31/03/10

Uma Reivindicação Razoável

Será de mais - será sequer assim tanto - o "tudo" do "Queremos Tudo" do combate operário que o Ricardo Noronha nos propôs aqui que considerássemos, por esse caminho antecipando da melhor maneira as jornadas do próximo May Day ?
A resposta democrática à precariedade, à expropriação e à subordinação hierárquica do trabalho e do conjunto da actividade económica parece, em todo o caso, bastante simples, e pode traduzir-se numa reivindicação razoável, que não pressupõe descobertas científicas novas no campo da economia, da sociedade ou da história, não depende de soluções tecnológicas milagrosas, não implica a construção de direcções políticas qualificadas, nem a assunção de competências extraordinárias por agentes privilegiados e profissionais do governo dos outros.
Bastaria que, em contrapartida de um determinado montante de trabalho - igualitariamente estabelecido  pelo poder democrático igualitariamente exercido pelos cidadãos -, fosse garantido a todos um rendimento igualitário e condições de igualdade perante o mercado. Precise-se somente que esta política de igualização dos rendimentos não poderia deixar de ser acompanhada da democratização das condições de exercício da actividade económica e da divisão (política) do trabalho em vigor - consequência óbvia da transformação democrática da actual divisão hierárquica do trabalho político.
Tal seria o resultado da adopção de uma proposta do tipo da reiteradamente apresentada nesta matéria por Castoriadis, em termos que poderiam unir numa mesma plataforma tanto os precários rebeldes como os restantes trabalhadores cada vez mais precarizados. E poderia acrescentar-se que essa plataforma seria também uma via de saída para a crise global que a ordem estabelecida não para de reproduzir e agravar a todos os níveis e à escala planetária.

Embora tentar?

Poderíamos ficar por aqui. Mas talvez valha a pena indicar algumas das pistas da desmistificação da racionalidade económica empreendida por Castoriadis, a título de limpeza do terreno no plano das representações e dos "valores".Os excertos que se seguem são extraídos de um texto publicado em 1989 ("Fait et à faire", retomado em Fait et à faire. Les carrefours du labyrinthe V, Paris, Seuil, 1997):

A armação das racionalizações e das justificações da 'ciência económica' ruiu sob os golpes dos melhores representantes dessa mesma 'ciência' ao longo da década 1930-1940 (Sraffa, Robinson, Chamberlin, Kahn, Keynes, Kalecki, Schackle e vários outros) […] A ['ciência económica'] nada tem a dizer sobre a repartição do rendimento nacional. Nunca poderá explicar, e menos ainda justificar, a diferenciação dos salários e dos rendimentos. Tem de reconhecer que não há, espontaneamente, equilíbrio macro-económico e pleno emprego sob o capitalismo. […] Pressupõe - como Marx - que é possível uma imputação rigorosa do produto aos diferentes "factores" e "unidades" de produção - quando essa ideia é estritamente desprovida de sentido, o que destrói toda a base para uma diferenciação dos rendimentos, que não seja a das situações adquiridas e das relações de força (que regulam, objectivamente, a actual repartição do e dos rendimentos).
[…]
Não é concebível que [uma sociedade autónoma] institua o autogoverno das colectividades […] e que o exclua nas colectividades de produção [… que exclua] a realização da democracia no domínio em que os indivíduos passam metade do tempo da sua vida desperta.
[…]
Devemos dizê-lo mais claramente ainda: o preço a pagar pela liberdade é a destruição do económico como valor central e, de facto, único. […] Quem pode crer que a destruição da Terra poderá continuar por mais um século ao ritmo actual? Quem não vê que essa destruição seria ainda mais acelerada se os países pobres se industrializassem? E que fará o regime quando deixar de poder conter as populações fornecendo-lhes constantemente novos gadgets?
Se o resto da humanidade tiver de sair da sua miséria insuportável, e se a humanidade inteira quiser sobreviver neste planeta num steady and sustainable state, será necessário aceitarmos uma gestão de bom pai de família dos recursos do planeta, um controle radical da tecnologia e da produção, uma vida frugal. […] para assentar as ideias, podemos dizer que já seria bastante bom que pudéssemos garantir 'indefinidamente' a todos os habitantes da Terra o 'nível de vida' dos países ricos em 1929.
O que pode ser imposto por um regime neofascista; mas pode ser também livremente feito pela colectividade humana, organizada democraticamente […] abolindo o papel monstruoso da economia como fim e voltando a pô-la no seu lugar adequado, de simples meio da vida humana. Independentemente de muitas outras considerações […], é nesta perspectiva, e como momento desta transformação de valores, que a igualdade dos salários e dos rendimentos surge como um aspecto essencial.

