05/04/10
Delinquência Comum
por
Miguel Serras Pereira
Leio na edição em linha do Público desta tarde que Raúl Castro, depois de repetir que "Fariñas é um prisioneiro de delito comum", "adiantou que o seu Governo não será responsável pela possível morte de Guillermo Fariñas, que hoje completa 40 dias em greve de fome para apelar à libertação de 26 prisioneiros políticos que estão doentes". E dou por mim a pensar que, apesar dos dois Castro e da sua nomenklatura, Cuba pode continuar a ser um exemplo para todo o mundo pelo menos em matéria de delinquência comum.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
8 comentários:
Miguel, deixo aqui o link para o discurso de R. Castro, na íntegra.
Perfeito, Joana - obrigado.
Abrç
miguel
"Perfeito"
vamos lá Miguel, vc é capaz de fazer melhor. A calinada de citar o Público que construiu uma noticia inteira sobre três linhas do discurso de mais de 6 páginas de Raul Castro deve ter sido tão grande que até a colega de blogue se sentiu na obrigação de o guiar com um link para o original.
Veja só, até o Diário Económico conseguiu não distorcer tanto a verdade:
"O líder cubano acusou Washington e os países europeus de incitarem à atitude auto-destrutiva de Fariñas (de facto, o nome individual não é referido) "Está a fazer-se o possível para salvar a sua vida. Mas se ele não altera a sua atitude auto-destrutiva, será responsável, juntamente com os seus apoiantes, do desenlace que tampouco desejamos", notou Raúl Castro.
acrescentou ainda que "vacilar é sinónimo de derrota. Não cederemos jamais à chantagem de nenhum país ou conjunto de nações, por mais poderosas que sejam e aconteça o que acontecer (...) "Este país jamais será dobrado. Prefere desaparecer, como demonstrámos em 1962"
Xatoo,
às questões que o seu post levanta já respondi noutros posts e caixas de comentários sobre o problema da natureza do regime cubano.
A ideia deste post não era comentar o discurso de 6 páginas (se fosse de Fidel seriam 600) que o Castro II infligiu à mocidade cubana oficial do regime.
Só quis chamar a atenção para essa forma de vanguarda de delinquência comum que leva um preso a reivindicar, pondo a sua vida em jogo, não dinheiro e resgate, colocação a salvo e com a carteira cheia fora das fronteiras de Cuba, emprego no Partido ou na polícia política, mas a libertação de 26 presos políticos doentes.
Ora, para esse efeito, como para quase todos os que valem a pena, o discurso do não se sabe se regente se sucessor Castro II o Fidelíssimo é absolutamente irrelevante: não passa de um ritual lúgubre cuja incapacidade crescente de reanimar o mito de origem que põe em cena constitui um sintoma suplementar do estado de decomposição burocrático-policial a que as coisas chegram nesse regime a que você costuma chamar "uma espinha cravada na garganta do imperialismo americano" - retomando a pedagógica imagem m-l da defunta AOC nos idos de 70 e do seu apelo ao "voto no castelo" (de Guimarães, símbolo da independência nacional): "cada deputado eleito pela AOC é uma espinha na garganta de Cunhal".
Xatoo, por favor, deixe-me dizer-lhe que é com desgosto que constato que você insiste em mostrar-se cada vez mais reaccionário. Tome cuidado se não quer que o confundam com o Renato Teixeira, que agora profetiza a conquista da Casa Branca e da condução dos destinos do Império a golpes de adolescentes suicidas que desfraldem bem alto nos céus de todo o mundo o estandarte do Crescente, ou com o outro bloguista dos 5dias, cujo nome as boas maneiras me desaconselham de dizer em público, e que descobriu que "democracia é uma palavra totalitária e fascista" e que a liberdade é absolutamente irresponsável (não vou ao trabalho, ou vou, porque me apetece) pelo que o seu "acontecimento" só pode ser mantido através da ditadura que a suprima não menos absolutamente, para evitar a sua degradação em exercício democrático de autogoverno regular. Vá lá, homem, não queira ser motivo de gáudio para o clero mais reaccionário e para os demagogos de serviço da ordem estabelcida: democratize-se, é só pensar um bocadinho e já está, não são precisas pergrinações a Fátima nem a Meca, democratize-se, Xatoo, e traga um amigo também.
