09/03/11
Viva a forma
por
Zé Neves
Eu pertenço ao tal "povo" que votou nos Homens da Luta. Eu em princípio voto. Até que se organizem (incluindo-me no "se") campanhas abstencionistas (tema sobre o qual não tenho posição de princípio, do género "o voto (não) é a arma do povo"), vou votando por aí, nisto e naquilo. E neste caso estou muito contente com o meu voto. Há muito tempo que não ganhava nada. A última vez que votei e ganhei foi, creio, quando votei no Vilarinho para derrotar o João Vale e Azevedo. Dizem-me, entre outros sítios, aqui neste nosso blogue, que atente ao "conteudismo" do meu gosto. Mas é um tiro ao lado, creio. É que não votei numa música. E, se admitem o snobismo, não percebo sequer a que propósito é que falamos de música a respeito do Festival da Canção. A actuação dos Homens da Luta, na verdade, tem um duplo efeito: mostrar que qualquer nabo que saiba projectar a voz a mais de um metro pode ganhar o festival da canção; e mostrar que a política já não pode ser contida nas formas tradicionais. Neste segundo efeito, diga-se, o formalismo dos Homens da Luta é merecedor da nossa atenção, como foi a votação em José Manuel Coelho ou (e em todo o caso falamos sempre de coisas muito diferentes, por certo) a manif de dia 12. Admito como razoáveis os receios de quem acha que todos estes sinais podem ser o sinal não de um amanhã que cante mas de uma longa noite escura. Mas é o risco de estarmos vivos, que, como dizia a Lili Caneças, julgo, é o contrário de estarmos mortos. Há uma crise do sistema político à vista de todos (o que não quer dizer que ela antes não existisse) e é nesse terreno que temos que pensar, apostar, arriscar, discutir, ponderar. Não podemos é ficar agarrados a debates de ontem para limitar o que é (para o mal ou para o bem) novo. Regressando aos Homens da Luta. Folgo muito em ver que, mesmo quando devolvidos ao terreno da normalidade institucional-medática, a coisa resiste e até pula e avança com toda a confiança. Vejam bem este vídeo. E digam-me (tirando a parte final, de um pacifismo que me parece ingénuo) se um dia não gostavam de ver os nossos amigos André Freire, Daniel Oliveira ou Rui Tavares, para dar o exemplo de vozes críticas que têm desempenhado um papel valioso nos debates dos últimos anos, a falarem assim - e refiro-me tanto à forma como ao conteúdo - numa tv perto de nós.
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14 comentários:
Bom post. Aquele video mostra o quanto politicamente correcto e social/democrata têm sido os "nossos" ( da esquerda ) comentadores.
Muito reaça votou neles por achar piada a ridicularizar a esquerda, sem se aperceberem que os Homens da Luta são uma espécie de vírus. Conquistado o espaço mediático, aqueles 7 minutos na SIC - em registo sério - contribuem mais para combater o abstencionismo do que 36 anos de esquerda institucional representada por 30 deputados no parlamento e uma série de Marcelos Rebelos de Sousa de esquerda, cujo ponta de lança é o Daniel Oliveira. Foi importante ouvir "a pior censura é a auto-censura": para mim é a maior lição que se pode dar ao nunca incómodo Daniel Oliveira.
O' Zé Neves,
Mas a qualidade da forma afere-se em relação ao fim, ao seja deriva de ser prestavel. Tenho pena de não vos acompanhar na celebração aned-otaria (outros qualificativos haveria, mas enfim) desse não acontecimento, mas o dito protesto, ou la o que é, vai acabar onde começou. Não no fim do mundo (antes fosse), mas numa simples... diversão.
Das mais rascas, até, daquelas que se reinvindicam como tais.
Ha malta que se anime com isso ?
Então não faço parte. Tenho pena. Chamem-me esnobe, sobranceiro, altivo, burguês, fanatico, monge, mas continuo a ouvir nos versos do Zeca Afonso (parem, escutem, olhem) OUTRA COISA do que na palhaçada da moda que vos transtorna e que receio que vos transporte em grande velocidade para a capital do ridiculo.
Deve ser do carnaval com certeza !
