Como era de esperar, o PSD viabilizou o projecto de resolução do PS de apoio ao PEC. No entanto, supreendentemente, o PS cedeu em toda a linha perante o PSD, transformando o que era um projecto de resolução de apoio específico, às medidas constantes do PEC enviado pelo governo para Bruxelas, num projecto de resolução de apoio genérico, à necessidade de diminuição abrupta do défice público no âmbito do PEC. Torna-se assim óbvio que, neste momento, o PS teme mais do que o PSD o aparecimento duma crise política que possa levar à demissão do governo e à convocação de eleições antecipadas.
Entretanto, após ter escrito este texto, descobri este artigo de opinião de Francisco Louçã. Concordo com a sua primeira parte, que consiste numa análise do PEC, mas não com a segunda parte, onde é esquematizada a estratégia do BE perante o PEC, e mais genericamente perante o governo de José Sócrates. Segundo Francisco Louçã, o PS, e em particular José Sócrates, suspira pelo dia em que o governo seja derrubado, ou seja "obrigado" a demitir-se pela oposição. Na esperança de obter nova maioria absoluta em eleições legislativas antecipadas. No entanto, é hoje claro que não é assim. E não o é, porque o PS sabe que uma nova maioria absoluta é hoje um objectivo ainda mais distante do que em Setembro de 2009. Porque entretanto rebentaram mais alguns escândalos que revelam um governo obcecado com a manutenção do Poder, porque o PS tem um PEC ao pescoço que desmente o seu programa eleitoral e prejudica uma grande maioria de portugueses, aumentando o potencial de voto nos partidos à sua Esquerda, porque o PSD vai ter um novo líder, que não pode fazer pior do que a actual. Nenhuma dramatização permitirá ao PS chegar sequer próximo duma maioria absoluta em eleições legislativas antecipadas, sendo bem mais provável a perda da condição de partido mais votado. A analogia, feita por Francisco Louçã, com a estratégia que Cavaco Silva seguiu para obter a sua primeira maioria absoluta é inválida. Cavaco Silva representava então o novo, a mudança. O governo de José Sócrates e o PS são hoje vistos como algo velho e esgotado, perto do fim.
Portanto, o que importa é identificar o contexto em que a queda do governo mais benefício, nomeadamente eleitoral, pode trazer à Esquerda. Porque o governo vai cair. Se não em 2010, então seguramente em 2011. Quando o PSD sentir-se seguro de tornar-se o partido mais votado em eleições legislativas antecipadas. Mas Francisco Louçã parece não as querer. Na esperança de que a queda do governo de José Sócrates abra a possibilidade a um governo alternativo à Esquerda, no seio da actual Assembleia da República, e após a eleição dum novo líder do PS. Mas, sinceramente, não estou a ver que cenário pode levar a esse desfecho. Em primeiro lugar, tal só será possível com Manuel Alegre como Presidente da República. Cavaco Silva convocará eleições legislativas antecipadas assim que o governo de José Sócrates caia. Em segundo lugar, é preciso que José Sócrates se demita, seja demitido pelo Presidente da República, ou o seu governo caia por via da aprovação duma moção de censura na Assembleia da República. Mas o segundo cenário não acontecerá com Manuel Alegre como Presidente da República, e o primeiro e terceiros necessitam da colaboração da Esquerda parlamentar. Parece-me politicamente impossível a quem seja eleito novo líder do PS aliar-se a partidos que acabaram de contribuir para a queda dum governo apoiado pelo... PS. Em resumo, haverá certamente eleições legislativas antecipadas em 2010 ou 2011. E apenas duas opções existem: a Esquerda pode sentar-se e esperar que o PSD escolha a seu bel-prazer o momento e o contexto da queda do governo de José Sócrates que mais o beneficie eleitoralmente (note-se que BE e PCP só poderiam evitar tal votando contra uma moção de censura ao governo de José Sócrates, submetida por PSD ou CDS, o que seria politicamente suicidário); ou então arranjar coragem para agir e definir a narrativa que acompanhará a queda do governo de José Sócrates, apresentando a moção de censura que o derrubará. O erro de Louçã é esquecer-se que apenas estas duas opções existem. E agora, pelas razões apresentadas aqui, é o momento certo para a Esquerda derrubar o governo de José Sócrates.