12 comentários:

Anónimo disse...

MS Pereira: Bom reflexo táctico e estratégico, o teu exposto neste texto!) contra os aprendizes de feiticeiro encadeados pelos últimos suspiros do neo-liberalismo sem futuro, em geral, e em Portugal, especialmente. Bis gleich! Niet

xatoo disse...

mais uma vez, um peditório para São Castoriadis de Loyola, ou dito de outro modo, a campanha anti-comunista ligada à reabilitação do fascismo. Citando:
“O comunismo e o fascismo não são precisamente duas maneiras, ainda que monstruosas em extremo, de resolver os problemas da época moderna. Os dois destroem as sociedades das quais se apoderam e não podem durar mais tempo do que aquele por que pode manter-se a sua combinação de mentira e de terror (...) Nos dois casos a distinção entre o público e o privado é abolida, a esfera privada de cada cidadão é absorvida pelo poder, e a própria esfera pública se torna “propriedade privada” e secreta do grupo dominante. Em termos aproximativos, o nazismo diz aquilo que faz e faz aquilo que diz. O comunismo está condenado a dizer uma coisa e a fazer o contrário: fala de democracia e instaura a tirania, proclama a igualdade e realiza a desigualdade, invoca a ciência e a verdade e pratica a mentira e o absurdo. É por isso que perde muito rapidamente a sua influência entre as populações que domina" etc. etc...
O próprio facto de Castoriadis comparar nazismo e comunismo (pag 299 de “Uma Sociedade à Deriva aqui transcrita) é uma estratégia abusiva e intelectualmente aviltante uma vez que ignora as circunstâncias históricas em que cada um dos movimentos se desenvolveu.
(Por acaso pretenderia a URSS estabelecer um Reich de dominação global à semelhança da Alemanha das elites arianas de Hitler? seria igual a utopia do internacionalismo proletário? como poderá um não marxista, que não analisa em concreto as estruturas institucionais de dominação, entender as diferenças entre os objectivos de classe?)
O texto de Ricardo Noronha é também datado (de 1989) as condições especificas do capitalismo gerido por uma só superpotência são hoje muito diferentes.
De que se fala então na arenga deste post? voltando à charge inicial fala-se de emancipação autonomista jesuitica como um misticismo em Santo Inácio; segundo o padre do século XV, cada homem possuiria dentro de si o Bem intrinseco enfiado lá por Deus e com o uso dessa capacidade poderia transformar o mundo construindo uma sociedade justa. Um trabalho concreto onde cada crente prostado frente ao altar se sentia um deus lá no fundo da sua alma. Quereis maior autonomia individual que esta, Senhor?
(porém, a compreensão dialéctica está na ordem de construção das pedras da catedral, não na metafisica dos desejos das alminhas simples)

Anónimo disse...

"Quem pode crer que a destruição da Terra poderá continuar por mais um século ao ritmo actual? Quem não vê que essa destruição seria ainda mais acelerada se os países pobres se industrializassem?"

Esta é a questão fundamental que se colocaria caso a Revolução fosse feita nos países capitalistas mais industrializados (e na China também). Estariam as pessoas destes países dispostas a abdicar do que o Capitalismo alegremente lhes fornece? Transformar o mundo industrializado numa espécie de Europa de Leste do século XXI? E mais, atingir a sustentabilidade energética não pressupõe a continuação do avanço da tecnologia (ainda extremamente poluente por muitos e muitos anos)? E como reagiria o terceiro mundo, que necessitaria de toda essa força produtiva dos países capitalistas para se desenvolver?
Do ponto de vista ambiental, uma Revolução socialista traria tantos e tantos antagonismos ao Mundo, que mais vale culpar a economia de mercado por tudo o que corre mal nos nossos dias.

Miguel Madeira disse...

"E mais, atingir a sustentabilidade energética não pressupõe a continuação do avanço da tecnologia (ainda extremamente poluente por muitos e muitos anos)? "

O que quer dizer mais exactamente?

Anónimo disse...