A arcaica polaridade forma-conteúdo está para a teoria de arte como D.Afonso Henriques para a História Contemporânea.
Mesmo assim é de registar o esforço analítico do Zé Neves relativamente a alguns dos seus colegas de blogue que, por serem mais ou menos entendidos em ciências sociais, tinham a obrigação de não reproduzir as barbaridades que eu tenho vindo a ler, e que são próprios mais de «um bom pai de família» do que um observador atento da realidade social.
Os juízos definitivos e projectivos do João Viegas nao são de um burguês snob.Não, nada disso. São antes, com o devido respeito aos visados, a versão rasca do Velho do Restelo.
caro joão viegas,
mas a política implica não ter medo de cair no ridículo.
***
caro anónimo,
de acordo com a necessidade de abdicar da dicotomia forma/conteúdo (na política como no resto)
Certo, caro Zé Neves e caro Anonimo,
Assumo perfeitamente o risco de a minha critica cair no ridiculo caso se verifique infundada, ou seja caso se verifique que afinal estavamos mesmo a assistir ao preludio de alguma revolução, e não de uma simples volta à pista, porventura simpatica (eu até gosto de palhaços).
A ver vamos então...
A política já não pode ser contida nas formas tradicionais O sujeito prendeu-se à forma e perdeu o conteúdo A forma autónoma é apenas uma imagem Fazer o sujeito pensar todo o circuito da imagem
A política já não pode ser contida nas formas tradicionais O sujeito prendeu-se à forma e perdeu o conteúdo A forma autónoma é apenas uma imagem Fazer o sujeito pensar todo o circuito da imagem
Zé Neves,
os conceitos de forma e conteúdo são pertinentes para a análise da obra de arte (e não só). Eles não devem é ser vistos como uma dicotomia, tal como um comentador disse para aí, mas como uma relação imbricada e naturalmente variável entre eles. É demasiado redundante dizer isto, mas certos comentadores nem o redundante parecem conceber: não existe forma sem conteúdo, nem conteúdo sem forma. Não são antinómicos mas têm muitíssimas modalidades de se combinarem através dos seus múltiplos desdobramentos possíveis, como certamente concordarás.
Bom post, Zé Neves.
Dizes sobre este assunto aquilo que eu tenho andado às voltas sem conseguir dizer. Quem se põe a falar sobre os HdL ou da canção agora apresentada sobrelevando (e às vezes restringindo) a apreciação a uma "crítica musical" está, como disse Picasso a propósito de outra coisa, a mijar diante da árvore errada.
Boa Zé. O título não é o melhor, mas com a adenda que fazes aqui nos comentários safa-se. Também votei nos tipos, mas apenas numa fase qualquer de pré-selecção que se fazia na internet. Pelo vídeo para que apontas e pelos outros minutos da entrevista no outro canal de TV ontem, parece ter sido um voto útil.
Aqui há uns anos, foi o ‘Olho Vivo’ que me revelou os ‘Homens da Luta’. Vale a pena começarem por aí os que só agora deram pela existência dos personagens. Se alguém tiver o artigo do Eduardo Cintra Torres publicado no Público de 21 de Julho de 2007 sobre os Vai Tudo Abaixo! (o programa de TV onde os personagens ‘Homens da Luta se estrearam, acho, ja lá vão uns bons anos) à mão, avance [uma visita à Hemeroteca agora no intervalo do almoço podia resolver o assunto]. Como não consigo encontrar a coisa integral agora aqui do meu exílio, vão estes excertos que apareceram no fórum deles, cortesia duma Falância:
http://www.vaitudoabaixo.com/forum/showthread.php?p=1966
«««« [inicio de citação]
“VTA no Jornal "Publico" - 21-07-07
Hoje saiu no Jornal "Publico" um artigo de pagina inteira sobre o Vai Tudo Abaixo...
Escrito por um dos melhores, crediveis e mais respeitados criticos da actualidade (Eduardo Cintra Torres) a noticia nao podia ser das melhores.
Aqui ficam pequenos excertos, de muitos, dignos de serem aqui explanados:
"(...) É o unico programa que se coloca fora do "sistema". E é um dos mais interessantes e inovadores programas no humor televisivo e de 2006-7 em geral."
