14/07/15

Claro como água

Theodoros Karyotis publicou na revista ROAR um artigo de opinião com o qual estou completamente de acordo, em particular no que concerne ao caminho a percorrer de agora em diante. Alguns extractos, por mim traduzidos do original em inglês:

"(...)Durante cerca de três anos, os movimentos sociais populares na Grécia tiveram sentimentos profundamente contraditórios relativamente à ascensão eleitoral do Syriza. Por um lado, a perspectiva de um governo de esquerda era uma oportunidade para levar o conflito a um nível institucional; afinal de contas, muitas das reivindicações das lutas estavam refletidas no programa do Syriza e o partido sempre teve uma atitude positiva para com os movimentos sociais.

Por outro lado, o Syriza tem sido um agente de desmobilização, terminando a crise de legitimação que deu protagonismo à criatividade social e auto-determinação dos movimentos, e promovendo a institucionalização das lutas, a marginalização das reivindicações que não se encaixam no seu projeto de gestão do Estado, e a restituição da lógica da representação política e da delegação, o que promoveu a inacção e a complacência.(...)

O fracasso do Syriza em cumprir qualquer das suas promessas de campanha ou em inverter a lógica da austeridade levanta o véu da ilusão a respeito de soluções institucionais, impostas de cima para baixo, e deixa os movimentos de base exatamente onde eles começaram: como a principal força que se opõe ao assalto neoliberal da sociedade; a única força capaz de conceber um mundo diferente que vai além das instituições falidas do mercado capitalista predatório e da democracia representativa.(...)

O papel da esquerda, em sentido lato, não é a de um gerente mais benevolente da barbárie capitalista: afinal, esse era o propósito original da social-democracia, um projeto que se exauriu na década de 80 do século passado. Não pode haver "austeridade com uma face humana": a engenharia social neoliberal é um ataque à dignidade humana e aos bens comuns em todas as suas formas(...)

(...) o NÃO no referendo da semana passada foi ambivalente, e a luta para lhe dar um sentido apenas começou. Horas após o anúncio do resultado, o primeiro-ministro Tsipras interpretou o veredicto como um mandato para "ficar dentro da zona euro a qualquer custo". É evidente, porém, que o novo "bailout" está fora do seu mandato: o Plano A, o único plano de Syriza, prevendo um fim da austeridade sem pôr em causa os poderes-que-são, fracassou totalmente.

O Plano B, promovido em várias formas pelo Antarsya, o Partido Comunista e a própria Plataforma de Esquerda no interior do Syriza defende uma reconstrução produtiva fora da zona euro. Embora cada vez mais popular após a inflexibilidade do projecto europeu ter-se tornado evidente, ainda é um plano produtivista, centrado no Estado, para ser implementado de cima para baixo, e que não coloca em questão os traços dominantes do capitalismo: o crescimento capitalista sem fim, uma economia extrativista, a expansão da produção, crédito e consumo. Além disso, através da promoção do enraizamento nacional comporta o perigo de desvios autoritários.(...)

A perda de poder político sobre as suas vidas está a empurrar muitos europeus na direcção de partidos reacionários e xenófobos que prometem um retorno ao Estado-nação auto-suficiente e autoritário. A esquerda europeia parece perplexa à medida que as suas esperanças de uma UE baseada na solidariedade e justiça social desaparecem junto com a oferta do Syriza para negociar uma forma humana para sair da crise da dívida grega.

Agora é o momento para uma ampla aliança de forças sociais no sentido de apresentar um "Plano C", baseado na colaboração social, auto-governo descentralizado e administração dos bens comuns. Sem perder de vista a sua importância, a política eleitoral nacional não é o campo privilegiado de ação quando se trata de promover a transformação social.

O definhamento da democracia na Europa deve ser complementado e desafiado pela fortificação de comunidades auto-organizadas a nível local e pela criação de fortes laços entre elas, juntamente com o retorno a uma economia baseada na solidariedade e na necessidade, e à gestão e defesa coletiva dos bens comuns. O contra-poder social dos oprimidos deve enfrentar o poder social do Capital diretamente no seu espaço privilegiado: a vida quotidiana"

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