Quero dizer que, por exemplo, a indústria fotovoltaica, em claro crescimento, é extremamente poluente. Além do mais, existem limites técnicos para a penetração de energia renovável (é tecnicamente impossível ter um país alimentado a energia solar e eólica, as mais promovidas). Existem mais tecnologias, como as pilhas de combustível, que também têm os seus impactos. E as barragens (extremamente preciosas no contexto energético por gerarem energia quando nos convém) vêem sempre os ecologistas a apontar os seus fortes impactos ecológicos. O que quero dizer com isto, Miguel, é que a questão energética é extremamente complexa e que a sua resolução pressupõe na prática ainda muitos anos seguindo o nosso caminho tortuoso, e no contexto de finalmente nos livrarmos do Capitalismo, iriam aparecer imensos conflitos entre os ecologistas e os povos em desenvolvimento. Isto traduz-se numa grande parte dos freaks bloquistas que não percebem política para lá da defesa dos animais e contra os transgénicos, a quererem um mundo mais verde, que se traduz necessariamente numa afectação de recursos muito mais ineficiente que a actual, e que traria problemas a nível de "solidariedade internacional para com os povos em desenvolvimento".

Miguel Madeira disse...

" a quererem um mundo mais verde, que se traduz necessariamente numa afectação de recursos muito mais ineficiente que a actual,"

Será mais ineficente? Se formos ver bem, o problema ecológico mais não é que um problema de externalidades negativas não contabilizadas no custo de produção; log, se se arranjasse forma de esses custos serem contabilizados, a afectação de recursos seria, quase por definição, mais eficiente.

quanto aos povos em desenvolvimento, é relativamente simples concliar os seus interesses com a protecção ambiental (mesmo numa prespectiva puramente reformista e não revolucionária) - seria só transferir riqueza dos paises desenvolvidos para eles, em troca de eles não começarem a poluir.

Miguel Serras Pereira disse...

xatoo,
quer-me parecer que quem tem santos, devoções, ídolos, textos sagrados é você. Um esforço mais, homem, se quer ser, já não digo ateu, mas simplesmente laico.

Se quer saber o que foi a URSS e que tipo de objectivos de classe prosseguia, comece por ler, por exemplo, os quatro artigos que - sobre os "náufragos, tentando salvar-se atravessando as fronteiras, odiados pelos fascistas por serem comunistas, odiados pelos nazis por serem judeus, odiados pelas democracias por serem anticapitalistas" -o João Bernardo publicou no Passa-Palavra (http://passapalavra.info/?p=9956) e aproveite para relancear alguma da bibliografia indicada.

Só para lhe dar uma amostra do que irá descobrir:

"Em 1940, ao abrigo do Pacto assinado com o Reich, as autoridades soviéticas retiraram dos seus campos de concentração várias dezenas de prisioneiros alemães e austríacos e entregaram-nos às autoridades nazis, que os meteram a todos em campos de concentração. Margarete Buber-Neumann contava-se entre eles. As suas responsabilidades no movimento comunista nunca haviam sido grandes e ela notabilizou-se sobretudo pelo testemunho que nos deixou, mas outras figuras que tiveram um importante papel político seguiram o mesmo percurso atribulado. […]
Enquanto os dirigentes soviéticos remetiam à procedência várias dezenas de comunistas dissidentes alemães e austríacos, em sentido inverso dezenas de milhares de polacos fugiam da zona do seu país ocupada pelo Reich para a zona ocupada pelo Exército Vermelho. Mas reproduziu-se com eles o mesmo dilema em que o bureau político staliniano se encontrara perante os exilados da guerra civil de Espanha [perseguidos, massacrados, reduzidos à fuga, pelo Pai dos Povos depois de terem tido a mesma sorte às mãos de Franco - msp].
Mas Stalin não hesitou e decretou a detenção sistemática de toda aquela massa humana, tanto em prisões, para os suspeitos de activismo político, como em campos de trabalho, para os restantes. Contando com os refugiados e com aqueles que já antes habitavam a zona do seu país ocupada pelos soviéticos, calcula-se que a partir da Polónia oriental tivesse sido deportado cerca de um milhão de pessoas, quer para prisões e campos de trabalho quer para residirem obrigatoriamente em outras regiões. A última vaga de deportações incluiu uma elevada percentagem de membros do próprio Partido Comunista, especialmente os que haviam organizado os Comités Locais antes da chegada do Exército Vermelho, e de membros das Milícias Operárias. […]
As detenções maciças de refugiados revelam que os dirigentes soviéticos queriam, por um lado, evitar que a população russa tomasse contacto com pessoas que tinham conhecido outros sistemas políticos e outras formas de vida e cujas mentalidades não haviam sido formadas pela propaganda staliniana; e, por outro lado, temiam a presença de exilados políticos que haviam dado mostras de coragem e de determinação e estavam ligados entre si por redes organizacionais independentes do monolitismo soviético. Quem soube lutar contra uns saberá lutar contra outros, foi este o pensamento que presidiu em todos os casos à atitude tomada para com os refugiados.
[continua]

Miguel Serras Pereira disse...

