19/03/10

Como nem todos lemos o Notícias da Madeira...

Duas linhas
Uma bofetada de luva branca

Data: 26-02-2010


Faço parte daquele enorme grupo de madeirenses que nunca esqueceu a arrogância do presidente do Governo Regional da Madeira quando, em 1999, disse: "Nem um tostão para Timor!" Fiquei ainda mais magoado quando, um ano depois, tive a oportunidade de visitar Timor-Leste integrado na comitiva que acompanhou o Presidente da República Jorge Sampaio em visita oficial. Vi casas destruídas, vi gente humilde, sem nada. Gente que ainda falava algum português, que pedia ajuda e que precisava mesmo dessa ajuda. E lembrava-me, nessa Díli ainda destroçada, do presidente do governo da minha ilha: "Nem um tostão para Timor!".

Agora que Timor começa a erguer-se mas revela ainda muitas fragilidades, é a nossa Madeira, a 'Singapura do Atlântico', a merecer a ajuda de fora. Ao contrário de mim, Ramos-Horta e Xanana Gusmão já esqueceram o que disse Jardim. E agora, em vez de nem um tostão para a Madeira, vejo com emoção um país bem mais pobre que a nossa rica Região a dizer: "100 mil contos para a Madeira!". Timor, um dos países mais pobres do mundo, desvia dos seus cidadãos 556 mil euros (ou 750 mil dólares) para ajudar a manter o bom nível de vida de uma Região que se apresenta com indicadores que a deixam como uma das mais ricas da União Europeia. E Timor não se limita a um tostão: oferece mais de dois euros a cada madeirense.

Sei que este não é o momento para tricas políticas. Que a hora é de trabalhar pela reconstrução, chorar os mortos e proteger os vivos. E, sinceramente, acho que estamos a fazer bem o que é possível fazer nesta altura. O Governo, as Câmaras, as Juntas, os Voluntários. Mas é difícil ficar insensível perante os contributos vindos de fora. Além dos efeitos práticos na reconstrução, a solidariedade de anónimos e as visitas dos 'cubanos' Sócrates e Cavaco e ainda o dinheiro do patrão do 'Pingo Doce' obrigam-nos não apenas a ter mais cuidado com o planeamento urbanístico como também a ter mais tento na língua. Nas desgraças é assim: hoje eles, amanhã nós.

Miguel Silva, Editor de Política

1 comentários:

Manuel Vilarinho Pires disse...

Tem boa memória o seu jornalista!
Mas, não sendo madeirense, fico surpreendido por haver um enorme grupo de madeirenses que recorde o episódio, porque a verdade é que nunca mais o vi recorado em lado nenhum, exceptuando um "post" meu no blogue da Joana há umas semanas atrás.
Que recordava que não houve(ram) um, mas dois políticos portugueses que, nessa altura, protestaram contra o envolvimento solidário de Portugal com o processo de independência de Timor.
Mas o outro parece ter dominado a arte de passar entre os pingos da chuva sem se molhar...