"(...), o programa do Jel afasta a fina camada de realidade da TV "normal", sendo isso notavel nos Homens da Luta. (...)aqui destroi-se a realidade."
"Intervindo no "real", Jel procede ao despedeçamento do "espetaculo" das noticias que é de facto um valor em ascensão na informação televisiva. E fa-lo no proprio territorio das noticias."
"Jel faz uma aplicação actualizada da "acção directa" dos anarquistas (...): em vez de violencia das armas e nas ruas, a violência mediática nos ecras atraves do humor."
"Este é o primeiro programa portugues de sketches enxertados na realidade real com incomodo dos interpelados(...)"
"Tem momentos brilhantes, como os dois drogados, o brasileiro que diz verdades que os portugueses nao querem ouvir e especialmente os Homens da Luta, as personagens mais originais do humor televisivo desde o Nélio e Dália de Herman José."
Escreve ainda sobre as grandes personagens:
Homens da Luta, Ruce e Reco, Kalashnikov, Wanderley, Black Skin, Boa Sorte e Igreja Natural...opinando sobre cada uma delas.
Um Artigo que vale mesmo a pena ler. “
««««««««««««««« [fim de citação]
E depois podem continuar vendo um ou dois dos programas dos tipos [todos disponíveis aqui: http://www.vaitudoabaixo.com/forum/forumdisplay.php?f=16 ], sobretudo os do meio da coisa, no final já havia várias coisas desinteressantes). Desde que se lançaram em proto-candidatura à CML que a coisa já não é a mesma, mas continua a ter os seus momentos. O FRTPC 1975 terá sido mais interessante [por exemplo aqui, com os GAC: http://www.youtube.com/watch?v=6ahGKh0AN9c ; menos aqui, que foi a que acabou por ser a escolhida pelo povo da TV de então: http://www.youtube.com/watch?v=1RP5oVClOCk&feature=related ], mas o FRTPC 2011 está-se a revelar curioso.
A forma, é a forma TV, acho. Que é brutalmente limitadora da acção. Mas é uma das formas dominantes do dia-a-dia de muita gente mesmo numa tal de sociedade do espectáculo. Parece que eles são produto do meio, mas ao mesmo tempo têm o seu quê de grão na engrenagem.
Estou fora do continente. Mas fico à espera que me contem coisas sobre o passeio na avenida do 12 de Março e outras actividades de fim de estação.
Abraços,
migrante
Post na 'mouche'!
Parece-me relevante para a discussão que por aqui ia, por isso escrevo.
Aqui há uns anos, foi o ‘Olho Vivo’ que me revelou os ‘Homens da Luta’. Vale a pena começarem por aí os que só agora deram pela existência dos personagens. Se alguém tiver o artigo do Eduardo Cintra Torres publicado no Público de 21 de Julho de 2007 sobre os Vai Tudo Abaixo! (o programa de TV onde os personagens ‘Homens da Luta’ se estrearam) à mão, avance.
Como não consigo encontrar a coisa integral agora aqui do meu exílio, vão estes excertos:
“(...) É o unico programa que se coloca fora do "sistema". E é um dos mais interessantes e inovadores programas no humor televisivo e de 2006-7 em geral."
"(...), o programa do Jel afasta a fina camada de realidade da TV "normal", sendo isso notavel nos Homens da Luta. (...)aqui destroi-se a realidade."
"Intervindo no "real", Jel procede ao despedeçamento do "espetaculo" das noticias que é de facto um valor em ascensão na informação televisiva. E fa-lo no proprio territorio das noticias."
"Jel faz uma aplicação actualizada da "acção directa" dos anarquistas (...): em vez de violencia das armas e nas ruas, a violência mediática nos ecras atraves do humor."
"Este é o primeiro programa portugues de sketches enxertados na realidade real com incomodo dos interpelados(...)"
"Tem momentos brilhantes, como os dois drogados, o brasileiro que diz verdades que os portugueses nao querem ouvir e especialmente os Homens da Luta, as personagens mais originais do humor televisivo desde o Nélio e Dália de Herman José."
[excertos apanhados em comentário de ‘Falância’, aqui: http://www.vaitudoabaixo.com/forum/showthread.php?p=1966 ]
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