[continuação]

Enquanto vigorou o Pacto Germano-Soviético, as mesmas deportações maciças que se verificaram a partir da Polónia oriental ocorreram também a partir dos Estados bálticos, e note-se que entre as categorias de lituanos condenados à deportação contavam-se todos os membros dos partidos e facções de esquerda e extrema-esquerda, com excepção dos comunistas de obediência staliniana.
Pelas mesmas razões que o haviam levado a prender combatentes da guerra civil espanhola e antifascistas polacos e lituanos, o bureau político staliniano decidiu, terminada a guerra, internar em campos de concentração muitos, ou mesmo a maior parte, dos militares soviéticos que tinham sido aprisionados pelas forças do Eixo. […]Uma vez mais, vemos o que os dirigentes stalinianos realmente temiam ao sabermos que entre os antigos prisioneiros de guerra soviéticos condenados ao internamento nos campos de concentração da Sibéria estavam incluídos aqueles que se haviam destacado na formação de organismos de resistência dentro dos campos de concentração nazis. […]«Jorge Semprun, que naquela época foi um quadro superior do Partido Comunista espanhol e que esteve ele próprio internado em Buchenwald, escreve que 'a maior parte [dos detidos soviéticos] passou directamente dos campos alemães para os gulags stalinianos'".

Boas leituras, convivências democráticas e um pouco de reflexão séria levaram muitos outros casos aparentemente tão desesperados como o seu a tornarem-se cidadãos apostados na liberdade e na igualdade que são condições da autonomia tanto a nível individual como colectivo.

Saudações republicanas

msp

Miguel Serras Pereira disse...

Caro Niet,
o que tentei foi, contra o irracionalismo doutrinário e fanatizado de certa "esquerda", mostrar que o "queremos tudo" exemplarmente citado pelo grande Ricardo nada tem de excessivo e seria antes, uma vez declinada democraticamente ou em termos universalizáveis, uma reivindicação cheia de sageza nas circunstâncias presentes. Que condições devemos criar para que todos possamos "querer tudo" por igual?
Abrç libertário

msp

Miguel Serras Pereira disse...

Xatoo,
ainda mais isto - uma dúvida que, depois de lhe responder há pouco, me assaltou: Terá sido só para poupar espaço que você não citou a diferença - entre outras - que Castoriadis indica entre os dois sistemas?
Mais valia ter poupado as alusões a Loyola - esse antepassado espiritual de Lenine - e ter transcrito as seguintes linhas, imediatamente contíguas às que cita:

MAS É TAMBÉM POR ISSO QUE AQUELES QUE ADEREM AO COMUNISMO, PELO MENOS ANTES DA SUA CHEGADA AO PODER, SÃO MOVIDOS POR CONVICÇÕES MUITO DIFERENTES DAS DOS NAZIS […] ACREDITAM DE UM MODO GERAL QUE O partido comunista VISA REALMENTE INSTAURAR UMA SOCIEDADE DEMOCRÁTICA E IGUALITÁRIA. É POR ISSO QUE UM COMUNISTA QUE DESCOBRE A MONSTRUOSIDADE DO COMUNISMO REALIZADO PODE SOÇOBRAR PSIQUICAMENTE, OU TORNAR-SE SOCIAL-DEMOCRATA, OU MANTER UM PROJECTO DE TRANSFORMAÇÃO RADICAL DESEMBARAÇADO DO MESSIANISMO MARXISTA-BOLCHEVIQUE. UM FASCISTA OU UM NAZI NÃO PODE DESCOBRIR NAS SUAS CRENÇAS ANTERIORES NADA QUE O INCITE A MUDÁ-LAS.

Não lhe parece que isto completa e explicita o sentido do pensamento de Castoriadis de um modo que arruína a leitura que você dele tenta fazer?

Ouça, sem lhe desejar o breakdown psíquico, tenho ainda esperança de o ver desembaraçarse do vírus estalinista que tende a torná-lo um peão nos tabuleiros de xadrez do sumo-sacerdote Carlos Vidal, do funâmbulo Renato Teixeira ou do controleiro António Figueira, e passar, então, a "manter um projecto de transformação social radical desembaraçado do messianismo marxista-bolchevique". Um pouco como a malta desta casa, ainda que nem sempre acertando, vai tentando lembrar que seria melhor para todos.

