(Obama, a propósito dos bónus do presidente do conselho de administração da Goldman Sachs, Lloyd Craig Blankfein)
A bonomia das palavras de Obama não esconde a contradição. E não nos restringimos a contrastar meramente – mesmo se isso bastasse – os lucros astronómicos de Lloyd Craig Blankfein, com a perspectiva de empobrecimento global da maioria dos cidadãos gregos. A contradição mais inquietante é relativa aos modos de pensar, mais do que factual: contradição, portanto, entre o louvor (ou a não censura) do êxito legítimo de um indivíduo e a condenação dos estratagemas financeiros, à escala de um estado, quando destes estratagemas depende, pelo menos em parte, aquele êxito. Numa palavra – “falsa consciência”.
A noção é empregue, pela primeira vez, por Lukács em História e consciência de classe e procura captar, na esteira da teoria da ideologia marxiana, o modo como as contradições da realidade objectiva penetram na consciência subjectiva ao ponto de as tornar invisíveis, mesmo para aqueles que mais directamente são vítimas daquelas contradições.
Em todo o caso, a falsa consciência não é uma categoria moral. Não se condena a “falsa consciência” à escala do indivíduo. O falso naturaliza-se à escala do todo – o postulado da falsidade do todo não significa outra coisa.
Hoje, a pertinência da noção de “falsa consciência” não depende do dualismo de classes a que estava indexado no pensamento de Lukács ou, sequer, de simpatia pelo que escreveu depois de 1923.
A falsa consciência existe onde se dissemina a incapacidade de pensar a contradição enquanto tal, o escândalo enquanto escândalo.
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