11/03/11

Sem título

Patrick Corrigan, "The Toronto Star" (roubado aqui)

6 comentários:

Anónimo disse...

desculpem o offtopic: http://www.bbc.co.uk/news/world-europe-12657225

Miguel Serras Pereira disse...

Este teu post lembrou-me o seguinte comentário antecipado que, da situação posta na ordem do dia pelas movimentações populares no Médio Oriente, Castoriadis formulava há mais de vinte anos e cuja pertinência, de então para cá, se tornou cada vez mais premente. Os excertos que se seguem são extraídos de um texto publicado em 1989 ("Fait et à faire", retomado em Fait et à faire. Les carrefours du labyrinthe V, Paris, Seuil, 1997):

"Devemos dizê-lo mais claramente ainda: o preço a pagar pela liberdade é a destruição do económico como valor central e, de facto, único. […] Quem pode crer que a destruição da Terra poderá continuar por mais um século ao ritmo actual? Quem não vê que essa destruição seria ainda mais acelerada se os países pobres se industrializassem? E que fará o regime quando deixar de poder conter as populações fornecendo-lhes constantemente novos gadgets?
Se o resto da humanidade tiver de sair da sua miséria insuportável, e se a humanidade inteira quiser sobreviver neste planeta num steady and sustainable state, será necessário aceitarmos uma gestão de bom pai de família dos recursos do planeta, um controle radical da tecnologia e da produção, uma vida frugal. […] para assentar as ideias, podemos dizer que já seria bastante bom que pudéssemos garantir 'indefinidamente' a todos os habitantes da Terra o 'nível de vida' dos países ricos em 1929.
O que pode ser imposto por um regime neofascista; mas pode ser também livremente feito pela colectividade humana, organizada democraticamente […] abolindo o papel monstruoso da economia como fim e voltando a pô-la no seu lugar adequado, de simples meio da vida humana".

rui disse...

é questionável. sobretudo a passagem: "O que pode ser imposto por um regime neofascista; mas pode ser também livremente feito pela colectividade humana, organizada democraticamente".

Começa porque a passagem é, efectivamente, brilhante e visionária (publicado em 1989 e provavelmente pensado bastante antes!), mas sendo "visionária" do ponto de vista do observador comum - até do mais atento! - não deixa de ser evidente o seu atraso fatal em relação às condições que identifica como ideais, que se teriam verificado sessenta anos antes, em 1929...
O facto de passados mais de vinte anos, sobre o diagnóstico visionário para o entendimento humano, mas atrasado em relação às consequências para o planeta e para a colectividade no seu todo, em que o crescimento continuou - e continua- a progredir de forma galopante (é um termo altamente subjectivo e discutível, mas não digo exponencial porque é um termo excessivamente objectivo para as informações de que disponho), e não se vislumbrar qualquer tendência de abrandamento - levanta a questão da possibilidade de qualquer reacção "racional" da espécie a este estado de coisas, fora o âmbito de uma ditadura (ou guerra) irracionalmente aniquiladora sem qualquer paralelo com o passado. A realidade é que a "colectividade humana, organizada democraticamente" não "emergiu" e não fez a mudança que à luz de tantos diagnósticos seria "natural" para a sua própria preservação. O facto de o não ter feito, poderá parecer uma lapalissada e ainda para mais ultra pessimista e derrotista, mas prova que é incapaz de o fazer, infelizmente. Vamos ver o que acontece se a situação de crise se agravar. Mas, lá está, aquilo que na Europa e States vivemos presentemente como uma "crise", é percepcionado em muitos outros lugares do planeta como um período de crescimento e prosperidade sem precedentes...

Anónimo disse...

A reflexão que um post provoca. Uau!

Miguel Serras Pereira disse...

Caro Rui,

suponho que a citação solada que fiz tenha dado lugar a um equívoco: as condições de 1929 não são consideradas ideais - o que o texto afirma é que, em termos de consumo, será irrealista pretendermos generalizar a toda a população mundial um "nível de vida" (igualitarizado) superior ao dos países desenvolvidos em 1929. Nem a repartição nem a orientação da produção de 1929 são apresentadas como ideais (o que, de resto, do ponto de vista de Castoriadis seria um contra-senso).

O segundo ponto é de fundo e teremos de o discutir um dia destes mais demoradamente. Tem a ver com a improbabilidade da democracia - que me parece ser a sua perspectiva. Para já, faço notar apenas que "improvável", a democracia foi-o sempre, desde o início. Quer dizer, do ponto de vista de um observador exterior do que tinham sido até à data as civilizações humanas e as suas constantes "estruturais", o aparecimento da ideia democrática e da interrogação filosófica na polis ateniense seria quase inverosímil.
Adiantando um pouco mais, se me perguntar se as perspectivas presentes e a evolução das condições, a partir, digamos, da meados do século passado (e, apesar do sobressalto dos anos 60), são favoráveis à democratização das instituições económicas e políticas e ao desenvolvimento de uma cidadnia tendencialmente governante, a minha resposta será, sem dúvida, negativa. A democracia, entendida como autogoverno colectivo e autonomia individual, não tem o vento nem a inércia ou a "força das coisas" a seu favor. O que não torna a sua proposta ou a sua ideia menos actual ou, à reflexão, convincente. Nem faz também, à partida,com que a acção - no sentido arendtiano do fazer que começa qualquer coisa de novo, faz nascer qualquer coisa de novo - não possa inverter as tendências pesadas do presente.
Enfim, tenho de, por agora, ficar por aqui - mas espero ter sugerido o suficiente para que possamos continuar a trocar ideias, com outros, sobre o problema.

Saudações cordiais

msp

Anónimo disse...

Desculpem-me também o off-topic
"do ponto de vista de um observador exterior do que tinham sido até à data as civilizações humanas e as suas constantes "estruturais", o aparecimento da ideia democrática e da interrogação filosófica na polis ateniense seria quase inverosímil.
Adiantando um pouco mais,..."
MSP:
Não é preciso adiantar mais. Sobreduto não adiante. A disenteria verbal tem limites e nem sempre o C. Vidal pode estar atento.
O preço da gasolina makes me crazy too.
Qual Górgias? Qual Protágoras? MSP traduz superiormente qualquer cartoon.