25/03/10
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7 comentários:
"note-se que BE e PCP só poderiam evitar tal votando contra uma moção de censura ao governo de José Sócrates, submetida por PSD ou CDS, o que seria politicamente suicidário"
Penso que uma moção de censura precisa do voto de mais de metade dos deputados (não basta que haja mais votos a favor que contra).
Portanto, se for como eu penso, basta a abstenção do BE e do PCP para a moção de censura chumbar.
Pedro, dizes que «é o momento certo para a Esquerda derrubar o governo de José Sócrates.» Mas como?
Uma moção de censura apresentada pela esquerda iria focar o debate no PEC. Não só o PS seria obrigado a defendê-lo, mas também o PSD e o CDS.
Isto polarizaria a politizaria o debate na sociedade portuguesa. O ponto central do espectro político e ideológico deslocar-se-ia um pouco para a esquerda.
Uma moção de censura apresentada pela direita, pelo contrário, deixaria a esquerda numa posição insustentável, a ter que jogar o jogo pelas regras do CDS em vez de o jogar pelas suas.
Tem que ser a esquerda a definir os termos do debate, e para isso não pode ceder a iniciativa à direita.
Evidentemente. O post e o Sarmento. A moção de censura deixaria claro quem está sempre de acordo no essencial. O erro de Louçã responde a outra coisa pior. Ao calculo de Louçã. As próximas presidenciais e as próximas legislativas, têm que estar o mais afastadas possíveis uma da outra. Entende-se o embaraço mas não de desculpa a consequência.
Obrigado pelos comentários. O Miguel Madeira tem razão. No artigo 195 da Constituição diz:
"1. Implicam a demissão do Governo:
(...)
f) A aprovação de uma moção de censura por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções."
De qualquer modo seria politicamente insustentável ao governo manter-se em funções se uma moção de censura fosse aprovada, mesmo que sem maioria absoluta. Teria de demitir-se. Nesse caso BE e PCP seriam efectivamente cúmplices com PSD e CDS na queda do governo. Talvez até se saissem pior da situação do que votando a favor da moção de censura, pois a sua atitude seria vista como uma prova de cobardia, de cálculo político, de falta de coragem em assumirem uma posição clara.
O que proponho, Joana, é que PCP ou BE submetem quanto antes uma moção de censura ao governo com a justificação de quebra de compromisso eleitoral e tentativa de implementação de políticas danosas para o país, tendo em conta as medidas inscritas no PEC. Como muito bem diz o José Luiz Sarmento isso forçaria o novo líder do PSD, e a Direita em geral, a assumirem uma atitude defensiva, demonstrando ao país que a alternativa a este governo encontra-se à Esquerda. Pode ser que o governo não caia. Mas esse não é, de certa maneira, o objectivo principal a curto prazo. O que importa já é definir perante o eleitorado "a fronteira" no que respeita ao PEC, e em geral a este governo, aproveitando para impedir quaquer onda de boa-vontade para com o novo líder do PSD. É urgente deslocar a fronteira do debate para a Esquerda.
Também aqui os interesses políticos imediatos poderão não coincidir com o reforço das futuras representações parlamentares à esquerda. E a tese de Luoçã, a tal 2ª parte de que fala Pedro Viana, pode querer salvaguardar isso. Não sei até que ponto umas legislativas a breve prazo sejam convenientes aos partidos da esquerda parlamentar e ao BE particularmente.
Ou seja, entre as diversas leituras que pode ter a situação actual e a análise sobre os interesses da direita, (nomeadamente saber se o PS está, neste momento a optar pela vitimização, como defende Louçã, para conquistar uma maioria absoluta mais à frente ou se teme as eleições), os partidos de esquerda estão também a escolher o seu calendário eleitoral mais favorável.
O Louçã tem o raciocinio um bocado enferrujado. O Sócrates anda à procura de ser derrubado para, depois, em novas eleições, tentar obter a maioria absoluta? Mas as últimas sondagens dão O PS empatado com o PSD...
Manuel Monteiro
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