Aceite entretanto estes meus votos sinceros e as minhas melhores saudações laicas
msp
Meus caros: Apetece dizer como Adorno : " A moral dos escravos é uma má moral: é sempre a moral dos mestres ". Vamos dialogar, vamos abrir pontes e tentar conhecer-nos melhor! Vamos ter imaginação, abertura e audácia? Há dois dias que discuto com o C. Vidal o problema da Democracia e da Liberdade. Temos obtido belas trocas de ponto-de-vista. E a franca e espontânea participação de outros comentadores, é também reconfortante. Urge evitar tensões e zangas personalizadas, que deixem marcas e ressentimentos. O camarada Xatoo- que tem um belo e trabalhado Blogue- deve participar e esclarecer-nos também. Sempre.
E a propósito: não temos grandes e sérios problemas a avolumarem-se em Portugal, na Espanha, na Grécia, na França, na Hungria, em quase todo o espaço da U. Europeia? Não era bom debruçarem-se sobre eles?!? Há lutas operárias em França absolutamente fantásticas: com ocupações, desvio de material e minagem de instalações como represália e afrontamento maior! Niet
haverá decerto algo a acrescentar à compreensão da "vanguarda de delinquência comum"
Atentar contra a propriedade social comum é crime. Um crime de natureza comum. É isso que se pode inferir num Estado de transição (o equilibrio do possivel) para o Socialismo, entidade a quem compete a guarda institucional do estabelecido por lei na Constituição (a posse dos meios de produção e bens públicos num modo colectivo)
Visto do lado das "democracias" formais, atentar contra a propriedade também é crime. Um crime comum, agravado pelo facto de aqui se atentar contra a propriedade privada.
Em ambos os casos se trata de vigiar e punir - num ou noutro regime ambos são actos politicos. No entanto aqui tratam-nos de forma diferente, como se fossem delitos comuns.
Faça o ratio entre 200 individuos numa população de 11 milhões e o vizinho do norte a pouco mais de 90 km e compare os números. São avassaladores.
Aconselho vivamente a olhar de longe as prisões com telhados de chapa de zinco nos subúrbios das grandes cidades norte americanas onde só estão pobres que atentaram contra a propriedade privada. São presos politicos.
Concluindo, trata-se de uma questão de escolha do modelo de propriedade e de dominação de classe.
Tudo o mais que espalha à sua volta, carissimo MSP, numa tentativa de doutrinação pexisbeque é palha levada pelo vento...
Caríssimo Xatoo, como todos nós sabemos, as escolhas do Miguel já estão feitas há muito.
Para si, um abraço cúmplice, meu caro.
CV
xatoo,
a sua resposta passa completamente ao lado da questão. Mas vejo que se interesa por um tema que me é caro e que pode contribuir para o esforço de democratização do pensamento a que se tem dedicado dialogando comigo: esse tema do "Estado-Penitência" como transformação regressiva do "Estado-Providência", analisado por Loïc Wacquant e outros autores, objecto das reflexões de Zygmunt Bauman, surgiu, com efeito, em boa parte a partir do estudo das realidades penais norte-americanas e alreta-nos contra o perigo de tendências totalitárias que tendem a não merecer atenção embora sejam extremamente activas nas sociedades de tipo ocidental, conhecendo um desenvolvimento encorajado pela precarização e outras consequências das políticas neoliberais das últimas décadas.
Mas a verdade é que a resposta a essas tendências e o combate contra elas - como contra a precarização laboral - passam pela mesma democratização do poder político (do qual o económico é uma das dimensões decisivas) através da intervenção dos cidadãos que seria também a via de uma saída política para Cuba sem capitulação perante as forças hegemónicas globais do Império e sem resignação ao abjecto poder absolutista e quase-monárquico que a oprime.
Saudações sinceramente expectantes
msp
Enviar um comentário