06/07/15

A vitória do Não. Consequências.

A vitória do Não no referendo de domingo foi um rude golpe nos que dominam a Europa através do controlo das instituições outrora democráticas.  Depois de 5 meses de adiamentos contínuos; de 5 meses de chantagem sobre um governo legitimamente eleito; de 5 meses a mostrar que a única via para o povo grego era mais empobrecimento, mais sofrimento, mais desemprego, mais miséria; de 5 meses a assistir impávidos e serenos a uma colossal fuga de capitais estimulada pelos sucessivos rumores bufados por Bruxelas; depois de 5 dias em que, todos e cada um, assumiram uma posição de partido único pró-austeritário no referendo grego, defendendo o voto no Sim e ameaçando os gregos com a expulsão da Europa, como fez Martin Schulz,  o inqualificável presidente do Parlamento Europeu; depois de 5 dias em que o BCE estrangulou os bancos gregos retirando-lhes o necessário apoio para poderem efectuar os pagamentos de pensões e salários; depois de 5 dias de sondagens que davam a vitória do Sim como iminente;  os dirigentes europeus reagiram à derrota que lhes foi infligida pelo povo grego como é suposto reagirem os ditadores.  Ameaçando os gregos pelas opções que tomaram livremente, pensando pelas suas próprias cabeças e escolhendo o que acham ser melhor para si e para os seus. Declarando como nunca tinha sido feito na História da Europa que estavam decepcionados com a decisão dos gregos ou que os gregos tinham cometido um grave erro.
Fizeram-no cuspindo e pisando sobre os valores fundadores da Europa, mostrando que nesta guerra que travam contra os povos da Europa, contra a própria ideia de Europa, estão dispostos a descer tão baixo quanto possível, a serem tão anti-democráticos quanto necessário para deixarem claro que eles, os que mandam na Europa, não admitem que quem pense de maneira diferente possa ter a veleidade de querer mudar de caminho, escolher uma alternativa política, seguir uma via reformista e progressita que não a que eles escolheram .
Por isso, nos próximos dias, esta gente sem valores e sem princípios, vai endurecer a parada, extremar todas as chantagens, jogar o tudo por tudo, mobilizar todos os recursos mediáticos ao seu dispor - vejam-se os inenarráveis debates no pós-Não nas televisões portuguesas -  para criarem as condições favoráveis à saída da Grécia do Euro e à sua eventual expulsão da União Europeia. O que estabelecem os Tratados pouco importará para quem já mostrou não olhar a meios para atingir os seus inconfessáveis fins.  Esta gente sem valores que estimula o crescimento da ameaça nazi por todo o continente europeu. Num post anterior antevi essa saída como inevitável mesmo no contexto da vitória do Não. É a intransigência da troika, da EU, que vai ditar esse lamentável epílogo para a aventura europeia que se iniciou a meio do século passado. No próximo dia 20 se saberá se essa saída forçada dos gregos se consuma ou não. Triste gente esta a quem calhou cavar a sepultura onde ficará sepultado este projecto político.

4 comentários:

Francisco disse...

"das instituições outrora democráticas" Quando é que elas foram democrácticas? Quando reagiram como reagiram ao Referendo na Dinamrca? Ou ao freferendo na França? Ou na Irlanda.
A UE nunca foi "democráctica", sempre se fez nas costas dos povos. Durante um período de prosperidade gozou da aceitação e consentimento dos povos, é verdade, mas isso não a torna "democráctica".
Agora que a "prosperidade" se foi e agora que há quem confronte as "instituições" estas revelam aquilo que sempre foram e escondiam atrás de uma retórica oca de substância.

Anónimo disse...

São mais duas semanas de tensão e desespero multimodo em que o futuro da Grécia se vai jogar num quadro aterrador de roleta e sadismo politico insofismável, com ameaças cruzadas entre as instituições europeias e as autoridades helénicas confortadas pelo " Não " esmagador Entretanto, o processo do Referendo- claro- despoletou comentários e análises nos últimos dias de grande impacto. Assim, Tarik Ali revelou que o programa politico e a topografia da construção do Syriza perfazem mais de 15 anos de deliberação e racionalidade.E mesmo desse modo, revelou ao Le Monde Cohn-Bendit, o antigo lider europeu dos Verdes assegura que o governo de coligação grego não conseguiu construir uma alternativa politica e económica ao " sistema " capitalista em vigor, porque se " trata de um governo nacionalista acima de tudo, aliado à direita extrema e à Igreja Ortodoxa "(sic).E acrescenta: " por outro lado, a UE comporta-se como um monstro tecnocrático que se marimba da decisão do povo e da sua respectiva soberania nacional ". E exara ainda este comentário sibilino e profundo: "As culpas da Grécia em 2015 são bem mais pequenas do que as da Alemanha em 1945". N.

Dias disse...

Subscrevo na generalidade o que escreve. A chantagem e a manipulação vão continuar, a selvajaria da media (como Varoufakis a denominou) não acabou. Para mim, com esta gente que dirige os destinos da União Europeia, este é um projecto morto.

José Guinote disse...

Francisco eu sou dos que pensam que assistimos a uma degradação da vida democrática na Europa. Sou dos que pensam que a construção europeia teve momentos importantes do ponto de vista civilizacional. Trata-se de uma importante discussão não resumível num comentário. Recuso-me, em síntese, a minimizar o trabalho de desconstrução do projecto europeu levado a cabo pela última leva de dirigentes. Se o fizesse não faria sentido apoiar o processo grego e ter, apesar de tudo, esperanças no futuro da Europa.