma revolução violenta. Os alvos devem ser os bancos e os seus dois braços: o centrão político e os media.
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Fernando Madrinha - Jornal Expresso - 1/9/2007:
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«… os poderes do Estado cedem cada vez mais espaço a poderes ocultos ou, em qualquer caso, não sujeitos ao escrutínio eleitoral. E dizem-nos que o poder do dinheiro concentrado nas mãos de uns poucos é cada vez mais absoluto e opressor. A ponto de os próprios partidos políticos e os governos que deles emergem se tornarem suspeitos de agir, não em obediência ao interesse comum, mas a soldo de quem lhes paga as campanhas eleitorais.»

Miguel Serras Pereira disse...

Diogo,

não me venha com falinhas mansas sobre a necessidade da "revolução violenta", para ver se apanha leitores para o seu blogue negacionista e anti-semita. Não apareça por aqui, por favor. Não lhe dou tempo de antena. Entendidos?

msp

tempus fugit à pressa disse...

Não será pior...

olhe que não

a manutenção do governo por mais dois meses seria benéfico

deixar cair num período de incerteza
na europa

não foi mau foi muito mau

Isto é revelador do sentimento nacionalNão lhe dou tempo de antena. Entendidos?

aparentemente é mais importante parecer ser ouvido

que tentar ouvir

sinceramente era expectável

a falta de senso
sempre foi uma característica nacional

55 dias 55 dias
para uma coligação PSD-CDS

que se terá de resignar a fazer
muito pior do que nestes 2 meses seria feito

isto é uma dívida que se eterniza

e se se voltar ao escudo
é uma dívida consolidada pela hiper-inflação

e pela perda de...enfim
já fiz a catarse do dia

vou ver a situação do Japão

ver as desgraças dos outros anima

com sorte há mais um crustal rebound nestes dias

tempus fugit à pressa disse...

tendo por efeito sabotar as discussões em curso....isso também tem faltado

discussões isentas e não imbuidas de
cores partidárias

ou de todos os tipos de fés