[Ultima passagem do tal texto escrito no principio do século]
Uma crítica que algumas pessoas poderão fazer ao RUG é que levará algumas pessoas a trabalhar menos, ou mesmo a não trabalhar (embora seja um dado reconhecido de que esse efeito acontece menos com o RUG do que com o RGM ou o SD). Que se poderá responder a essa objecção? Eis algumas respostas que poderão ser dadas, apresentadas por ordem crescente de “admissibilidade” (ou seja, as primeiras respostas são aquelas que, embora perfeitamente lógicas numa perspectiva puramente “cerebral”, “chocam” mais numa perspectiva “emocional”).
Uma crítica que algumas pessoas poderão fazer ao RUG é que levará algumas pessoas a trabalhar menos, ou mesmo a não trabalhar (embora seja um dado reconhecido de que esse efeito acontece menos com o RUG do que com o RGM ou o SD). Que se poderá responder a essa objecção? Eis algumas respostas que poderão ser dadas, apresentadas por ordem crescente de “admissibilidade” (ou seja, as primeiras respostas são aquelas que, embora perfeitamente lógicas numa perspectiva puramente “cerebral”, “chocam” mais numa perspectiva “emocional”).
1º argumento – “E depois?”: Este é o argumento que, à primeira
vista, choca mais o “senso comum”. Uma pessoa não trabalhar (ou trabalhar
menos) e receber um subsídio? Não parece fazer qualquer sentido (a ideia de
que, dentro duma nave que se desloque à velocidade da luz, o tempo não passa,
também não parece fazer sentido, mas não deixa de ser menos verdadeira por
isso). Mas vamos por partes. Imaginemos que o Teodorico e o Hildebrando ganham,
ambos, 70 contos por mês. Vamos supor que passam a receber um RUG de 35 contos.
O Teodorico usa-o para melhorar o seu padrão de vida: compra um carro melhor,
roupas melhores, faz obras em casa, etc (ou seja, passa a fazer vida de 105
contos). Pelo contrário o Hildebrando continua a viver com 70 contos por mês,
só que passa a trabalhar em part-time (recebendo apenas 35 contos de
ordenado). O argumento de que o RUG é mau porque reduz a oferta de trabalho tem
implícito a ideia de que, se todos fossem como o Teodorico, até nem havia
problema, o mal são os “Hildebrandos”. Basta pensarmos um pouco para vermos que
tal não faz qualquer sentido: por que razão gastar o dinheiro num “carro
melhor”, numa “casa melhor”, em “roupas melhores”, etc. há de ser bom, e
“gastar” o dinheiro em tempo livre há de ser mau? Afinal, o “tempo livre” é um
“bem de consumo” como outro qualquer. Passar a vida a dizer que o mal da
sociedade moderna é o excesso de trabalho – como “montes” de pessoas dizem – e
depois criticar o RUG por levar as pessoas a trabalhar menos não faz grande
sentido. Claro que se poderá questionar o principio geral de o Estado dar
dinheiro (ou seja o que for), independentemente de quem o receber passar a
gastar mais ou a trabalhar menos (ou seja, tão mau é o que se passa com o
Teodorico como com o Hildebrando), mas então aí não é uma critica ao RUG (nem à
redução do trabalho), mas sim ao principio geral do Estado-Providência.
2º argumento – “Não haverá grande redução do trabalho”: Felizmente ou infelizmente, as pessoas querem sempre ganhar mais. Há muitas pessoas que alugam quartos no Verão, e que, apesar disso, continuam a trabalhar nos seus empregos. As pessoas que vivem do SD ou do RMG frequentemente fazem “biscates” (desde que ninguém saiba e não ponha em causa continuarem a receber o subsídio). Até as pessoas que vivem da caridade de familiares é provável que arranjassem trabalho se lhes garantissem que continuariam a ter comida grátis (e uns “trocos”), mesmo que arranjassem emprego a ganhar 200 contos por mês (líquidos).
Saíndo do campo da teoria e indo
para a experiência prática, observamos que no Alasca não há registos
significativos de redução do trabalho por via do RUG (aliás, praticamente todo
o espectro político do estado – que até é dominado pelos “Republicanos”, o
equivalente local do CDS/PP – apoia o
RUG, o que indicia que não tem problemas de maior). Atendendo que o Alasca é
muito mais rico do que Portugal, é de esperar que o RUG português fosse
inferior ao alasqueano (talvez andasse por volta dos 15 contos/pessoa-mês, em
comparação com cerca de 40 no Alasca), logo nem seria possível alguém viver
permanentemente só com ele.
3º argumento – “Acabaria tudo por se compensar”: Mesmo que algumas pessoas abandonassem os seus trabalhos (ou, mais provavelmente, passassem a part-time), e mesmo que admitíssemos que havia algum problema com isso, também há pessoas que, actualmente, não conseguem arranjar emprego
4º argumento – “Tudo tem custos”: Mesmo que, apesar de tudo o que atrás foi dito, se considerar que a diminuição da oferta de trabalho é uma objecção ao RUG, temos que nos lembrar que todas as políticas de solidariedade social têm custos potenciais (como se viu atrás). E não existir políticas de protecção social também tem custos (se alguém duvidar, recomenda-se uma viagem turística pela América Latina...). Vendo bem, o RUG será talvez um dos que menos custos têm (nomeadamente a nível de despesas administrativas).
Adenda: entretanto, risquei uma passagem que talvez fizesse sentido há 10 anos, mas que era totalmente delirante nos dias de hoje
2 comentários:
Uma bela série de textos, que faz ainda mais sentido agora do que há 10 anos (porque as tendências económicas latentes à época desembocaram... nisto!).
Curioso que no Alasca haja RUG. Sabia de que nos anos 70 houve um teste do sistema numa cidade canadiana, mas que depois meteu-se uma cryse (...) pelo meio e os resultados nunca foram analisados... até porque indicavam que o RUG melhorou o nível de vida do povo da cidade e da sociedade em geral: por exemplo, mais gente pöde estudar até graus de Ensino mais avançados, o que lhes permitiu depois ir para empregos de maior valor acrescentado, aumentando o PIB local. Coisas assim.
Gralha: Onde está RGM deveria estar RMG.
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Zwei
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