03/11/11

Quem tem medo do fim da história?




O Bloco tem investido alguns dos seus melhores quadros na questão precariedade. Faz todo o sentido porque é uma forma do BE mexer na questão social sem ter que se especializar na gramática sindical dominante. No fundo, é um modo do BE ser como o PCP sem ser como o PCP. Digo isto, refira-se, sem nenhuma desconsideração pela estratégia, ainda que possa discordar dos métodos seguidos pelo BE (“investir alguns dos seus melhores quadros”, por exemplo, é uma frase que automaticamente me encavalita o teclado…). Um dos maiores problemas do Bloco de Esquerda a este respeito tem sido, no entanto, a incapacidade de construir um discurso sobre a precariedade que não se limite a repetir o que o próprio Bloco diz ser a visão empobrecedora que o PCP tem da questão laboral (não vou agora discutir se o Bloco tem ou não razão a este respeito...). Um excelente exemplo desta dificuldade é este artigo do João Teixeira Lopes. Uma pessoa lê o texto e fica com a sensação que a esquerda apenas tem para apresentar como alternativa ao desemprego a prisão menor de um emprego destinado a fabricar os proletários de que essa esquerda diz sentir falta. Estou a exagerar? Talvez. Mas se uma esquerda como a do João Teixeira Lopes recusa, e bem, a chantagem “melhor a precariedade do que o desemprego”, por que não recusa a chantagem “melhor um mau emprego que emprego nenhum”? Simpatizo muito com a adesão do João Teixeira Lopes às teses autonomistas operárias, dos italianos dos anos 60 e 70, segundo as quais a luta operária não se determina necessariamente pela forma do capitalismo e que na verdade até é ela que em boa medida condiciona as mudanças da forma-capitalismo (de tal modo que muitos dos princípios subjacentes à luta operária contra o trabalho acabaram por ser recuperados pelo próprio sistema, como diria o esquecido António Dias da Cunha). Isto é, e seguindo a tese do João Teixeira Lopes, a organização pós-fordista do trabalho ter-se-ia construído contra mas também a partir da crítica operária ao fordismo. Mas talvez devesse o João Teixeira Lopes compreender que tamanha transformação histórica (pelo menos a subscrevermos teses como as de Boltansky e Chiapello) não nos deixa como única alternativa voltarmos ao fordismo. A mim parece-me que há uma ferida em aberto no coração da economia. Essa ferida é a que resulta de uns puxarem para um lado e outros puxarem para outro, como gostam de dizer, e com razão, as Fátimas Campos Ferreira. No caso português, se me é permitido atalhar milhares de quilómetros, tamanha abertura signifca que nem os patrões querem perder tempo com investimentos produtivos enquanto podem ir aumentando os lucros por outras vias (privatização, financeirização, etc.) e que nem os trabalhadores estão muito interessados em perder o seu tempo de vida num grande esforço colectivo a bem do desenvolvimento da economia nacional. A este estado a que chegámos podíamos chamar o fim da história, naquele sentido muito singelamente hegeliano em que já não há síntese possível que suture tamanho antagonismo, pelo menos à escala da nação. E é nestas circunstâncias que me pergunto se o João Teixeira Lopes, que tem um daqueles empregos sem horários, em que faz o que lhe apetece e em que é patrão de si próprio, recomenda aos trabalhadores que se contentem com emprego, emprego com horário, fazendo não importa o quê e a mando do patrão?





1 comentários:

Anónimo disse...

Eu! Tenho medo do fim e do início da história...Será que estas linhas merecem ser escritas?