Saudações democráticas

msp

Anónimo disse...

Miguel Madeira:

"Será mais ineficente? Se formos ver bem, o problema ecológico mais não é que um problema de externalidades negativas não contabilizadas no custo de produção; log, se se arranjasse forma de esses custos serem contabilizados, a afectação de recursos seria, quase por definição, mais eficiente."

Sim, diga-me lá então de que "forma". É o mercado de carbono, que já se percebe hoje a aberração em que se caiu?

Essa questão em primeiro lugar não invalida que as indústrias continuem a ser poluentes (repesco o exemplo da fotovoltaica, que implica a purificação de sílica).

Em segundo levanta um problema da contabilização do valor da externalidade. (Arranja-se uma proporção do tipo "por cada kWh de fonte não renovável tem de se utilizar x kWh de renovável). A magnitude deste problema é indeterminável porque existe uma distorção brutal do mercado, que em reforma ou revolução é uma componente da economia que não deixa de existir.


"quanto aos povos em desenvolvimento, é relativamente simples concliar os seus interesses com a protecção ambiental (mesmo numa prespectiva puramente reformista e não revolucionária) - seria só transferir riqueza dos paises desenvolvidos para eles, em troca de eles não começarem a poluir."

Isso é fácil de dizer da boca para fora; eu não imagino os países desenvolvidos a abdicar, por exemplo, da indústria automóvel para alocarem mais recursos à indústria fotovoltaica para colocar painéis na floresta amazónica ou nas aldeias africanas isoladas.

Mas bom, é muito difícil abordar esta problemática tão em abstracto. Eu considero que na época em que vivemos os partidos socialistas devem criticar o beco sem saída da economia de mercado, e, abertamente, defender uma solução que envergue por uma revolução na economia (por que não começar na escala europeia?). A economia planificada tem de voltar a ser um tema debatido nas faculdades de economia. A questão da energia é vital e o mercado não a resolve.

Anónimo disse...

UM FLASH DE PIERRE BROUÉ SOBRE A GÈNESE DA BUROCRACIA RUSSA NO AUGE DA DITADURA DE ESTALINE

" Os privilégios, a necessidade de os justificar para quem deles tira partido, e também de os defender e aumentar", crescem com a tomada do poder absoluto no partido em 1929 por Estaline e a sua clique, obtida pelo afastamento das tendências de Trotski e a de Boukharine do Comité Central, principalmente. O relato é fascinante e o enredo descrito por Pierre Broué- na sua obra capital - " O Partido Bolchevique "- indispensáveis para quem quer entender o rumo do Leninismo e os avatares da sedição maquiavélica e sanguinária de Estaline. O camarada Xatoo devia procurar de imediato esta peça magistral; e repensar a sua postura e a sua ética militantes.

Como nasceu o Universo Concentracionário, o avant-gout do Goulag. Broué aponta:" Foi a colectivização que fez crescer exponencialmente as atribuições e os efectivos da Guépéou( a polícia secreta). O enquadramento dos kolkhozes ´cria a necessidade de serem instalados centenas de milhares de funcionários, e o mesmo se verifica nas Cooperativas e outros organismos de Estado encarregados da repartição e controlo dos produtos agrícolas. A industrialização impõe o mesmo fenómeno. A tónica posta na prioridade de erguer a indústria pesada para equipar a Agricultura e as indústrias de produtos de consumo não foram só slogans de propaganda; isso constituiu um processo para justificar a apropriação pela burocracia da grande maioria dos produtos de consumo e um indesmentível sinal da fonte do seu poderio e diversificação- a partir de 1931, começam-se a formar os novos quadros da élite soviética. Menos de metade dos diplomados do periodo que medeia os dois primeiros Planos Quinquenais pertencem ao campesinato e ao operariado; mas em 1936, o partido conta já nas suas fileiras 97 por cento dos administradores de fábrica, 82 por cento dos directores de atelier e 40 por cento dos engenheiros existentes em todo o território. O núcleo dirigente do aparelho burocrático central consolida-se, portanto,à medida que se estende o controlo da economia pelo Estado. A burocracia em todos os escalões e em todos os domínios, não cessa de fortalecer a burocracia ".Pierre Broué," Le Parti Bolchevique", pags.326/333.Les Éditions de Minuit,Paris. Niet